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Trump, liberdade de expressão e nossas (in)tolerâncias sinceras

Por Guilherme Tabosa (*) | 11/11/2016 09:22

Após um longo percurso de avanços, por vezes conquistados em verdadeiras batalhas, sob o empenho da liberdade e evolução humana, a sociedade contemporânea assiste complexa tendência de radicalismos em múltiplas faces e ocasiões. Como exemplos desta tendência é fácil lembrar de alguns fatos notórios da recente história, intolerância religiosa, xenofobismo, violência política e ascensão de figuras autoritárias são ingredientes do atual cenário mundial.

Tais elementos da tendência radical estão estampados em comportamentos europeus frente ao fluxo migratório de refugiados, durante a atual crise brasileira com consideráveis manifestações de apoio para entidades ou pessoas autoritárias, bem como a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, cuja vitória deve ser respeitada por legitimidade daquela democracia, simboliza a ascensão da figura de autoridade e força, da valorização do discurso -aparentemente- sincero em detrimento do discurso -aparentemente- programado para padrões de moralismo, tudo sob sagrada liberdade de expressão.

Se confirmada for a crescente inclinação para que as pessoas desçam dos muros e defendam claramente quais são suas opiniões, por vezes radicais ou impopulares, revisitando ou atualizando seus parâmetros sociais, inevitável será o aumento de invocações da liberdade de expressão, em nosso País um direito fundamental, implicando para sociedade o questionamento de seus usos e limites.

O estudo do fenômeno pode ser promovido pelas diversas áreas do conhecimento. Contudo, algumas ciências tem o dever de investigação para que a humanidade continue caminhando evolutivamente, sem confundir sinceridade com sincerocídio ou autoridade com (in)tolerância, destacando-se as ciências política e jurídica, a primeira pela urgente necessidade de apurar quais são as contemporâneas aspirações do íntimo da sociedade em equação com o aperfeiçoamento dos representantes sociais, enquanto os cientistas jurídicos tem o dever de manter o funcionamento harmônico da sociedade, mesmo que momento seja de brutal atualização dos padrões anteriormente estabelecidos.

Concentrado na ciência jurídica, perceba que não se trata de superficial debate sobre o uso da norma, a superficialidade é superada pela elevada importância que garante a liberdade de expressão por tombamento na Constituição, não por mera previsão formal, mas por verdadeira materialidade, ao passo que corresponde “a uma das mais antigas reivindicações dos homens de todos os tempos”, como afirma Paulo Gustavo Gonet Branco.

Assim, usando a expressão de Ives Gandra Martins Filho “a liberdade é o motor da história, da economia, da política, da ciência e da sociedade”, restando aos operadores de direito o dever de manutenção das liberdades com equilíbrio no eventual conflito com outros direitos, afinal, é pertinente lembrar a famosa frase: “A liberdade de cada um termina onde começa a liberdade do outro”, atribuída por muitos ao filósofo inglês Herbert Spencer.

Alguns assuntos controversos já estão em debate, e outros estão próximos de suas oportunidades para entrar em cena, independentemente de impopularidade ou de visões radicalmente opostas, exigindo dos radicais a consciência de que nenhuma liberdade é absoluta, exigindo de oponentes a noção definida por George Orwell, no sentido que “liberdade é o direito de dizer às pessoas o que elas não querem ouvir”, para que ao final todos sejam pessoas tolerantes e capazes de ouvir sinceridades alheias.

(*) Guilherme Tabosa é advogado

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