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Respeitar a nossa língua é uma forma de fazer educação

Por Nelson Valente (*) | 12/02/2014 14:09

As mudanças impulsionadas pelas novas tecnologias digitais colocaram na tela da TV e na Internet a informação massificada, onde está tudo disponível, de fácil acesso, condensado, daí a dúvida: será o fim do livro? As pessoas vão deixar de ler? A resposta é não. A leitura, com o tempo e a prática vira êxtase, é semelhante a um transe. Ler é participar de uma das mais extraordinárias invenções e revoluções tecnológicas de todos os tempos, que são os sistemas de escrita. Nós não teríamos a Internet hoje, sem os códigos da escrita.

Há menos de duas décadas, as crianças e jovens tinham um acesso limitado às informações e os pais podiam, de algum modo, selecionar aquelas que possuíam um conteúdo condizente com cada idade e capacidade de compreensão, direcionando os interesses para boas fontes como livros clássicos da literatura infantil, bons filmes etc.
Cada língua propõe um modelo de mundo diferente. Por isso não é possível tentar instituir uma língua universal. É preciso, portanto, tentar passar de uma língua para outra. Eu sou a favor do polilinguísmo.

A diversidade das línguas é uma riqueza. Esse é um fato indiscutível, ligado, provavelmente à natureza humana. Durante séculos, não desfrutamos desse tesouro, porque sempre houve uma língua que predominava sobre as demais: o grego, o latim, o francês, o inglês. Creio que, dentro de uma geração, teremos uma classe dirigente bilíngue. Desconhecer as línguas sempre produz a intolerância. Conhecê-las, porém, não é garantia de tolerância. Nos Bálcãs, os sérvios e os croatas entendem-se, e, contudo… No passado, os que se revoltavam mais ferozmente contra o colonizador haviam estudado na metrópole. Pode-se massacrar uma população conhecendo-se perfeitamente sua língua e sua cultura.

O conhecimento torna-se, então, um elemento de irritação ou de rejeição, do mesmo modo que um marido e sua mulher podem acabar brigando cada vez mais a medida que vão convivendo. A língua tem razões que a própria razão desconhece. Minha filha, que é bilíngue, pediu à sua mãe uma noite dessas: “Mamãe, conte-me uma Geschichte.” Para ela, Geschichte é o conto, a história de Chapeuzinho Vermelho. Para nós, é História em 12 volumes.

Respeitar a nossa língua é uma forma de fazer educação.

Em primeiro lugar, pode-se registrar o fato, facilmente comprovável, de que nunca se escreveu e falou tão mal o idioma de Ruy Barbosa. Culpa, quem sabe, da deterioração do nosso sistema de educação básica.
Em segundo, o pouco apreço que devotamos ao gosto pela leitura.

Em terceiro lugar, para não ir muito longe, podemos citar a “contribuição” dos meios televisivos.Comunicadores falam mal, atores não se expressam adequadamente, dublagens são feitas de forma chula, programas infantis deseducam - o que se pode esperar desse triste universo?

Entre as incorreções que destoam no uso da língua, são frequentes pequenos descuidos, até perdoáveis, mas há casos de barbarismo contra a pureza da língua nos aspectos sintáticos, regenciais, ortográficos, sem falarmos de troca tão comum de tratamento, como também de organização ilógica de ideias, o que acarreta, frequentemente, ambiguidades e interpretações errôneas de pensamento.

O importantíssimo é ter em mente: há comunicação, há aprendizado. Se há ação do signo, mentes elaborando conteúdos, há aprendizado, há diálogo.Todo aprendizado ocorre por meio de signos. O processo comunicativo é fundamental à cognição.

(*) Nelson Valente é professor universitário, jornalista e escritor

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