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Condenação de mensaleiros abre brecha para inocentar contribuintes

Elisabeth Lewandowski Libertuci (*) | 19/03/2013 15:04

Ao todo, foram 53 sessões. Discussões e debates jurídicos poder-se-ia dizer, no mínimo, “acalorados”. Provocações das mais variadas entre os mais altos magistrados que compõem a Corte máxima brasileira, o Supremo Tribunal Federal. Para o público, não acostumado com o dia a dia do Poder Judiciário, programação inédita, veiculada em tempo real pela “TV Justiça”. Houve até quem dissesse que algumas dessas sessões ganharam em audiência de muitos filmes “enlatados” americanos, que tratam do que acontece nos Tribunais daquele país.

E assim convivemos com o julgamento do mensalão, iniciado em agosto de 2012 e, aparentemente, em fase de conclusão para concretizar a condenação das 25 pessoas, partícipes talvez do maior escândalo nacional pela participação no desvio de dinheiro público e pela compra de votos de parlamentares em troca de apoio em votações de emendas constitucionais de interesse do governo Lula.

Como gostava (e gosta) de dizer o ex-presidente Lula, “nunca antes na história deste país” houve julgamento tão complexo, em que constaram no rol dos “culpados” nomes de relevo da iniciativa privada e da política nacionais. A opinião pública aplaudiu, a imprensa comemorou!

Em tese, acreditam muitos, o Brasil jogou fora a pecha da impunidade, o dogma de que pessoas influentes e com recursos podem não acabar na cadeia. Alguns ainda mais efusivos cantam aos quatro ventos que se deu um passo importantíssimo para a consagração de nossa democracia...

Será? A história ensina a questionar a capacidade de julgamento dos homens, principalmente quando influenciados por reações inflamadas do povo. E é exatamente nesta situação que todos nós, brasileiros, estamos inseridos: povo e mídia aliados com a plena convicção de que agora sim se fez justiça no Brasil!

A pergunta que não quer calar é a seguinte: como reagirá nossa sociedade quando se deparar com situações paradoxais, nada mais do que reflexos do que se decidiu no julgamento da Ação Penal 470?

Mais enfaticamente, qual será a reação das pessoas quando perceberem que nos casos em que o contribuinte discute com o fisco se deve, ou não, recolher determinado tributo, pode ter agora decisão favorável, e procedente dos próprios tribunais administrativos?

Explico. Como se sabe, o Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), órgão colegiado que julga em nível administrativo tributos exigidos em fiscalização (tributos esses que, nos tempos atuais, atingem cifras estratosféricas, porque acrescidos da multa de 150% pela identificação de fraude na conduta do contribuinte em não recolher o tributo, ou vir a recolhê-lo em valor menor que o devido), é composto de representantes do fisco e do contribuinte em número igual (três pelo fisco e três pelo contribuinte, dos quais um dos representantes do fisco acumula a função de presidente, por determinação expressa do Regimento Interno do Carf).

Até agora, em caso de empate, o voto de qualidade é do presidente da Turma (leia-se representante do fisco), o que, regra geral, acaba por desempatar o julgamento contrariamente aos interesses do contribuinte.

Pois bem. Quem acompanhou de perto o julgamento do mensalão sabe muito bem que a certa altura do campeonato o “quorum” do colegiado ficou em número par, ante a aposentadoria simultânea de dois ministros da Casa. E decidiu-se, pelo menos até aqui, que nesse caso a decisão deve ser pela inocência do acusado.

Evidentemente, para se afastar incongruências desse histórico julgamento, quer parecer natural a imediata alteração no Regimento Interno do Carf, de tal sorte que, em caso de empate, e quando se estiver diante de julgamento administrativo com desdobramentos penais (imposição do tributo com multa de 150%), o voto de desempate necessariamente terá de ser pela absolvição do contribuinte quanto à imposição de multa.

Não raras vezes, essa decisão tem efeito dominó, na medida em que a contagem da decadência para se cobrar o tributo (e consequentemente a multa) é maior quando se está diante de conduta fraudulenta...

Resumo da ópera: o precedente do mensalão muito possivelmente importará mudança radical nas decisões do Carf em caso de empate... E a reversão será em favor do contribuinte, o que significa dizer prestígio evidente ao princípio do “in dubio pro reu”, ou, em termos coloquiais, na dúvida, o contribuinte é inocente.

Obviamente, este é um dos muitos exemplos dos desdobramentos jurídicos decorrentedesse histórico julgamento... Outros? Quem viver verá!

Elisabeth Lewandowski Libertuci - (*) Sócia Fundadora de Libertuci Advogados Associados, Conselheira do CONJUR (Conselho de Assuntos Jurídicos e Legislativos) da FIESP e idealizadora do Justo na Lei

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