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O Ciclo das águas no Pantanal e a cheia de 2011

Ivan Lima, Emiko Resende e José Filho (*) | 25/03/2011 10:38

A dinâmica hidrológica no Pantanal é regida pela força das águas das chuvas que se desenrolam ao longo dos meses de outubro a março. De modo geral, ocorre mais chuva nas cabeceiras do Planalto, de forma que a cheia anual resulta em ondas de escoamento que descem paulatinamente pelas distintas sub-regiões da planície pantaneira. O nível do rio Paraguai em Ladário, de certa forma, representa uma integração e “suavização” de boa parte dessas ondas de escoamento, resultando em uma onda usualmente unimodal, cuja amplitude e duração dependem de diversos fatores como a condição inicial da planície após a fase de vazante, e a distribuição espacial e temporal e a intensidade da precipitação ao longo do período chuvoso.

Tendo em vista que as chuvas são derivadas da dinâmica planetária em relação ao Sol e a complexos fenômenos de dinâmica dos fluidos (interações oceano-atmosfera), é possível afirmar que um ano raramente é igual ao seguinte. A esse fenômeno damos o nome de anti-persistência. Contudo, fenômenos mais persistentes de grande escala ocorrem numa frequência mais baixa (décadas), como as alterações da temperatura superficial do mar. Tais mudanças interferem diretamente na circulação atmosférica e na distribuição e intensidade de chuvas sobre os continentes.

É possível verificar esses fenômenos anti-persistentes (interanual) e persistentes (interdecadal) na régua centenária de Ladário, instalada e mantida com o esforço da Marinha Brasileira (Tabela 1).

Tabela 1. Valores máximos das cheias anuais registradas em Ládário, Pantanal do Mato Grosso do Sul, nos últimos 109 anos (1900-2009).

 O Ciclo das águas no Pantanal e a cheia de 2011

Como se pode verificar, as mudanças da cheia de um ano para outro são usualmente anti-persistentes, ora mais ora menos significativas. As cores das legendas ressaltam extremos de cheia (em azul cheia > 6 metros; e em amarelo e vermelho cheia

Na transição 2010/2011 o nível do rio Paraguai em Ladário manteve-se ao redor de 1 metro ao longo de 2,5 meses (de novembro a meados de janeiro), quando as precipitações foram abaixo da média histórica. Contudo, a partir do dia 17 de janeiro houve uma mudança repentina e tem chovido intensa e persistentemente na região. Somente no mês de fevereiro a chuva superou os 450 mm em Corumbá. O reflexo dessa quantidade extraordinária de chuva no Pantanal pode ser verificado na Figura 1. O nível do rio subiu mais de 2 metros em aproximadamente 2,5 meses, atingindo marcas similares àquelas verificadas em anos de grandes cheias, como 1980, 1982 e 1988. Não é possível, no entanto, precisar se a cheia de 2011 seria um indicativo de um novo período persistente de cheia, como ocorreu após 1974, ou trata-se apenas de uma anti-persistência interanual.

 O Ciclo das águas no Pantanal e a cheia de 2011

Figura 1. Comparação do nível do rio Paraguai em Ladário em 2011 relativos a outros anos da década de 80 e no ano de 1995, caracterizados por cheias significativas.

Munidos dessas informações, e com base também no Modelo de Previsão de Cheia (MODELAD), a Embrapa Pantanal vem divulgando cenários plausíveis para a cheia em 2011. A primeira previsão em 31 de janeiro indicava uma cheia entre 3,5 e 4,5 metros e a segunda previsão feita recentemente em 28 de fevereiro sugeria uma cheia entre 4 e 5 metros. A equação do MODELAD a ser usada em março é dada por zmax = 3,05 x ln(z) + 1,06, onde zmax representa o valor da cheia anual em metros, ln representa o logaritmo neperiano e z é o nível do rio em Ladário no dia 31 de março, também em metros. Hoje é possível estimar o estado do rio Paraguai em Ladário no dia 31 de março, assumindo diferentes taxas de incremento diário (Figura 2).

 O Ciclo das águas no Pantanal e a cheia de 2011

Figura 2. Cenários plausíveis do nível do rio Paraguai em Ladário para o dia 31 de março de 2011 em função de diferentes taxas de incremento, variando de 3 a 8 cm/dia.

A partir dessa análise de prospecção de cenários plausíveis verifica-se que o nível no dia 31 de março pode se situar aproximadamente entre 4 e 5 metros, dependendo da taxa média de incremento diário ao longo dos próximos dias. Com essa perspectiva e a equação do MODELAD para o mês de março podemos estabelecer cenários plausíveis para a cheia de 2011, que pode se situar entre 5,4 e 6 metros, a ocorrer entre meados e fim de abril. Tendo em vista que a previsão feita pela equação de março tem erro médio de 0,43 metros, um intervalo mais plausível seria entre 5 e 6,4 metros. Portanto, a cheia de 2011 pode ser similar aos anos de 1980, 1982, 1988 ou 1984, dependendo da força da onda de escoamento de água chegando do planalto, e das chuvas ao longo do mês de março, as quais podem ser ainda intensas.

(*) Ivan Bergier Tavares de Lima (ivan@cpap.embrapa.br), Emiko Kawakami de Resende e José Aníbal Comastri Filho são pesquisadores da Embrapa Pantanal.

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