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Internação compulsória é medida para "epidemia de viciados"

Paula Vitorino e Nyelder Rodrigues | 17/11/2012 08:56
Internação compulsória é medida para "epidemia de viciados"
Utensílio para consumir droga era utilizado por adolescente de 16 anos (Foto: Arquivo/Rodrigo Pazinato)
Utensílio para consumir droga era utilizado por adolescente de 16 anos (Foto: Arquivo/Rodrigo Pazinato)

Medida que divide a opinião de juristas e profissionais da saúde, a internação compulsória é considerada pelo juiz federal Odilon de Oliveira como uma necessidade para encarar a “epidemia de viciados” que existe no país, sobretudo no estado de Mato Grosso do Sul.

“A quantidade de viciados é tremendamente grande e não dá para deixar só por conta das famílias, tem que haver uma intervenção do poder público, através da justiça, e mandar internar”, defende Odilon, argumentando que alguns dependentes “já não têm mais noção do seu estado, perderam a compreensão”.

Essa imposição do tratamento, na opinião de alguns juristas, não traz reais resultados após o término do tratamento, já que sem vontade de sair do vício, o usuário volta às drogas. No entanto, Odilon acredita que a internação compulsória dá sim resultado positivo.

“O usuário pode encontrar resistência nos primeiros dias, mas depois a pessoa vai adquirindo consciência e vai aderir ao tratamento”, diz.

Mas na lei, a internação compulsória ainda aparece de forma “tímida”. Para pedir obrigar o tratamento, o juiz precisa combinar e interpretar “um amontoado de leis”. Entre os fundamentos, está o de que o dependente já não é mais capaz de cuidar da sua própria vida e saúde.

“Com a evolução dos direitos humanos houve um retrocesso nas normas, que foram deixando de ser claras a esse respeito. Acho uma hipocrisia tremenda. Deveria proteger o viciado, o obrigando a internar”, defende.

Estrutura e processo de reabilitação - Outra que segue a mesma linha é a psicóloga Jane Oliveira, uma das organizadoras do evento, e especialista em dependência química e diretora da Cooperativa de Saúde Aaron Beck.

Jane explica que a dependência química é uma doença que altera a capacidade de percepção das pessoas, e por isso é necessária a internação compulsória. Entretanto, ela acredita que o modelo de Justiça Terapêutica não funciona sem a montagem de uma estrutura.

Além da capacitação de profissionais, é necessário um local adequado para realizar os atendimentos, além de haver uma maior integração entre as áreas da justiça e saúde para surtir efeito.

Em Campo Grande, já há o projeto para a construção de um centro de reabilitação, que segundo Jane, vai fugir do padrão hospitalar e do estereótipo de manicômio, tanto no sentido terapêutico, como na parte estética das instalações. Uma delas, é que as paredes não serão brancas.

Durante o tratamento, a proposta é que seja feita a reabilitação da capacidade cognitiva do paciente, que depois passaria por um processo de reinserção social. Esta internação seria feita em um período pré-estabelecido, seguindo um plano de terapia para cada grau de dependência e droga a qual o sujeito é dependente.

A internação, feita após determinação judicial, amparada por um laudo de equipe de saúde composta por psicólogo e psiquiatra. No caso, é feita uma comutação, uma troca da pena, sendo a pessoa em reabilitação, após o tratamento em regime interno, seria obrigada a comparecer e fazer teste toxicológico periodicamente.

Juiz Odilon de Oliveira (Foto: Pedro Peralta)
Juiz Odilon de Oliveira (Foto: Pedro Peralta)

E de quem é a decisão? - Se a pessoa já está detida ou respondendo processo penal, entra o papel da Justiça Terapêutica, que oferece ao infrator a possibilidade de ser internado em clínica para tratamento ao invés de ir para a cadeia, explica o juiz Odilon.

A psicóloga Jane também explica que além da internação compulsória, há a involuntária, quando a família do dependente químico pede a internação. Em ambos os casos, a internação só acontece se houver laudo médico constatando a necessidade, e o tratamento é o mesmo.

A diferença básica está na natureza da internação, uma feita a pedido da família, enquanto na outra foi necessária a intervenção do Estado, geralmente em substituição a uma pena.

E nos crimes hediondos? - Porém, a Justiça Terapêutica seria aplicada apenas a autores de crimes de menor potencial. Nos casos de maior gravidade, como os crimes hediondos, o entendimento é outro.

Jane Oliveira defende que a internação compulsória aconteça somente em crimes como furtos, danos ao patrimônio, entre outros de menor potencial. No caso de crimes como o homicídio, a psicóloga acredita que o autor, ao consumidor a droga, assume a responsabilidade pelos atos cometidos sob efeito dela.

Tomando por exemplo o caso em que Evandro Fernandes matou a mulher, a professora Zilca Fernandes, a facadas, a defesa alega insanidade do acusado. Evandro estava sob efeitos de drogas no momento do crime.

Ele já havia parado e voltado a usar diversas vezes, tendo ficado internado em clínicas em várias oportunidades. Ainda assim, por se tratar de um crime hediondo, o entendimento da justiça segue o mesmo raciocínio de Jane, e não se enquadra na Justiça Terapêutica.

Exemplo de fora – Um dos palestrantes do 1º Seminário de Justiça Terapêutico de Mato Grosso do Sul, que aconteceu entre os dias 29 e 30 de outubro, o juiz da Vara de Execuções de Penas Alternativas de Pernambucano, Flávio Fontes, falou sobre as experiências vividas em Pernambuco com um projeto de Justiça Terapêutica.

Durante o seminário, Flávio Fontes conversou sobre as dificuldades encontradas e resultados obtidos na execução do projeto, realizado no próprio fórum, por iniciativa de um grupo de colaboradores, alguns deles voluntários.

Para o juiz, a reabilitação não pode incluir educação formal. A reinserção social, que inclui também o aprendizado profissional, deve ser feita “de leve”, transformando aos poucos o paciente, seguindo o ritmo da reabilitação.

Ele também admite que a reabilitação total possa não acontecer em todos os casos, e que a reabilitação parcial já é positiva, reduzindo os danos, tanto social como pessoal. “Só de não ir para a justiça criminal, já é um avanço”, comenta.

Público - Entre os que acompanhavam o evento, em geral, a opinião sobre o assunto seguia a dos palestrantes. Para o major da Polícia Militar, Luis Fernando Carvalho, a internação compulsória é uma boa alternativa diante da demanda da justiça criminal.

Ele acredita que a pessoa que será tratada tem que ser totalmente incluída no programa de reabilitação, cumprindo a pena simultaneamente ao tratamento indicado pelos laudos e decisão judicial e, só assim, o indivíduo terá condições de reinserção social.

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