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Capital

Ele chegou a roubar e matar por droga, mas quer mudar pelo filho

Paula Vitorino | 16/10/2012 16:39
Ele chegou a roubar e matar por droga, mas quer mudar pelo filho
Adolescente quer nova vida. (Foto: Paula Vitorino)
Adolescente quer nova vida. (Foto: Paula Vitorino)

A conversa é rápida e improvisada, mas em cada frase forma uma história rica ou triste, dependendo da fé em um novo começo. O personagem é um adolescente de 18 anos e o cenário é a sala da Unei (Unidade Educacional de Internação) Dom Bosco. Ele é mais um entre tantos que, por causa da droga, virou estatística da criminalidade.

Há 1 ano e 3 meses ele cumpre medida socioeducativa em regime de internação por  um roubo seguido de morte. O jovem, negro, já com rosto de homem, mas voz de adolescente, conta que roubou uma casa... Segue uma pausa até que ele complete o crime.

“Achei que não tinha ninguém em casa. A mulher apareceu e eu acabei matando”, diz, constrangido.

A vítima foi morta a facadas, no ano passado, quando ele tinha 17 anos. Mas este não foi o primeiro crime. A primeira passagem pela Unei aconteceu em 2009, por 5 meses, após roubo.

Falar do passado causa incômodo ao rapaz e a necessidade da reportagem pedir desculpa pela invasão na sua vida, mas também pedindo que a história continue.

Drogas - E então o primeiro vilão surge: a droga. “Eu tava usando muita droga em 2011. Não tinha dinheiro, parei de estudar, não estava trabalhando e aí fui atrás de dinheiro e acabei matando”,

O adolescente diz que usava pasta-base de cocaína, mas começou com a maconha. Sobre seu grau de dependência na época do homicídio, ele resume dizendo: “eu acho que tava bem feinho”.

Na Unei, o adolescente foi obrigado a se afastar das drogas e da antiga rodinha de amigos também viciados. Nem o uso de cigarro é permitido dentro da unidade.

Além da abstinência forçada, ele contou com o tratamento ambulatorial com medicação e acompanhamento médico da equipe de saúde da Unei e do Caps AD (Centro de Apoio Psicossocial Álcool e Droga), onde os internos são levados para tratamento do vício.

Hoje, ele acredita ter conseguido sair da dependência, mas admite que no caminho em que estava não iria conseguir sozinho e consegue ver um “lado bom” – se é que existe – na internação.

“Se tivesse continuado na rua não iria largar. Eu ter vindo pra cá, recebido o tratamento, me ajudou, mas a minha força de vontade também”, diz.

Adolescente trabalha no chiqueiro montado ao lado da Unei. (Foto: Rodrigo Pazinato)
Adolescente trabalha no chiqueiro montado ao lado da Unei. (Foto: Rodrigo Pazinato)

Pai em liberdade - Deixando o passado de lado, o adolescente garante que está se esforçando para fazer um futuro diferente. E o maior incentivo para escrever uma história com páginas de alegria vem de fora: seu filho de 1 ano e 5 meses.

“Quero ir cuidar do meu filho”, diz.

Ele diz ter consciência da falta que faz ao filho e do mau exemplo que acaba sendo. “Minha mulher já me falou que ele fica chamando por mim, mas eu nunca estou lá”, conta. O adolescente diz que é casado com uma garota de 17 anos.

E agora, como pai, ele volta a sua infância para cortar definitivamente os erros e exemplos do passado, revelando como fez falta a presença de um pai em sua vida. O desejo agora é de ser diferente, garante, e dar para o filho o que nunca teve.

“Eu quero ser um pai que nunca tive. Eu penso em mudar não tanto por mim, é mais por ele”, confessa.

O pai abandonou a família quando o garoto tinha 2 anos. Desde então, ele conta, alguns encontros aconteceram, mas ele sempre ouviu do pai que “eu não quero vocês, não”.

Novo caminho - Como exemplo de que realmente quer ter uma nova vida do lado de fora, ele diz que já tem um serviço ”engatilhado” e, dessa vez, em conformidade com a lei.

“Vou fazer gesso. Meu cunhado disse que tem uma vaga pra mim quando eu sair”, afirma.

Os planos também são de retornar os estudos, que foram interrompidos ainda na 7ª série. “Vou ver se estudo de noite e trabalho de dia”, diz.

Ele é um dos meninos avaliados com bom comportamento na unidade e, por isso, já ganhou o beneficio de passar fins de semana com a família e realizar trabalhos em espaço montado fora da Unei, com horta e chiqueiro.

“A mãe dele veio buscar e trazer. E se continuar assim vai ter direito a sair outras vezes. A gente sabe que tem um contexto familiar difícil, mas ele demonstrar que quer mudança”, diz o vice-diretor Jean Gouveia. Mas a direção avisa que qualquer “deslize” é motivo para quebrar a confiança.

Não existe data determinada para o garoto voltar à liberdade. O benefício depende da avaliação trimestral feita pelo juizado, que considera o bom comportamento e a infração cometida.

“Espero sair bem rápido”, torce.

Junto com o anseio pela liberdade, fica a fé de que os desejos e planos do novo caminho serão realidade do lado de fora da Unei. Em uma realidade longe das drogas, do crime, construindo uma família presente, o final tem tudo para ser feliz.

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