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Mariluce, estrela que não apaga

Por Semy Ferraz (*) | 21/02/2014 11:23

Campo Grande – ou melhor, o Brasil e o mundo –, todos nós, perdemos, no triste entardecer de 18 de fevereiro, a doutora em Serviço Social Mariluce Bittar. Gente de coração grande, olhar generoso e comportamento solidário. A sua inarredável determinação de guerreira vitoriosa não suportou a traiçoeira agressão de um câncer no cérebro e, discreta como sempre, se eternizou com o pôr-do-sol campo-grandense, que sempre amou.

Mas já é uma estrela da constelação de Marte, dos guerreiros imortais, que não cessam, não se apagam, para iluminar as novas gerações, por toda a eternidade. Afinal, não foi apenas uma incansável e exemplar professora e pesquisadora na mesma instituição em que se formou, num tempo em que participar do Movimento Estudantil era pôr a própria vida a prêmio. Desde a mais tenra juventude foi uma exemplar militante das causas justas, da reparação da dívida social que temos com a imensa maioria do povo brasileiro.

Minha contemporânea no Movimento Estudantil, Mariluce foi dirigente de um diretório acadêmico que irradiava inquietude a todos os demais companheiros de luta. Ainda que aluna de uma instituição privada (até porque o curso de Serviço Social só era oferecido na antiga FUCMT), não temia qualquer tipo de "patrulhamento ideológico" (expressão da época), eis que até no seio de sua própria Família ousava tomar posição, mesmo que minoritária.

Não por acaso sua clara opção por fundar o Partido dos Trabalhadores ao lado de proletários como Ezequiel Lima, Irineu Werner, Jandir de Oliveira e Neguinho do Frigorífico Bordon. A sua convicção vinha não apenas da sensibilidade social de seu olhar generoso: seu embasamento teórico era capaz de desarticular os argumentos mais elaborados de seus interlocutores, no afã de tê-la ao seu lado em projeto um tanto diferente do da construção do sonhado "partido de trabalhadores, sem patrões", então pretendido com boa dose de ousadia.

Avessa à exposição, ao "exibicionismo" (hoje se diz "visibilidade"), a discreta e inquebrantável militante petista de primeiríssima hora, desde os mais remotos tempos do PT, jamais aceitou assumir cargos de direção. Era uma "basista" (das bases, característica de nosso partido) coerente e rigorosamente intransigente, no bom sentido. Mesmo sabendo da carência de quadros de referência, ela declinava de qualquer convite ou convocação para funções que fugissem ao seu perfil discreto e recatado.

Durante os oito anos do pioneiro governo popular de Mato Grosso do Sul, ela se reservava o direito de manifestar sua discordância com certas orientações adotadas no exercício do poder, de modo disciplinado e orgânico, por meio de interlocutores do próprio partido, mas sem jamais abrir mão de seu direito de crítica.

Seu domínio do exercício da crítica a tornou, em tempo recorde, doutora em Serviço Social, pesquisando sobre o que chamou com propriedade de "primeiro-damismo" na condução das políticas de Assistência Social em âmbito estadual (durante a curta história de Mato Grosso do Sul, instalado em 1979).

O mesmo durante os oito anos do mandato do Presidente Lula, a despeito dos avanços promovidos, sobretudo com a implantação do SUAS (Sistema Único de Assistência Social), do qual era partidária declarada, mas com sérias reservas, no particular.

O seu legado permanecerá, até porque está multiplicado em cada uma de suas centenas de alunas ao longo de sua produtiva carreira docente. Mas a lacuna que se abriu com a sua prematura partida, esta, por certo, ficará aberta, como uma ferida que nem o tempo nem a distância poderá recompor. E para a sua querida Família, ainda mais, para os quais deixamos nossa sincera manifestação de solidariedade.

(*) Semy Alves Ferraz é engenheiro civil e secretário de Infraestrutura, Transporte e Habitação de Campo Grande.

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