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O “Programa Mais Médicos” e a crise da política de investimento por polos

Bruno Ferreira Campos (*) | 23/07/2013 15:56

A polêmica sobre os problemas na área médica, em decorrência, sobretudo, das tomadas de decisão por parte do governo, através de medidas provisórias, tem posto em voga um tema, até pouco tempo, restrito a este segmento. Os argumentos que partem do governo se fundam na necessidade de sanar a má distribuição destes profissionais pelo território nacional. Por parte da população, em geral, grande parte dela recém iniciada nesta discussão, há os que simplesmente repetem a opinião do editorial das principais mídias da imprensa golpista do país.(*) Bruno Ferreira Campos

De outro lado há aqueles que apoiam a tomada de decisão do governo mais progressista da neodemocracia brasileira, por entenderem que a vinda de médicos cubanos reforça o “projeto da esquerda” e ajuda a romper com o elitismo presente no segmento médico. E, finalmente, os médicos, sujeitos e objetos centrais do embate, se posicionam predominantemente contrários ao “Programa Mais Médicos” do governo federal, alegando não faltar médicos, mas sim condições para a fixação de um contingente profissional adequado nas áreas mais remotas do país.

Em meio a este emaranhado de opiniões cruzadas, algumas sensatas, outras muitas nem tanto, foco minha reflexão na existência de áreas remotas no país. Entendo ser este o pano de fundo desta polêmica, que, por não interessar os posicionamentos imediatistas, de ambos os lados, não tem sido parte dos aspectos a serem discutidos e superados.
Após 514 anos de colonização, a permanência da baixa incidência de ocupação destas áreas se justifica, de um lado, pelas características naturais do território, vide o caso da Amazônia e do Pantanal, por exemplo.

No entanto, a configuração deste cenário se explica, acima de tudo, pela opção do Estado brasileiro, em determinado(s) momento(s) de sua história, em concentrar investimentos e assim estimular a formação de polos de desenvolvimento. A partir da década de 1970 houve uma adesão e maior priorização desta política, inspirada nas experiências decorrentes da teoria dos polos de crescimento/desenvolvimento, que tem como seu principal precursor o economista francês François Perroux.

Segundo esta teoria, os investimentos devem ser direcionados pelo Estado às cidades-polo, via implantação de distritos industriais e de aparatos infraestruturais, necessário ao seu funcionamento, que induziriam odesenvolvimento das cidades polarizadas. Dentre estes aparatos infraestruturais situam-se tanto estradas, pontes, portos-secos, ferrovias, ligados estritamente à viabilização da produção, como também os investimentos nos serviços públicos de saúde, educação, cultura, esporte e lazer, por exemplo. Ou seja, as condições para a realização da produção, de um lado, e para a realização da vida de outro, acabam sendo concentradas e certos pontos do território nacional, nas cidades que são selecionadas justamente por se destacarem em relação aos municípios e núcleos urbanos menos desenvolvidos.

A crise decorrente da falta de médicos em grande parte do país é uma manifestação perfeita da contradição desta política, aderida, em maior peso, na década de 1970 e que ainda é base para a elaboração das políticas, planos, programas e projetos de investimento/crescimento/desenvolvimento por parte do Estado. A questão que emerge, então, é que não há a concentração de investimentos e, consequentemente, de pessoas (leia-se pessoal, recursos humanos, profissionais) apenas no que diz respeito à área médica. Outros segmentos produtivos e de serviços não se desenvolvem em grande parte do interior do país devido aos equívocos desta política, que acreditava e acredita que o investimento nos polos identificados se espraiaria, convertendo-se em desenvolvimento para os demais municípios polarizados.

Seguindo uma lógica contrária, isto acabou por ampliar a desigualdade no desenvolvimento entre estes municípios, gerando uma fuga de investimentos públicos e privados e de pessoas dos municípios menores para os municípios maiores, acirrando também as desigualdades e mazelas intraurbanas no que ficou denominado de cidades-polos, grandes núcleos urbanos, a exemplo do que tem se transformado Dourados, em Mato Grosso do Sul.

Há a necessidade de repensar e até mesmo romper com esta política de investimento. O Estado, que permanece além de governos X ou Y, no entanto, não tem assumido a sua participação na configuração histórica deste cenário, quando passou a utilizar e reproduzir, na prática, a teoria contraditória de Perrox.

Faz-se necessário ir além de picuinhas oportunistas e pensarmos seriamente numa outra política de interiorização do país, que passa, por exemplo, pela mais do que necessária Reforma Agrária, aspecto central para a redistribuição equacional de pessoas pelo território, redefinindo relações e fluxos de produção no campo, base para as demais etapas da cadeia produtiva e assim de uma nova configuração na rede urbana de serviços do país.

(*) Bacharel em Gestão Ambiental, graduando do curso de Licenciatura e mestrando do Programa de Pós-Graduação em Geografia pela UFGD

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