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“Prefeito: candidatura única e número mínimo de votos”

Por Hardy Waldschmidt (*)

Marta Ferreira | 05/10/2012 08:35

A cada quatro anos, em vários municípios brasileiros, nos deparamos com a situação de candidatura única para os cargos de prefeito e vice-prefeito, fato que proporciona as mais variadas discussões acerca do  número mínimo de votos necessários para elegê-los. 

A legislação brasileira não tem nenhum dispositivo específico

dispondo sobre candidatura única e não condiciona a validade da eleição a um determinado percentual de comparecimento do eleitorado apto a votar, embora seja o voto obrigatório para os maiores de 18 anos e facultativo para os analfabetos, para aqueles entre 16 e 18 anos e para os maiores de 70 anos. Ela tão-somente estabelece sanção aos eleitores obrigados a votar que não comparecem nem justificam a ausência. 

É certo que, na hipótese das ausências suplantarem os comparecimentos, a questão da representatividade dos eleitos pode vir à discussão, mas essa situação não invalida a eleição. 

A Lei nº 9.504/97, de forma genérica, estabelece que estarão eleitos para os cargos de prefeito e vice-prefeito, não computados os votos em branco e os votos nulos, os candidatos que obtiverem a maioria:

• simples de votos, nos municípios até duzentos mil eleitores;  

• absoluta de votos, nos municípios com mais de duzentos mil eleitores.    

Dispõem a Constituição Federal e a Lei das Eleições acerca do tema: 

Constituição Federal:

Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:

I - ........................................................................

II - eleição do Prefeito e do Vice-Prefeito realizada no primeiro domingo de outubro do ano anterior ao término do mandato dos que devam suceder,  aplicadas as regras do art. 77, no caso de

Municípios com mais de duzentos mil eleitores;

.............................................................................

Art. 77. A eleição do Presidente e do Vice-Presidente da República realizar-se-á, simultaneamente, no primeiro domingo de outubro, em primeiro turno, e no último domingo de outubro, em segundo turno, se houver, do ano anterior ao do término do mandato presidencial vigente.

§ 1.º A eleição do Presidente da República importará a do Vice-Presidente com ele registrado.

§ 2.º Será considerado eleito Presidente o candidato que, registrado por partido político, obtiver a maioria absoluta de votos, não computados os em branco e os nulos.

Lei nº 9.504/97:

Art. 2.º Será considerado eleito o candidato a Presidente ou a Governador que obtiver a maioria absoluta de votos, não computados os em branco e os nulos. 

§ 1.º Se nenhum candidato alcançar maioria absoluta na primeira votação, far-se-á nova eleição no último domingo de outubro, concorrendo os dois candidatos mais votados, e considerando-se eleito o que obtiver a maioria dos votos válidos. 

§ 2.º Se, antes de realizado o segundo turno, ocorrer morte, desistência ou impedimento legal de candidato, convocar-se-á, dentre os remanescentes, o de maior votação. 

§ 3.º Se, na hipótese dos parágrafos anteriores, remanescer em segundo lugar mais de um candidato com a mesma votação, qualificar-se-á o mais idoso.

§ 4.º ...............................................................................................

Art. 3.º  Será considerado eleito Prefeito o candidato que obtiver a maioria dos votos, não computados os em branco e os nulos. 

§ 1.º ..............................................................................................  2

§ 2.º Nos Municípios com mais de duzentos mil eleitores, aplicar-se-ãaplicar-se-ão as regras estabelecidas nos §§ 1.º a 3.º do artigo anterior. 

Em consulta à jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral encontramos apenas um julgado sobre candidatura única, referente ao município piauiense de Luiz Correia: 

Recurso Especial nº 11.402

Relator: Min. José Cândido de Carvalho Filho             Julgamento: 14.10.1993

Ementa:

ELEICAO. PREFEITO. MAIORIA DE VOTOS. INTERPRETACAO DO § 2º, DO ART. 1º, DA LEI Nº

8.214/91.

I - Serão considerados eleitos o prefeito e o vice-prefeito com ele registrado que obtiverem maioria de votos (art. 1º, § 2º, da Lei nº 8.214/91). Tal norma não exige maioria absoluta de votos. Mesmo que se tratasse de município com mais de duzentos mil habitantes, não caberia falar de segundo turno de eleições com  candidatura única a prefeito. Além disso, no primeiro turno de qualquer forma não seriam computados os votos em branco (CF, arts. 77, §§ 2º e 3º, e 29, II).

II - Inocorrência de violação de lei ou dissídio jurisprudencial.

III - Recurso Especial não conhecido. 

Ressalta-se que o julgado acima referido foi proferido sob a égide da Lei nº 8.214/91, portanto, antes da edição da Lei nº 9.504/97, mas cuja redação é quase idêntica à da lei em vigor:

Lei nº 8.214/91, art 1º:

§ 2º Serão considerados eleitos o Prefeito e o Vice-Prefeito com ele registrado que obtiverem maioria de votos.

Art. 2º Nos municípios com mais de duzentos mil eleitores, serão considerados eleitos o Prefeito e o Vice-Prefeito com ele registrado que obtiverem maioria absoluta de votos, não computados os em

branco e os nulos.

Todavia,  a legislação eleitoral condiciona a validade da eleição a um percentual mínimo de votos válidos. 

Nas eleições majoritárias consideram-se válidos os  votos dados a candidatos regularmente registrados; nas proporcionais, aos regularmente registrados e às legendas partidárias (Lei nº 9.504/97, art. 5º).

O artigo 224 do Código Eleitoral, aplicável às eleições majoritárias e proporcionais, exige que mais da metade dos votos sejam válidos, sob pena de realização de novo pleito: 

Código Eleitoral:

Art. 224 Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do País nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias.

§ 1º Se o Tribunal Regional, na área de sua competência, deixar de cumprir o disposto neste artigo, o Procurador Regional levará o fato ao conhecimento do Procurador-Geral, que providenciará junto ao

Tribunal Superior para que seja marcada imediatamente nova eleição.

§ 2º Ocorrendo qualquer dos casos previstos neste capítulo, o Ministério Público promoverá, imediatamente, a punição dos culpados.

Sobre o referido artigo, o Tribunal Superior Eleitoral, nos Mandados de Segurança nº 2.624 e nº 3.058 e no Recurso Especial nº 10.989, pronunciou a sua constitucionalidade, no sentido de sua recepção integral pela nova ordem jurídica estabelecida com a promulgação da Constituição Federal de 1988, bem como firmou jurisprudência no sentido de que deve ser renovada  a eleição quando os votos nulos ultrapassarem a metade dos apurados (Acórdãos TSE nº 7.560, de 17.5.1983; nº 3.005, de 29.11.2001; nº 20.008, de 12.11.2002; REspe nº 25.775, de 07.11.2006 e REspe nº 25.855, de 06.3.2008).  

3 Como visto acima, o art. 224 do Código Eleitoral impõe a realização de nova eleição sempre que mais da metade dos votos forem nulos. Mas que votos nulos são esses? São os decorrentes de ilícitos cometidos, do indeferimento do pedido de registro, de erros involuntários, da manifestação de vontade do eleitor? 

A resposta a essas indagações foi dada pelo Tribunal Superior Eleitoral, no julgamento do Recurso Especial nº 25.937, em 17.8.2006, quando deliberou no sent quando deliberou no sentido de que não se somam, para fins de novas eleições, os votos nulos decorrentes de manifestação apolítica do eleitor, no momento do escrutínio, seja ela deliberada ou decorrente de erro. Ou seja, a nulidade de que trata o artigo 224 do Código Eleitoral, a ensejar novas eleições, é somente aquela decorrente de ilícitos, como por exemplo, falsidade, fraude, coação e compra de votos. 


A questão foi novamente enfrentada pelo Tribunal Superior Eleitoral em 19.12.2008, no Processo Administrativo n.º 20.159, que redundou na Resolução n.º 22.992, onde restou estabelecido que, para fim de aplicação do art. 224 do Código 

Eleitoral, devem ser levados em consideração os votos nulos decorrentes de atos ilícitos, anulados por decisão judicial e os votos nulos decorrentes de votação dada a candidato com registro indeferido, e desconsiderados os votos nulos decorrentes 
de manifestação apolítica do eleitor. 

No mesmo sentido a regulamentação para o pleito municipal de 2012, prescrita pela Resolução TSE n.º 23.372/2011: 


Art. 180. Se a nulidade atingir mais da metade dos votos do Município, as demais votações serão 
julgadas prejudicadas e o Tribunal Regional Eleitoral marcará dia para nova eleição dentro do prazo 
de 20 a 40 dias (Código Eleitoral, art. 224, caput). 
§ 2º Para os fins previstos no caput, em não sendo deferidos os pedidos de registro dos candidatos a 
cargo majoritário, os votos nulos dados a esses candidatos não se somam aos votos nulos resultantes da manifestação apolítica dos eleitores. 


Desse modo, a regra estabelecida pelo artigo 224 do Código Eleitoral é fundamental para a avaliação das consequências advindas das nulidades da votação. 

Porém, nessa avaliação devem ser: 
• incluídos somente os votos decorrentes de atos ilícitos, anulados por decisão 
judicial e os votos nulos decorrentes da votação dada pelo eleitor a candidato sem 
registro; 
• excluídos os votos brancos e nulos decorrentes da manifestação apolítica do 
eleitor, no momento do escrutínio, seja ela deliberada ou decorrente de erro. 
Assim, com base na legislação em vigor e na jurisprudência do TSE, podemos concluir que, nos municípios com candidato único, apenas um voto válido  pode eleger o prefeito e seu vice, ainda que os demais eleitores votem em branco ou 

nulo. 

Na hipótese de ocorrer essa situação, certamente a representatividade dos eleitos restará comprometida. 

Para evitar que isso aconteça, é preciso que os candidatos únicos redobrem esforços visando obter uma votação expressiva que lhes outorgue representatividade para o exercício dos seus mandatos. 

(*)Hardy Waldschmidt é secretário Judiciário do TRE/MS e professor de Direito Eleitoral da ESMAGIS.

 

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