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O fim das licitações para serviços jurídicos?

Por Marcelo Rocha (*) | 19/12/2012 15:12

Com a concorrência acirrada no “Mercado” de serviços jurídicos junto a empresas privadas notamos nos últimos anos um grande movimento de escritórios de advocacia, que procuraram se organizar no intuito de disputar licitações para a contratação de serviços jurídicos. A bem da verdade houve no mesmo período uma grande “oferta” por parte dos órgãos públicos destes serviços considerados essenciais.

Contudo o que se observa é que todo esse esforço fora feito deixando de lado algumas questões de suma importância: como os valores éticos que devem reger uma relação como esta.

O sucesso na adjudicação de um contrato público, frequentemente se decide com exigências contidas nos editais que beiram o ilícito como presença permanente de profissionais na sede da contratante (!), capital social em torno de 15% do valor estimado para contratação (!), filial estabelecida em Brasília, software de controle de processos igual ao da contratante e até linha telefônica 0800. Tudo isso aliado ao menor preço apresentado e em modalidades como “pregão eletrônico” criado pela Lei Federal 10.520/2002, tratando o nobre serviço da advocacia como um verdadeiro leilão, em arrepio ao contido na Lei 8.906/94 (Estatuto da OAB, que disciplina a conduta profissional, entre outros) e o próprio Código de Ética e Disciplina que veda a mercantilização dos serviços.

O fato é que, em nome da contratação que melhor atendesse o interesse público, aspectos importantes foram inobservados, incompatibilidades éticas deixadas de lado e a mercantilização prevaleceu.

Contudo, sensível a situação insustentável o Conselho Federal da Ordem dos Advogados publicou no último dia 23/10/2001 as SÚMULAS Nº 04 e 05 do Conselho Pleno, estabelecendo que é inexigível licitação para serviço advocatício.

A Súmula 04 tratou de elevar e reconhecer a especificidade dos trabalhos do advogado, disciplinando ainda que aqueles que a desempenham com reconhecida técnica e especialização não podem se sujeitar a critérios de disputa e mercantil, participando de verdadeiros leilões, desvalorizando sua imagem, conduta e reputação.

Tão importante quanto, ou talvez até mais a Súmula 05, complementou protegendo de ações cíveis e criminais o advogado que na condição de gestor público, através de parecer técnico legitime a contração de serviços jurídicos dispensando o procedimentos licitatório.

A bem da verdade, não temos a intenção de demonizar a licitação pública para referida contratação e apenas sim adequá-la ao correto exercício da profissão sem que o mesmo seja aviltado.

A própria Lei 8.666/1993, que trata das Licitações Publicas, tem previsão expressa, em seu artigo 25, caput, onde prevê a inexigibilidade da licitação, em momentos onde não puder haver disputa, e inclui em seu artigo 13, os serviços de advocacia, contencioso e consultivo, exigindo para tanto o notório saber e singularidade.

E o que viriam a ser essas definições?

O Ilustre Jurista Celso Antonio Bandeira de Mello nos ensina:

A notória especialização é verificada quando a empresa ou o profissional, através de desempenho anterior, estudos, publicações, organização, técnica, resultados de serviços anteriores, permita identificar que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação das necessidades do ente público tomador do serviço.

Já o serviço singular é aquele ministrado por profissional que, comprovadamente, demonstre, em trabalhos anteriores, a sua destacada habilidade técnica, que o credencia para o objeto do contrato. Essa singularidade poderá decorrer também da própria profissão do contratado, pois determinados ofícios não são objeto de competição pelo menor preço, como por exemplo a prestação de serviços jurídicos. (MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Licitação - Inexigibilidade – Serviço Singular, in RDA 202, out/dez/2005p. 368.)

Em nosso entendimento, as súmulas vieram em bom momento impedindo a desqualificação da advocacia e sua transformação em um bem fungível e mercantil.

Uma vez que trata-se de um trabalho intelectual, a disputa por meio de aferimento que funda-se apenas em estruturas e preço, expõe o profissional ou sua banca a escolhas objetivas, equiparando-o a fabricação de coisas ou obra concreta.

Assim sendo, em respeito a individualidade dos advogados deveriam ser observadas também para contratação, sua conduta ao longo dos anos, confiança reconhecida por seus clientes, histórico social, interesse e atuação no órgão de classe e tantos outros mais afetos ao regular exercício da profissão.

Por derradeiro, temos que também nos preocupar que essa evolução, não venha a fomentar desmandos dos gestores públicos como se tivessem um talão de cheques assinados em branco e desvirtuar o fim para o qual foram editadas as referidas Súmulas, tornando isso um “bom negócio”, para eles.

(*) Marcelo Rocha é pós-graduado e especialista em Direito do Trabalho Empresarial, MBA, especialista em Direito da Tecnologia da Informação, todos pela FGV – Fundação Getúlio Vargas. Sócio Fundador do Escritório Rocha, Calderon e Advogados Associados.

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