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Capital

Moradores de rua se espalham e tomam conta da cidade por esmolas

Zana Zaidan | 24/10/2013 18:06

Em uma passagem rápida pelas ruas de Campo Grande, é fácil encontrar um morador de rua, ou grupos deles, dormindo em calçadas ou pedindo dinheiro em semáforos. O problema não é novo, mas o fato de vermos mais mendigos é explicado pelos próprios moradores de rua e confirmado pela SAS (Secretaria de Assistência Social), que fala em 2 mil indigentes espalhados em diferentes pontos da cidade.

A antiga rodoviária, ponto tradicional de concentração de moradores de rua, já não é mais tão lucrativa para aqueles que dependem de esmolas para sobreviver. A solução é ir para ruas próximas e com grande fluxo de pessoas, como a avenida Afonso Pena, Ernesto Geisel e no entorno do Mercado Municipal.

Na rodoviária velha ficam os próprios moradores de ruas, a maior parte deles usuários de drogas e álcool, ou os comerciantes remanescentes do abandono de depois que a rodoviária mudou de lugar. Por lá, existem vários espaços improvisados onde os moradores dormem, mas, durante o dia, se dispersam para conseguir dinheiro.

Mario fica no semáforo da Afonso Pena, esquina com a Ernesto Geisel, e só mudou de lugar porque enquanto falava com a  reportagem outro colega de rua ocupou o ponto (Foto: Marcos Ermínio)
Mario fica no semáforo da Afonso Pena, esquina com a Ernesto Geisel, e só mudou de lugar porque enquanto falava com a reportagem outro colega de rua ocupou o ponto (Foto: Marcos Ermínio)

“Fica na rodoviária só quem já conseguiu o dinheiro para passar o dia, e isso você não consegue lá né? Viciado vai pedir dinheiro para outro viciado?”, resume o morador de rua Mário Luiz Lima de Souza, 27 anos, que há oito meses saiu de Araçatuba (SP) e veio parar na Capital, sem endereço fixo.

“Minha localidade atualmente é a avenida Afonso Pena”, conta Mário, que se mantém nas proximidades por não conhecer outros lugares da cidade e só se desloca quando tem que trocar de semáforo, por causa da concorrência com outros pedintes.

Lúcido e receptivo, o jovem deixou a mãe – que, segundo ele, deu “tudo que precisava, estudo, casa e comida” - na cidade do interior de São Paulo há 14 anos e foi viver nas ruas depois que a vontade de beber passou a interferir no convívio familiar.

O dinheiro para comprar “um corotinho”, vem dos próprios motoristas. “Nunca menti não. Não faço malabares, não sou artista. Peço o dinheiro, e pronto, e se me perguntam para quê eu digo que é para comprar bebida”, acrescenta dizendo que lucra pelo menos R$ 70 por dia pedindo no semáforo.

“Dá para viver melhor que no Cetremi, por exemplo. Tiro um pouco para comer, compro minha bebida e ainda pago por um banho nesses pensionatos aqui do centro”, explica a rotina, comparada à do Centro de Triagem e Encaminhamento ao Migrante da prefeitura, que oferece hospedagem provisória para moradores de rua até que eles arrumem um emprego.

“O complicado é que não dá para trabalhar para trabalhar porque tô sem documentos, sei os números de cor, mas perdi e ninguém contrata gente sem documentos”, justifica Mário sobre o fato de não arrumar um meio formal de se sustentar.

Elizabete, que sobrevive com restos de alimentos e esmolas (Foto: Marcos Ermínio)
Elizabete, que sobrevive com restos de alimentos e esmolas (Foto: Marcos Ermínio)

Mário consegue abafar as dificuldades de morar na rua, mas não são todos que saem ilesos da mesma forma. Elizabeth, 40 anos, mal conseguia falar, apenas o suficiente para dizer o nome, idade e que sobrevivia de dinheiro pedido na rua, enquanto não pestanejava em comer restos de comida encontrados em um saco de lixo.

Já Ana Paula, 34, é velha conhecida dos comerciantes da rodoviária velha e dos próprios companheiros de rua. “O Cetremi é bom, bom sim. Já fui várias vezes para lá. O problema é que é longe para caramba e quando acaba a bebida, não tem como conseguir. Aí tem que pegar um monte de ônibus e voltar para cá, onde tem quem vende as paradinhas, entende?”.

Ela afirma não sobreviver sem bebida alcoólica ("dói o fígado e saio batendo em quem estiver na minha frente"), mas, enquanto o dinheiro for suficiente para comprar pinga, vai ficar na rua. "Só vou pro Cetremi quando a fome aperta e preciso tomar um banho".

Não dê esmolas - Hoje, 98 moradores estão abrigados no Cetremi. A maioria deles não são moradores permanentes e passam, em média, três dias no centro. Os que ficam são idosos que não teriam condições de sobreviver nas ruas, o restante, passa um tempo, a fim de obter assistência e, em seguida, volta para o lugar de onde saíram, já que a hospedagem é voluntária.

A recomendação da Secretaria de Assistência Social é para não dar esmolas aos moradores de rua. A prática, ao invés de ajudar, incentiva e possibilita a permanência de pessoas nas ruas.

Ana Paula, que enquanto tiver dinheiro e pinga na garrafa, não abandona as ruas (Marcos Ermínio)
Ana Paula, que enquanto tiver dinheiro e pinga na garrafa, não abandona as ruas (Marcos Ermínio)
Albergue "alternativo"próximo à rodoviária velha, um dos espaços onde moradores de rua dormem (Foto: Marcos Ermínio)
Albergue "alternativo"próximo à rodoviária velha, um dos espaços onde moradores de rua dormem (Foto: Marcos Ermínio)
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