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Lei seca, crime e fiança

Por Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves | 31/10/2011 07:05

A fiança, recém instituída na legislação penal brasileira, considerada como um avanço pelos cultores do Direito, vem escandalizando a população e, ao mesmo tempo, tornando ineficientes as ações de defesa da sociedade como, por exemplo, a “lei seca”, que leva para a cadeia motoristas alcoolizados. Surpreendido, o infrator é preso, mas paga a fiança e pode responder o processo em liberdade. Essa válvula legal minimiza o impacto e o temor relativos à punição e, sem qualquer duvida, chega a funcionar como um incentivo para os condutores continuarem bebendo, dirigindo, matando e morrendo em nossas ruas e estradas. Perdeu-se o aspecto “pedagógico” da restrição ao álcool e, por extensão, até ao cometimento de crimes.

Tradicionalmente, a possibilidade do encarceramento, funciona como um freio ao cometimento de crimes e infrações. Quando o indivíduo passa algum tempo atrás das grades, sofre uma série de conseqüências econômicas e sociais, como a perda do emprego e a rejeição no meio onde vive. Daí o empenho para evitar. Mas, com a possibilidade da fiança imediata, corre-se o risco da liberação geral, com sérios prejuízos à sociedade. A máxima de que “cadeia não foi feita para cachorro”, corrente entre os delinqüentes, pode ser acrescida de “nem para quem pode pagar fiança”.

Para ser efetivamente um avanço, a possibilidade de fiança tem de ser seletiva e para faltosos de baixo potencial e sem risco de novo cometimento da falta. Não é o que se verifica com bêbados ao volante ou praticantes de outros crimes que pagam a fiança legalmente arbitrada e podem sair rindo de suas vítimas. Da forma que hoje é praticado, esse instituto gera a ineficiência dos controles da sociedade para com o crime e a infração, mas atende ao interesse do Estado que, na falta de vagas no seu deficiente sistema penitenciário, faz de conta que pune e, com isso, lança-se ao descrédito popular.

Há pelo menos três décadas, o Estado malicioso tem se aproveitado do interesse de estudiosos e legisladores que procuram humanizar e aperfeiçoar a pena e, em vez disso, tem usado suas teses para promover o perdão das penas e o esvaziamento dos presídios. Criou-se coisas como a “saidinha”, os regime semi-aberto e outros institutos que pouco ou nada beneficiam a população carcerária, mas evitam a construção de novos estabelecimentos. Em vez da política de permissibilidade, se realmente estivesse interessado em resolver o problema, o Estado deveria criar condições efetivas de ressocialização do detento para quando, ao terminar sua pena, tivesse ele condições de viver sem voltar a delinqüir. Nessa direção, pouco ou nada tem sido feito, lamentavelmente.

Agora, com a fiança disponível em todas as delegacias, mais uma vez banaliza-se o crime e a sociedade resta, cada dia mais, desprotegida...

(*) Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar de São Paulo – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assisttência Social dos Policiais Militares de São Paulo)

aspomilpm@terra.com.br

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