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Cidades

Bebês de adolescentes transformam rotina de internas em Unei feminina

Nadyenka Castro | 24/05/2011 13:18

Todas se tornam mãezinhas

A mãe, de vermelho, observa o carinho das companheiras de alojamento que se tornaram "mãezinhas". (Foto: João Garrigó)
A mãe, de vermelho, observa o carinho das companheiras de alojamento que se tornaram "mãezinhas". (Foto: João Garrigó)

É sabido que onde há crianças há mais alegria, pureza e carinho. E foi muito mais do que isso que a pequena Bianca, de apenas 23 dias, levou para os corações das internas da Unei (Unidade de Internação Educacional) Estrela do Amanhã, em Campo Grande.

“Quando a gente olha para ela pensa em mudar de vida, ter um futuro melhor”, diz uma adolescente de 17 anos, que há nove meses está na unidade por assalto.

Ela é uma das garotas que quer estar sempre com a filha da amiga de alojamento nos braços. “Ela é uma princesa. Não pode ficar beijando ela, mas eu beijo escondido”, diz.

Bianca foi para a Unei logo após ter nascido no Hospital Universitário. A mãe, de 17 anos, foi apreendida por tráfico de drogas, no bairro Marcos Roberto, poucos dias antes do nascimento.

As internas não sabiam que iriam ter uma companhia que precisa de muitos cuidados, carinho e atenção. “Nem a gente sabe quem vai vir. Geralmente é flagrante. Quando um bebê chega é sempre uma festa”, diz a diretora da unidade, Carmem Lígia Loureiro Carmelo.

E assim como em outras casas, a Unei se transforma em um lar. “Suaviza o clima entre elas [internas]. Todas se sentem mais ou menos mães”, conta Carmem. “O clima já é bom, mas quando há um bebê elas ficam mais próximas uma das outras. Adoça não só as meninas, mas nós [funcionários] também”, finaliza a diretora.

Com brilho nos olhos, o juiz da Vara da Infância e da Adolescência, Danilo Burim, se autodeclara avô da recém-nascida e lembra que a situação muda o comportamento das garotas. “O interessante é que muda. Elas ficam mais tranqüilas. Todas se tornam mãezinhas”.

Adolescente leva a "filha adotiva" para dar bom dia às outras garotas, enquanto mãe trocava de roupa. (Foto: João Garrrigó)
Adolescente leva a "filha adotiva" para dar bom dia às outras garotas, enquanto mãe trocava de roupa. (Foto: João Garrrigó)

E foi esse o sentimento que despertou na maioria delas. Duas, de 14 e 15 anos, deram o primeiro banho na recém nascida quando ela chegou à Unei. “Dá vontade de ser mãe”, diz a mais nova, apreendida por tráfico de drogas. “É muito fofinho. A vontade é de cuidar, de abraçar, de cheirar”, fala a mais velha, que está na unidade porque desacatou o juiz.

Ela é mãe de uma menina de um ano e um mês, afirma sentir saudades da filha e também ajuda a orientar a mãe de Bianca, assim como as funcionárias, nos cuidados com a bebê.

São alguns desses cuidados que as internas sabem de cor e tiveram que modificar a rotina. “Tem que ter silêncio, deixar tudo limpo, organizado”, conta a garota de 16 anos, apreendida por tráfico de drogas há dois meses.

“Ela é tão pequenininha, muito frágil. Todo mundo gosta”, diz a adolescente. Apesar de também estar encantada com Bianca ela pensa nas responsabilidades e por isso não quer ter um filho tão cedo.

A mãe da neném aprova os cuidados e o carinho das amigas. “Eu só fico com ela no colo para dar mama. Elas trocam, dão banho. De vez em quando até discutem. Elas me ajudam”, revela.

A mamãe divide o alojamento com outras quatro “mãezinhas”, as mais “babonas” entre as 11 internas. Na madrugada, quando Bianca chora, elas alertam a amiga. “Ela quase não chora. Mas quando chora a gente chama a mãe”.

Essa responsabilidade que toda mãe tem, ou deveria ter, a de Bianca demonstra ter aprendido. “Agora é tudo para ela. Não é mais nada para mim”. “Quando sair daqui vou morar com meu esposo e com ela. Ele vai trabalhar e eu vou cuidar”.

As funcionárias da Unei orientam todas as jovens. Algumas, apesar do instinto materno aguçado, começam a ter medo de engravidar diante da trabalhosa rotina. “Elas começam a ficar com medo”, declara a assistente social Patrícia Alencar Lima da Rosa.

Família- Patrícia e a também assistente social da Unei, Lina Maria de Arruda Silva, contam que a família da “mãe” é presente, assim como o esposo. “A família ajuda. Traz fralda, roupinha”, conta Patrícia.

“Isso é importante”, diz o juiz Danilo Burim. Ele explica que o fato de estar gestante ou ter um recém nascido não implica em benefícios para a infratora. Ela fica na Unei o tempo determinado pela Justiça, independente do filho.

Adolescentes mostram trabalhos em argila. (Foto: João Garrigó)
Adolescentes mostram trabalhos em argila. (Foto: João Garrigó)

Enxoval - Bianca dorme no carrinho ou com a mãe na cama. O carrinho é resultado da ajuda da Vara da Infância e da Juventude, que sempre que chega um bebê na Unei, tem que correr para conseguir o mínimo necessário para um dia-a-dia decente.

Futuro- Para ajudar as meninas a ter um futuro melhor são oferecidos diversos cursos durante o ano. Agora, elas estão aprendendo a trabalhar com argila.

Já confeccionaram alguns produtos, que estão em fase de finalização. “Olha onde reflete a presença de um bebê”, diz o juiz mostrando os animais que estão com seus “filhos” nas costas.

“É maravilhoso esse trabalho”, define uma das adolescentes. Àquela que disse que não quer ser mãe. “Foi uma coisa que despertou em mim que eu nem sabia que podia fazer”, finaliza.

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