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Ainda há tempo de salvarmos o Aquífero Guarani

Por Laerte Tetila (*) | 10/09/2012 12:00

Cresce, no mundo todo, com o vertiginoso avanço da poluição, a preocupação com o mais precioso bem da humanidade: a água. E com razão. Porque menos de 1.0% da água doce se encontra em lugares acessíveis e, mesmo assim, quase toda contaminada. Por isso, mais de 1 bilhão e 500 milhões de pessoas pelo mundo afora passaram a se abastecer das águas subterrâneas, das águas retiradas das profundezas dos aqüíferos.

São águas confinadas, são águas embebidas em rochas sedimentares e que podem atingir grandes profundidades. Nós, do Centro-Sul da América do Sul, temos o privilégio de poder contar com o Aqüífero Guarani, um dos maiores depósitos de água doce e potável do Planeta e que, no Brasil, surge ocupando em torno de 900 mil quilômetros quadrados, com a maior parte dessa reserva localizada em Mato Grosso do Sul (algo em torno de 214 mil quilômetros quadrados).

Temos, portanto, uma gigantesca caixa d’água subterrânea, com tampa de argila, capa formada por derrames de basalto, de onde derivam os solos avermelhados. Um manancial incrível, fundamental para o abastecimento atual e vital para o futuro. A exemplo de Dourados, aqui no nosso Mato Grosso do Sul, e de Ribeirão Preto, no nosso vizinho estado de São Paulo, mais de 100 cidades brasileiras já fazem uso do aqüífero. Mas o fato é que esse abençoado tampão argiloso não ocorre de forma homogênea, pois existem áreas de afloramento da própria rocha sedimentar: o arenito.

E é aí que mora o perigo. Nesses espaços de solo permeáveis, ou seja, porosos, e também chamados de zonas de recarga do Aqüífero Guarani, as águas das chuvas – penetrando com facilidade – aumentam o risco de contaminação. Sabe-se que o sonho de consumo de todo agricultor é o de plantar em terra roxa, plantar no tampão argiloso do aqüífero.

Mas, com a forte expansão da fronteira agrícola, também os solos arenosos (afloramento do arenito e também do aqüífero) vêm sendo ocupados por enormes plantios de soja, milho, cana. Esses solos, pela sua porosidade, facilitam que a água da chuva, em contato com os agrotóxicos e os fertilizantes químicos, contamine tanto o lençol freático quanto o próprio aqüífero.

Não que os solos argilosos (menos porosos) sejam imunes ao problema. Neles, embora os riscos de contaminação sejam menores, há de se ressaltar que o basalto (rocha-matriz desses solos e tampão do aqüífero) é uma rocha com fendilhamentos e fissuras, por onde a água envenenada também pode penetrar. Oportuno frisar que, conforme a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), o Brasil tornou-se o líder mundial no consumo de agrotóxicos e o Aqüífero Guarani, com seus 50 quatrilhões de litros d’água potável, nunca esteve tão ameaçado.

E nem é preciso muito esforço para observar e perceber o quanto a superfície do aqüífero vem sendo transformada em grandes celeiros agrícolas – em Mato Grosso do Sul, essa realidade já é de plena visibilidade. Pesquisas da Embrapa, como de outras instituições, já vêm apontando, em vários pontos desse aqüífero, níveis de agrotóxicos próximos ao limite de risco para a saúde humana. Todos os sinais de alerta são poucos, pois, aqüíferos subterrâneos, uma vez contaminados, contaminados para sempre.

Projetos de gestão sustentável para esse aqüífero estão em andamento, mas, até agora, não há nenhum sistema de monitoramento que o proteja. Lamentável, uma vez que a ONU aponta que, no mundo, mais de 2 bilhões de pessoas já enfrentam a falta d’água. Por isso, um manancial gigantesco como o Aqüífero Guarani, caso seja preservado, seguramente, em breve seria mais do que útil. Seria um recurso estratégico para a humanidade. Porque não há vida sem água!

(*) Laerte Tetila é mestre em geografia física pela USP e deputado estadual (PT/MS).

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