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Lich, mehr licht” (Luz, mais luz) - Últimas palavras atribuídas a Goethe

Por Fábio Andrade (*) | 20/02/2012 09:12

Todos deveríamos olhar em alguma direção em busca de algo, para um horizonte mais límpido, guiado por nossa luz interior. Temos todos ânsias e desejos, que ficam, amiúde, encobertos no lodaçal do obscurantismo mundano. Preocupações pífias, um trabalho que somente nos serve à sobrevivência, um companheiro que não atende nossas expectativas, uma vida de faz-de-conta. Faz-de-conta que sou feliz.

Então, atabalhoados, a certa altura da vida, paramos para pensar em nossas escolhas (sim, sempre elas) e aonde elas nos conduziram. Que caminho poderíamos ter tomado naquela encruzilhada? O que teria mudado? E mesmo que estejamos certos de que, naquele momento, fizemos o melhor que podíamos ou, na pior das hipóteses, o que nos era possível fazer, a dúvida paira, como uma nuvem negra a confundir os pensamentos e a nos lançar um turbilhão de desculpas.

O que é preciso para se ter uma vida mais consciente, com escolhas que teriam maiores chances de sucesso? Por que sempre tropeçamos no auto-engano, na autossabotagem? Negligenciamos nosso potencial, aceitamos o que é razoável, pois, na dúvida, “é sempre melhor um pássaro na mão do que dois voando” e, assim, desprezamos o melhor.

Vemos, por todos os lados, todos os dias, cada vez mais, autômatos a caminharem pelas ruas, sem o mínimo sentido de existência, de questionamento. Apenas estão ali, cumprem seu papel na engrenagem social e, quando não forem mais necessários, serão descartados, res inutile, como fossem parafusos enferrujados, cujo único destino é o ferro-velho.

Seguimos, a maioria de nós, uma rotina mecânica: acordar, cumprir os afazeres, aguardar o horário do almoço ou, às vezes, somente do lanche, depois mais trabalho, aguardar a hora de ir para casa, satisfazer as necessidades básicas e, no dia seguinte, repetir o ato, sem sequer mudar a ordem estabelecida.

O fato é que “a vida” nos levou a isso, à “coisificação” do humano, onde a mais-valia é vista em seu sentido puramente capitalista de produção versus horas de trabalho. Não há tempo para o desenvolvimento pessoal, expressão essa vista até mesmo com certa ojeriza por grande parte das empresas, que o tem (o desenvolvimento pessoal) como um custo a mais, sem enxergarem o benefício que pode ser auferido posteriormente, com o incremento na produção, para citar o mínimo.

O sonho de Aristóteles, o filósofo estagirita, era de que as máquinas substituíssem o trabalho braçal, para que os homens (ou os cidadãos, na época) tivessem mais tempo livre para se dedicar aos seus interesses. Qual seria seu espanto ao ver o nível técnico a que a humanidade ascendeu, mas em detrimento de seu nível moral, intelectual, físico e mesmo mental. Temos robôs que realizam os mais diversos tipos de serviços, máquinas que substituem com precisão funcionários em diversos postos de trabalho, facilidades que nos possibilitam produzir mais sem termos que nos deslocar ao local de trabalho e, no entanto, o que vemos é a mais completa inversão de valores.

Tudo isso só nos levou a uma ganância desmedida, tornando-nos competidores implacáveis, sempre em busca de metas, de cumprimento de prazos, de superação, para ter, como galardão, uma posição de destaque, que, por sua vez, irá nos conferir mais trabalho e responsabilidade. Caímos então em um círculo vicioso, mas sequer nos apercebemos disso, pois temos que “fazer o nosso melhor”. Para quem?

Não somos máquinas, já dizia Charles Chaplin em um de seus memoráveis filmes. Somos homens, jamais deveríamos nos esquecer disso. Por mais que pensemos de forma contrária, devemos suprir diversas necessidades para que possamos desempenhar, a contento, nossas mais básicas funções. Ninguém pode viver perseguindo uma quimera, um sonho vazio ou inalcançável. Além disso, somos falíveis e deveríamos aceitar com mais naturalidade esse aspecto de nossa natureza.

O sentido das coisas perdeu-se ou, o que é mais, perverteu-se. Faculdades não ensinam mais, alunos fingem que aprendem, profissionais fingem que são realizados com a função que exercem. Rumamos a uma encenação coletiva geral, na qual, daqui a não muito, não saberemos mais nem mesmo quem somos, tamanho nosso esforço para sermos aceitos conforme os padrões externos. Que tempos, que costumes!

(*) Fábio Coutinho de Andrade é advogado

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