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A tensão sobre a advocacia e o direito de defesa

Por Jully Heyder da Cunha Souza (*) | 03/08/2015 09:53

Nesta semana, a advogada Beatriz Catta Preta, conhecida por atuar na defesa de vários réus da operação Lava-Jato, escancarou para todo o Brasil a grande crise de credibilidade e de imagem por qual passa a advocacia brasileira.

Em um dos ataques mais virulentos à profissão desde a ditadura militar, a CPI da Petrobrás colocou na alça de mira a advogada que atuou nas delações premiadas, as quais implicam vários detentores do poder. Acuada, a profissional tomou uma atitude radical: renunciou a todas as procurações e encerrou sua carreira.

O que fez a CPI, ao confundir a atuação da advogada com seus clientes, transformando-a de defensora em investigada, é o que vem acontecendo de maneira prosaica em todo o Brasil, desde as delegacias de Polícia até os Tribunais. Não são raros os casos em que advogados são processados criminalmente, acossados e investigados por atos praticados na advocacia. Sigilo entre advogado e cliente é quebrado indistintamente e grampos são autorizados nos escritórios de advocacia. Enfim, são inúmeras as represálias inaceitáveis que o advogado vem sofrendo por defender os direitos constitucionais do cidadão e garantir a realização da justiça.

A diferença é que, no caso Catta Preta, a vindita ocorreu em situação de repercussão nacional, o que expôs de vez as feridas da nossa profissão.

O que não se tem considerado neste cenário, entretanto, é que, desconstruindo a advocacia, desconstrói-se igualmente a própria estrutura do Estado Democrático de Direito, que se ergue sobre garantias e liberdades constitucionais, somente realizáveis por meio da Justiça, inexistente sem o advogado.

A necessidade de se combater firmemente a corrupção é uma realidade no Brasil. Os níveis de “ladroagem” chegaram a patamares insuportáveis e a sociedade vem se levantando contra a impunidade, a qual é o combustível para a devassidão dos métodos da política brasileira. No entanto, temos que concordar que a investigação, o processamento e o julgamento dos envolvidos deve ocorrer dentro dos limites da Constituição, que assegura o amplo direito de defesa, através de um defensor, que deve ser independente e estar igualmente protegido para realizar sua missão. É somente pelo trabalho do advogado, por exemplo, que um inocente pode se livrar da mão pesada do acusador.

Desta vez, o STF foi acionado pela OAB e o Ministro Ricardo Lewandowisk proferiu uma respeitável decisão em que repreendeu a investida contra a advogada, assentando que “(...) é inadmissível que autoridades com poderes investigativos desbordem de suas atribuições para transformar defensores em investigados, subvertendo a ordem jurídica”.

Mas será que esta decisão isolada é suficiente para mudar o cenário da nossa profissão? Creio que não!
A atuação da OAB, como sói ocorrer nos últimos tempos, é consequencial e remediativa.

É preciso, portanto, que exista um esforço e um movimento para recobrar a imagem da advocacia, reconstruindo a consciência difusa acerca da relevância do advogado na sociedade, na realização da justiça, na igualdade, e na garantia de nossos direitos fundamentais, dentre os quais ganha maior relevo o direito de não ser punido ou desapropriado de seus bens sem o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório.

Mas a OAB somente conseguirá desenvolver este trabalho se tiver credibilidade institucional. O que somente alcançará atuando com coragem e independência tanto na cobrança de punição aos rapinadores da nação, quanto na defesa das garantidas constitucionais dos cidadãos e, sobretudo, da advocacia.

Quando a advocacia se enfraquece, como agora, a tendência é que os direitos dos cidadãos também comecem a ser suprimidos, abrindo espaço para outras medidas autoritárias e totalitaristas. Será isso o que queremos e esperamos para o futuro da nossa nação?

(*) Jully Heyder da Cunha Souza, advogado

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