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Nos tempos da Rua D. Aquino - IV

Por Heitor Freire* | 10/01/2012 11:30

Como já relatei antes, no apartamento do edifício Arnaldo Serra, onde eu vivi com a minha família na década de 70, nos sempre tínhamos como hóspedes, os parentes que vinham do interior para passeio, tratar da saúde ou de negócios. Assim hospedamos também algumas vezes, o tio Matajá, Alberto Costa (casado com a tia Júlia) farmacêutico prático que quando tinha farmácia no distrito de Campestre, localizado entre Ponta Porã e Bela Vista, fazia também as vezes de médico. Ele dizia que se não curasse, matava já – daí o seu apelido. Ele foi aprendendo a medicar e o fazia muito bem. Uma das vezes que aqui esteve sofreu um princípio de enfarto e foi internado num dos mais renomados hospitais da nossa capital. Ao voltar a si, perguntou quanto seria a conta do atendimento. Ao saber, arrancou todos os fios que o ligavam aos aparelhos e falou que estava curado, dando-se alta por ato próprio.

Um dos nossos hóspedes mais frequentes eram tio Ticu (Hortêncio Rôa Escobar, irmão do meu sogro), e a sua mulher, tia Bernarda. Eles tiveram uma vida muito movimentada e até fascinante. Tiveram quatro filhos que, naturalmente, passaram a conviver com seus outros quatro irmãos do primeiro casamento dela. A tia Bernarda é uma cozinheira de mão cheia e muito trabalhadora. Enfrentando junto com o tio Ticu as dificuldades iniciais que todo casal enfrenta, resolveram montar um bar em Bela Vista, a que deram o nome de A Petisqueira, cujos salgados deliciosos eram preparados por ela.

Para diversificar as atividades, o tio Ticu se tornou agente da loteria estadual de Mato Grosso, vendendo os seus bilhetes. Na véspera da data do sorteio semanal, os bilhetes remanescentes deveriam ser devolvidos por malote com hora e data do embarque certificados. Pois bem. Uma vez, o tio Ticu precisou viajar e deixou bem recomendando que não se esquecessem da devolução, a tempo e hora, dos bilhetes não vendidos. Acontece que a tia Bernarda envolvida com os salgados e o atendimento do bar, acabou se esquecendo de tomar essa providência. Quando se lembrou já era tarde. Aí não tinha mais jeito, foi um Deus me acuda. Ficou muito contrariada. Como explicar para o tio? Para resumir a história, um dos bilhetes que ficaram foi o premiado e eles ganharam o grande prêmio. Demonstrando-se assim, mais uma vez, que Deus escreve certo por linhas tortas.

Foi assim que eles compraram a casa com fundos para o rio Apa, onde se estabeleceram com um comércio. Logo depois ele passou no concurso para coletor e fecharam a casa comercial. O tio Ticu tinha um amigo advogado, Carlinhos Medeiros que dizia que agora, com a mudança do status social, ele tinha que mudar o seu apelido para Tiânus.

A tia Bernarda vive lá até hoje, na casa adquirida com o dinheiro ganho na loteria, na plenitude de seus noventa anos recentemente comemorados, cercada pelo respeito e carinho da população de Bela Vista e pelos seus filhos, netos, bisnetos e trinetos. Vivendo sempre com a alegria que lhe é peculiar.

No prédio onde morávamos, o Arnaldo Serra, fizemos naturalmente muitas amizades, muitas vezes decorrentes dos relacionamentos das nossas filhas que sempre foram muito comunicativas.

Lembro-me do casal Moacir e Leontina. Ele trabalhava no Frigorífico Bordon. Tinham seis filhos, quatro homens e duas meninas. Destes se destacava a Silvana, a caçula, uma loirinha muito simpática, alegre e bonita. Ela cantava aos domingos num programa da TV Morena “Faça uma criança sorrir”, apresentado pelo grande comunicador João Bosco de Medeiros – que até hoje está no ar comandando agora um programa de rádio “Alto Astral”. Ela era a celebridade do prédio. Apesar de toda popularidade que desfrutava sempre foi muito simples sem se deixar envolver pelos destaques dos holofotes.

Como é bom ter histórias como estas para contar.

(*) Heitor Freire é corretor de imóveis e advogado.

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