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A revolução e o voto no Brasil

Por Octaciano Nogueira (*) | 11/08/2012 09:40

Nada menos de 80 anos separam a Revolução Constitucionalista de São Paulo, em 1932, da plena democracia de que hoje desfrutamos. Esse movimento armado, porém, não foi o primeiro em nosso país. Nem as eleições pelas quais clamavam os revolucionários daquela época, as primeiras aqui realizadas.

Voto e eleições foram recursos utilizados, pela primeira vez, em nossa história, há 480 anos. Para sermos mais explícitos, sua estréia deu-se em 1532 para a escolha dos membros do Conselho Municipal da Vila de São Vicente, em São Paulo, por iniciativa de Martim Afonso de Souza, o português Governador Geral que primeiro dirigiu o país, em nome do rei de Portugal.

Até que chegássemos à escolha dos governantes através de eleições livres e diretas, foram necessários, como se vê, mais de quatro séculos, uma fase que, seguramente, põe fim à utopia de sermos um país “jovem”.

Com exceção dos períodos de autocracia e autoritarismo, como os de 1937 a 1946, datas que marcam o início e o fim do “Estado Novo” instituído por Getúlio Vargas, o cidadão que por mais tempo governou o país, o sistema constitucional regeu as várias fases de nossa história.

A primeira Constituição foi uma concessão, outorgada por D. Pedro I, o filho de D. João VI, rei de Portugal, por ele deixado aqui como Regente do Império, depois que o pai voltou à sede do reino, de onde tinha fugido após a invasão do país por Napoleão Bonaparte.

Coube a D. Pedro I, que outorgou nossa primeira Constituição em 1824, convocar a primeira Assembléia Constituinte que tivemos, instalada em 3 de maio de 1823, e por ele também dissolvida por um golpe de força, na madrugada de 11 para 12 de novembro do mesmo ano.

Reis, monarcas e imperadores quase nunca se dão bem com regimes democráticos. D. Pedro I foi um exemplo, Getúlio Vargas, outro. É uma singularidade que a Constituição outorgada em 1824 tenha durado 65 anos, se contarmos como seu fim a proclamação da República, em 1889, ou 67 se tomarmos como seu termo a vigência da de 1891 que a sucedeu.

Nossas Constituições se sucederam, depois da primeira, de 1824. Em 1891, com a República, a anterior foi expressamente revogada, mas durou menos que a metade da que a antecedeu, revogada que foi com a Revolução de 1930 que entronizou Getúlio no poder.

A de 1934 não sobreviveu mais que três anos, revogada que foi por Vargas, ao decretar o que ele denominou de Estado Novo, e adotar como sucedâneo a Carta constitucional de 1937, logo apelidada pela irreverência popular de “Polaquinha”, por ter se inspirado na Constituição da Polônia outorgada pelo marechal Josef Psilduski, ditador naquele país.

O terceiro texto constitucional sob o qual viveram os brasileiros sobreviveu até a promulgação do de 1946, aprovado pela Assembléia Nacional Constituinte eleita depois da deposição de Vargas em 29 de outubro de 1945. Vieram depois a Constituição de 1967, já no regime militar instaurado em março de 1964, a Emenda Constitucional 1, de 1969 que virtualmente outorgou um novo texto constitucional, substituído finalmente pelo de 1988, ainda hoje em vigor, a despeito de suas mais de 70 emendas.

Este tortuoso trajeto institucional evidencia ao mesmo tempo as inquietações e insatisfações que provocaram movimentos políticos de toda natureza no país, mas é compensado pela circunstância de que a adoção de um regime político incontestavelmente democrático sob a qual vivem as atuais gerações de brasileiros, é o resultado de uma crescente participação política dos cidadãos na busca de seu destino. A busca pela legitimidade política mostra que já vivemos sob diferentes regimes: a monarquia entre 1822 e 1891 e a República de 1891 até hoje.

Mudamos nosso regime político, nossa forma de organização política, passando de um Estado unitário no Império, para uma forma republicana em 1891. Se o direito de voto dos cidadãos não ultrapassava 1% dos adultos, no Império, hoje somos o segundo maior eleitorado do mundo ocidental, com um número de eleitores só ultrapassado pelos Estados Unidos. Isto demonstra que, se temos muito o que lamentar no curso de nossa história, temos também muito o que celebrar, graças às vitórias que conquistamos desde que nos tornamos uma nação independente e soberana.

(*) Octaciano da Costa Nogueira Filho é professor aposentado do Instituto de Ciência Política (Ipol) da Universidade de Brasília (UnB). Bacharel pela Faculdade Nacional de Direito da antiga Universidade do Brasil (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro) e bacharel e licenciado em História pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras pelo Centro Universitário de Brasília (CEUB), o professor é especialista pelo Instituto de Estudos Políticos e Sociais da Pontifício Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). Foi diretor do Departamento de Imprensa Nacional da Casa do Brasil em Madri (Espanha). É autor dos livros Parlamentares do Império, A Constituinte de 1824, Poder Legislativo no Brasil, Democracia sem democratas e Democracia dos Autocratas.

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