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Os valores éticos e morais na atuação parlamentar são elásticos?

Por José Matias-Pereira (*) | 07/04/2013 09:27

As recentes eleições dos novos dirigentes do parlamento brasileiro receberam um enorme destaque por parte mídia. Essas coberturas, em geral, tinham como pano de fundo, fatos que envolviam os dois principais candidatos a possíveis desvios nos campos éticos e morais. Sem entrar no mérito das acusações - as quais estão sendo analisadas nos âmbitos do Ministério Público e do Poder Judiciário - merece uma maior reflexão o teor do discurso feito pelo novo presidente do Senado Federal, pouco antes da sua eleição. Eleito com 56 votos dos seus pares, o que equivale a 71% do total dos senadores, ele retornou seis anos depois ao cargo ao qual renunciou, depois de ter sido alvo de denúncias de corrupção, acusado de ter parte de suas despesas pessoais custeadas por uma empreiteira. A renúncia ao cargo de presidente do Senado, segundo noticiado na ocasião, fez parte num acordo político que impediu uma possível cassação do seu mandato.

Entendemos relevante destacar no seu pronunciamento a afirmação de que “a ética não é objetivo em si mesmo. O objetivo em si mesmo é o Brasil, é o interesse nacional”, sintetizando que a “ética é meio, não é fim.” Considerando as distorções contidas nessa afirmação, visto que é sabido que ética e política interagem de forma permanente, temos como propósito neste artigo abordar algumas questões relevantes que envolvem a compreensão da ética e da moral. Pressupomos que a ética é obrigação da nação, por ser um princípio indispensável na construção de uma sociedade democrática e justa.

Inúmeros filósofos e pensadores, em distintos períodos da historia, a começar pelos gregos, trataram especificamente dos temas relacionados com a ética e com a moral. Os pré-socráticos, Aristóteles, os estoicos, os pensadores cristãos: patrísticos, escolásticos e normalistas, Kant, Espinoza, Nietzsche, Paul Tillich, entre outros. A reflexão que o individuo deve fazer na sua busca de responder a pergunta “como devo atuar ante os outros” é o ponto inicial da discussão sobre a moral e a ética. Assim, a questão fundamental da moral e da ética trata sobre a vida em sociedade, o que permite que o ser humano conviva com s outros seres humanos, tendo por referencia a um conjunto de regras e valores que guiam a sua conduta.

A ética, que pode ser aceita como um conjunto de princípios que orientam a atuação do homem, quando estudada no âmbito da gestão pública, apresenta uma profunda integração com a relação que existe entre o Estado e a sociedade. Sua relevância fica mais nítida quando envolve o exercício da cidadania. Nesse sentido é importante assinalar as diferenças básicas que existem entre ética e moral: a ética é um principio, a moral trata sobre os aspectos de condutas especificas; a ética persiste, a moral é passageira; a ética é universal, a moral é cultural; a ética é uma norma, a moral é uma conduta da norma; e a ética é teoria, a moral é prática.

A partir dessas distinções torna-se necessário lembrar que é importante que os governantes, os políticos e os empresários procurem aprofundar mais a sua compreensão sobre o tema – a ética – que deve ser praticada sem distinções, de forma sistemática, por todos os indivíduos numa sociedade. Registre-se que a prática da ética é um dever básico dos que governam ou representam a nação, em particular, na atuação parlamentar, visto que sua prática é essencial para legitimar a instituição parlamento junto à sociedade.

Feitas essas considerações, podemos concluir que, tanto do ponto de vista filosófico como político, a afirmação do novo presidente do Senado Federal de que “a ética é meio, não é fim”, é uma afirmação completamente extemporânea e equivocada. A ética, conforme ensinam os grandes pensadores que se dedicaram ao seu estudo, é a base, ou seja, o alicerce indispensável da nossa convivência em sociedade. A ética não é negociável, nem pode ser elástica, na medida da conveniência de cada indivíduo, empresas, partidos políticos ou governos. A sua prática, sem subterfúgios, é fundamental para a sobrevivência das instituições, do governo, da administração pública e do Estado democrático de direito.

(*) José Matias-Pereira é economista, advogado e doutorado em Ciências Políticas.

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