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Capital

Adolescentes tentam burlar Justiça para entrar em festa proibida no Morenão

Paula Maciulevicius | 24/07/2011 07:44

Com as mais diversas “desculpas” para ausência de RG, adolescentes tentam convencer até com documentação falsa

Apesar de faixa visível, adolescentes ainda argumentavam que não sabiam da proibição. (Foto: João Garrigó)
Apesar de faixa visível, adolescentes ainda argumentavam que não sabiam da proibição. (Foto: João Garrigó)

Na fila quilométrica de entrada, já se ouvia de longe “ingresso e documento nas mãos”. O pedido era para facilitar o trabalho dos seguranças e dificultar a tentaviva de entrada de adolescentes no evento. A festa em comemoração ao aniversário de uma boate da Capital, foi nesta noite de sábado para domingo, no estádio Morenão e contou com a presença não só dos apreciadores da música eletrônica, como do Conselho Tutelar a da Depca (Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente).

Entre revolta e desculpas um tanto esfarrapadas, o Conselho barrou mesmo, quem estava sem documento. O caso é mais comum do que se imagina e mostra que o campo-grandense não sai de casa com carteira de identificação e quando sai, não quer mostrar. Os “sem documento” tiveram que voltar para casa, ou até o carro para pensar em uma saída melhor.

Revoltado, o vendedor Bruno Vasconcelos, que disse ter 19 anos, aguardava um amigo trazer os seus documentos. “Onde consta que é obrigatório no convite ter acima de 18 anos para entrar?” questiona. Apesar de ter a maioridade, ele afirma que “dessa vez, é verdade”, diferente das mais de 50 festas que ele diz ter ido sem precisar apresentar documento. “A festa não é open bar, você não tem como provar se eu vou consumir álcool ou não, então não devia proibir”, acrescenta.

Bruno e muitos outros aguardavam para que a solução que permitisse a entrada na festa, chegasse, seja ela a desistência dos conselheiros tutelares até a chegada de um documento que “salvasse” a pele. Wendel Vicari, há três dias de completar 18 conseguiu entrar na festa, acompanhado de familiares maiores de 18 anos. A autorização dada pelo Conselho Tutelar à ele foi vista como “palhaçada”.

Por determinação judicial, equipes da Depca também foram ao evento para tentar coibir entrada de menores de 18 anos. (Foto: João Garrigó)
Por determinação judicial, equipes da Depca também foram ao evento para tentar coibir entrada de menores de 18 anos. (Foto: João Garrigó)

“É o que eu acho, proibir de beber aqui dentro, sendo que lá fora pode?” pergunta. O jovem admitiu que existem jeitinhos de burlar a segurança, mas que ele nunca precisou usar, porque as abordagens feitas pela segurança foram apenas duas.

Apreensivo, o estudante Lucius Lira de Araújo, de 18 anos, surge apenas com a carteirinha de estudante em mãos e uma justificativa na ponta da língua “perdi meus documentos, mas registrei o BO”, conta à reportagem do Campo Grande News.

O documento não é considerado oficial, muito pelo contrário é visto com maus olhos pelo Conselho Tutelar pela facilidade em falsificações. “A gente sabe que é muito mais fácil de modificá-la”, completa a conselheira Poliana de Almeida, de 24 anos.

Lucius relata que nunca precisou apresentar RG porque sempre teve o nome na lista das principais festas e que a aparência de mais velho ajuda na hora de entrar. “Tenho barba sim, tirei hoje. Se ajuda? E como”, diz.

Apenas com a carteirinha com a data de nascimento errada, que segundo ele, foi preenchida por descuido no ano, o garoto aparece com 19 anos e precisa de persistência e ajuda dos pais, para conseguir entrar.

Através de uma ligação da conselheira Poliana, o pai do estudante disse a data de nascimento e ano verdadeiros, para que o filho pudesse aproveitar. “A gente só liga em último caso, quando observa informação desencontrada ou para confirmar dados que a ausência dos documentos deixa insuficiente”, explica.

Lucius que depois da “saga” entra na festa respondendo “ligaram lá em casa e falaram com o meu pai, confirmando a minha idade”.

Durante o tempo em que o Campo Grande News esteve na fila, a equipe presenciou desculpas sendo construídas, para justificar a ausência de documentos, até uma carteira de habilitação, passada por baixo da grade, para que uma adolescente entrasse se passando por alguém que já estava lá dentro.

Com as mais diversas justificativas, adolescentes tentavam explicar falta de documentos ao Conselho. (Foto: João Garrigó)
Com as mais diversas justificativas, adolescentes tentavam explicar falta de documentos ao Conselho. (Foto: João Garrigó)

As justificativas são mais comuns do que a falta dos documentos. Quem trabalha no ramo da segurança que o diga, histórias não faltam. Um dos festeiros ensaia “você entra como se fosse a minha namorada. É fácil, eu consigo”, argumenta comparando à festas anteriores.

O segurança Alexandro Alves Pereira, de 24 anos, trabalha há um ano em eventos noturnos e já coleciona desculpas para contar. “A gente avisa, não vai entrar, sem documento oficial não entra. Aí eles começam a dizer que deixaram no carro, que perdeu, o amigo está trazendo, que não sabia que ia pedir”, revela. As mulheres então, ainda vão mais além “elas jogam charme para que os seguranças deixem elas entrarem”.

Uma estudante de 17 anos, responde a idade até mais baixo. Fora do colégio, a missão ali é estudar como burlar a barreira montada. Ao tentar entrar, ela foi barrada, mas ainda acredita que possa conseguir. “Vou tentar, resolver isso”, diz. Na fila, a menina ouviu da conselheira que não adianta, sem documento não entra. Ainda ali, ela nem pensava em ir para a casa, a festa parecia ser o objetivo da noite.

Ela descreve ainda como as meninas conseguem passar pelos seguranças. Com salto alto e maquiada, jogar charme para o eles também pode ajudar e às vezes, eles deixam passar, confessa.

Na fila, um pai chegou a pedir que a reportagem do Campo Grande News se afastasse porque estaria atrapalhando a “negociação” dele para a entrada do filho adolescente. O homem se ofereceu de assinar um termo e até mesmo deixar documentos pessoais para que o menino pudesse entrar, tudo em vão. “Mas disseram que podia entrar com um adulto responsável”, tentou dizer à conselheira.

A revolta também era de quem aparentava ter mais de 18 anos e não portava nenhum documento. Uma jovem chegou a desacatar a conselheira na tentativa de intimidar e ter a entrada liberada, o que também não adiantou. A regra era clara e em alto e bom som para todo mundo.

A conselheira Poliana explica a cada um que não é o Conselho Tutelar que decide quem pode entrar e sim a Justiça. “Não temos poder de liberar a entrada, estamos cumprindo ordens pensando no bem estar dos adolescentes. Mas só somos vistos como gente querendo barrar, impedir a diversão”, levanta Poliana.

Alguns documentos falsificados grosseiramente foram recolhidos e serão repassados à juíza da Vara da Infância, por caracterizar crime de adulteração. Fotocópias de certidões de nascimento, montagem pelo computador de RG e até “manual”, com o ano de nascimento rebocado, foram identificados pelos conselheiros tutelares.

Adulteração de documento “grotesca” recolhida pelo Conselho Tutelar. (Foto: João Garrigó)
Adulteração de documento “grotesca” recolhida pelo Conselho Tutelar. (Foto: João Garrigó)

A fiscalização do Conselho é constante, mas ganha maior notoriedade em casos de convocação mediante determinação judicial, como no episódio deste final de semana.

Decisão - A pedido da promotora de Justiça Vera Frost, a Vara da Infância e Juventude determinou ao Conselho Tutelar, Polícia Militar e Polícia Civil que façam plantão na entrada na festa que vai comemorar o primeiro ano da boate Move Clube. O público estimado é de 7 mil pessoas.

O pedido foi feito após denúncias de que menores de 18 anos estão comprando convites para a festa movida a música eletrônica, e com venda de bebida alcoólica.

A presença de adolescentes em eventos onde há comercialização de álcool é vetada por portaria do Juizado, baseada no que determina o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente.

A decisão da Justiça determina que além de exigir documento de quem estiver entrando na festa, as equipes impeçam, também, a venda de bebida alcoólica a menores de idade nas imediações do estádio.

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