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Indicações políticas e desempenho das agências reguladoras

Por José Matias-Pereira (*) | 04/01/2013 13:52

É essencial que numa economia de mercado que o governo possa contar com dois importantes instrumentos - que interagem e se complementam -, para garantir o crescimento econômico: a legislação antitruste e a política de regulação econômica. Nesse sentido, a Constituição Federal de 1988, além de preconizar o princípio da livre iniciativa, traça diretrizes para a regulação de setores estratégicos passíveis de delegação. Assim, conforme definido no seu art. 174, compete ao Estado “como agente normativo e regulador da atividade econômica ”exercer“ na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento”.

A função reguladora definida pela Constituição pode ser entendida como uma prerrogativa do Estado destinada a suprir as chamadas “falhas do mercado”. A regulação econômica visa facilitar, limitar ou intensificar os mercados pela correção das imperfeições de entrada e lidar com preço, confiabilidade do serviço, entrada e saída do mercado, e investimentos na infraestrutura. É relevante destacar que a atividade regulatória estatal não compete exclusivamente às agências reguladoras.

Por sua vez, as agências reguladoras foram criadas para fiscalizar a prestação de serviços públicos praticados pela iniciativa privada. Além de controlar a qualidade na prestação do serviço, estabelecem regras para o setor. O Brasil possui na atualidade dez agências reguladoras, que somam 54 cargos de direção, sendo todos são escolhidos e nomeados pelo presidente da República, após aprovação do Senado Federal.

Feitas essas considerações, torna-se possível fazer duas perguntas: As agências reguladoras estão cumprindo de forma adequada as suas funções? As escolhas políticas dos dirigentes dessas agências estão fragilizando os seus funcionamentos?

Trata-se de perguntas inquietantes, pois a percepção de uma parcela significativa da população, conforme revelam as pesquisas de opinião pública, entende que as agências não estão atuando de maneira adequada. Essa visão decorre, em geral, da incapacidade das agências de resolver de forma satisfatória para a sociedade os conflitos que estão no âmbito de suas respectivas atuações, com destaque para as áreas de energia elétrica, aviação civil, petróleo e água.

A escolha política desses dirigentes revela-se a menos adequada para atender os interesses da administração pública e da sociedade. É sabido que inúmeros servidores públicos, notadamente aqueles das carreiras típicas de Estado, possuem formação e competência para atuarem como dirigentes dessas agências. Esses servidores, desde que haja vontade política do governante, poderiam ser requisitados, sem nenhuma dificuldade, para atuar nas referidas agências. Quando se faz a opção por um servidor de carreira com um perfil adequado, as possibilidades de sucesso são maiores, e caso venha ocorrer desvios, a possibilidade de punição também se torna mais efetiva. Quando o indicado vem de áreas estranhas ao setor público, notadamente aqueles que possuem ligações com grupos e pessoas com interesses pouco transparentes, a possibilidade de ocorrer desvios e irregularidades graves tende a aumentar de forma significativa.

A avaliação dos problemas no funcionamento das agências reguladoras nos permite alertar para os riscos de uma crescente redução do desempenho e da qualidade do serviço público ofertado à sociedade, na medida em que aumenta o número de pessoas sem as qualificações necessárias para essas atividades sensíveis para a sociedade. O mais preocupante é que a imagem negativa não fica para o indivíduo que não desempenhou bem as suas funções ou praticou atos ilícitos: fica para a administração pública. Isso contribui para aumentar ainda mais o preocupante fosso que existe entre a sociedade e a gestão pública no Brasil.

Por fim, é oportuno lembrar que nenhum país chegou a um nível de desenvolvimento sem contar com uma administração pública competente. Por isso a reforma mais urgente que o Brasil necessita fazer é a reforma da administração pública, para que ela – depois de modernizada – possa responder à sociedade, de forma tempestiva, as crescentes demandas por serviços públicos de qualidade.

(*) José Matias-Pereira é professor-pesquisador associado do Programa de Pós-Graduação em Contabilidade da Universidade de Brasília. Economista e advogado, é doutor em Ciência Política (UCM-Espanha) e pós-doutor em Administração pela FEA/USP. Autor, entre outros, de Economia Brasileira, Finanças Públicas: A política orçamentária no Brasil, Curso de Administração Pública, Curso de Administração Estratégica.

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