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Para onde querem levar a profissão médica?

Por Antonio Celso Nunes Nassif (*) | 31/08/2012 08:22

“Não sois máquinas; homens é o que sois”.

(Charles Chaplin)

Certa vez, estava eu, em Salvador, na condição de presidente da AMB, prestigiando um movimento reivindicatório dos médicos estaduais, quando ao ser entrevistado por repórter local, me foi, por uma ela relatado, o seguinte diálogo: “Perguntei ao governador Nilo Coelho, se ele não estava preocupado com uma possível demissão em massa dos médicos”. Em resposta ele teria afirmado com ironia e desprezo: “para mim, médico é como sal: branco, barato e eu encontro em todo o lugar”. Eu preferi não responder naquele momento. O fato passou e o tempo também. Contudo, nos dias de hoje sou obrigado a refletir sobre o que ele disse, diante da triste realidade que atinge o ensino superior, preocupando-me sobremaneira com o que possa vir acontecer.

Nosso país conta, hoje, com 196 escolas médicas. Só neste século foram criados 93 cursos. Nove de uma vez no último dia 5. Outros 18 novos cursos foram autorizados para diversas IES federais, na dependência apenas de ato autorizativo do MEC, para iniciarem seus cursos. Ou seja, 27 novas faculdades autorizadas em apenas um dia. Ao

mesmo tempo, também se aumentava o número de vagas do primeiro ano (1.395 novas vagas) em diversas escolas federais, mais especificamente no Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

É uma verdadeira “festa política”, equivocada e desastrosa, apenas para atender ao desejo do Planalto que quer, porque quer mais 4.500 vagas em medicina.

Além do mais, 51 cursos médicos até agora autorizados a funcionar, precisam ainda submeter-se ao processo de reconhecimento, sem o que os diplomas por elas atribuídos não poderão ser registrados em CRM para o exercício legal da profissão.

Mais autorizações estão a caminho e, provavelmente, virão “enriquecer” o já tão comprometido cenário do ensino médico no Brasil.

Neste verdadeiro “festival de escolas médicas”, a Comissão de Ensino Médico do MEC presidida pelo Prof. Dr. Adib Domingos Jatene, que durante três anos auxiliou, de forma honorífica, as decisões da SESu/MEC, sequer foi consultada, numa demonstração clara de descaso do Ministro da Educação para com seus membros.

A inafastável garantia de qualidade e a necessidade social dos novos cursos foi deixada de lado para que a meta determinada pela Presidenta Dilma seja alcançada.

É oportuno, portanto, citar mais uma vez, o ex-consultor da República, prof. Dr. Saulo Ramos, que no seu Parecer nº SR-78 enfatizou, em dois itens, o seguinte:

Item 33 “A educação, direito de todos e dever do Estado, não pode ser transformada, sobretudo nos cursos superiores, em simulacro diplomado. A sociedade deseja médico que saiba medicina, que se tenha preparado cientificamente para cuidar da saúde do povo e que não seja, pela precariedade do ensino improvisado na industrialização de diplomas, uma ameaça à vida do paciente assim como o advogado mal formado é ameaça ao patrimônio e á liberdade individual e o engenheiro, sem curso sério, é candidato a construir obras que desabarão”.

No item 34: ele arremata seu pensamento: “Não se pode permitir, isto sim, o desabamento da estrutura do ensino brasileiro, com a instalação de curso de medicina sem os mínimos recursos, sem hospital na região, sem corpo docente, sem bisturi. O dever do Estado é ministrar a educação e, no curso superior, assegurar o conhecimento científico que irá, efetivamente, beneficiar a comunidade. O simples diploma não cumpre essa finalidade,

antes, seria um estelionato contra a sociedade e uma grave lesão á teologia constitucional”.

Há que se impedir que, os que integram uma profissão tão digna quanto sublime se transformem em “mercadoria ou máquinas”... e menos ainda, em “sal”.

*Antonio Celso Nunes Nassif foi presidente da Associação Médica Brasileira e é membro da Comissão de Ensino Médico do MEC.

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