ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
ABRIL, QUARTA  17    CAMPO GRANDE 21º

Capital

Tabeliã registra ocorrência após ser ofendida verbalmente por preconceito racial

Paula Vitorino | 15/02/2011 17:21

Cliente disse várias vezes em cartório "Nega ladrona"

Mãe e filho registraram boletim de ocorrência por preconceito racial. (Foto: João Garrigó)
Mãe e filho registraram boletim de ocorrência por preconceito racial. (Foto: João Garrigó)

A tabeliã Joanna D'Arc de Paula, do cartório do 1° ofício de protesto de Campo Grande, registrou boletim de ocorrência na tarde de hoje (15) após ser ofendida verbalmente devido a sua cor.

Uma cliente do cartório exaltou-se no local e, segundo a vítima, disse repetidas vezes a frase “Essa negona tá ficando rica por conta dessas taxas. Essa nega ladrona”.

O motivo da irritação da cliente seria a taxa de cerca de R$ 16 que ela teria de pagar para cancelar um título em seu nome, que estava sendo protestado.

“Ela foi de manhã ao cartório e pagou para retirar uma certidão negativa e aí apareceu que ela estava com o nome sujo. Pela manhã, ela já tinha ficado nervosa, deu um murro na mesa e disse ‘mas essa negona ladra’. Aí à tarde quando ela foi cancelar o título e ficou sabendo da taxa, exaltou-se novamente. Ela disse ‘mas de novo, vou ter que pagar essa nega’”, conta Joanna.

As taxas cobradas pelos serviços no cartório são fixas para todos os estabelecimentos.

Pela tarde, por volta das 14h, quando a cliente ofendeu a proprietária novamente, o filho de Joanna, Almir de Almeida Júnior, que é tabelião substituto no cartório, ouviu as ofensas e tentou conversar com a autora.

“Eu falei pra ela ter respeito, que não havia necessidade de falar daquele jeito, mas ela me respondeu ‘Eu não estou falando com você’. Mas eu sou filho dela e da mesma cor, não tem como ficar quieto”, diz Almir.

As testemunhas dizem que a cliente continuou a falar em voz alta. Almir fechou a porta do estabelecimento e chamou a Polícia, para autuá-la em flagrante, mas como os policiais não chegaram no prazo de 15 minutos, a autora foi embora e as vítimas foram até a DEPAC Centro registrar a ocorrência.

Almir conta ainta que a autora ligou para seu advogado e dizia em voz alta “Estou aqui nos pretos. Esses pretos fecharam o portão. Essa nega ladrona. Eles tem vergonha da cor deles”.

Pessoas que estavam no cartório e presenciaram o incidente também teriam se exaltado com as ofensas da cliente. “Um homem pediu para ela se acalmar e não falar daquele jeito, mas ela chamou ele de preto também”, relata Almir.

Almir de Almeida Júnior, que é tabelião substituto no cartório.
Almir de Almeida Júnior, que é tabelião substituto no cartório.

Respeito–Para a vítima do preconceito racial, Joanna, o caso serve de exemplo para outras pessoas aprenderem a respeitar as diferenças raciais, como também, os negros conhecerem seus direitos, e assim, fazerem cumprir a lei.

“É uma questão de respeito. Ninguém pode querer ser melhor que o outro”, frisa.

Ela também esclarece que sua cor negra não é motivo de vergonha para ela e seu filho, mas o “tom pejorativo” utilizado pela cliente foi ofensivo.

“Eu chamo meu filho de nego lindo, meu negro lindão. Mas ela utilizou a palavra para ofender. Eu tenho nome, estava escrito na placa do balcão: Dra. Joanna D’arc. Meu nome não é nega ladrona. Ela não tem o direito de se referir as pessoas desse jeito”, ressalta.

A tabelião, que é formada em direito, administração e psicologia, diz esperar que o incidente contribua para que a lei do racismo seja conhecida.

“Temos que nos impor, exigir nossos direitos. As pessoas que são leigas tem que conhecer a lei e saber que independente do resultado do processo é importante procurar a polícia e registrar a ocorrência”, diz.

Em 2007, ela foi vítima de outra ofensa semelhante, também em seu cartório. O autor foi um policial militar, que depois reconheceu seu erro e pediu perdão.

“Eu o perdoei. Ele podia perder o emprego se fosse condenado. Não queria isso, só respeito. Esse policial não vai mais fazer isso com ninguém, pelo menos vai pensar bem antes de falar qualquer ofensa desse tipo”, esclarece.

Punição – A ocorrência foi registrada pela polícia civil como “injúria qualificada”. De acordo com o delegado da Depac, João Eduardo Davanço, o fato ocorrido com Joanna caracteriza-se como “injuria qualificada” pelo fato de ter sido uma ofensa verbal contra a cor da pessoa.

A injúria qualificada corresponde a ofensas contra a cor, raça, etnia, ou religião de uma pessoa. “O caso do jogador Grafite que foi chamado de macaco por outro jogador é um exemplo de injuria qualificada”, exemplifica o delegado.

A pena para o crime, caso o autor seja condenado, por ser de um a três anos de detenção.

Já o crime qualificado como racismo, com pena de um a cinco anos, é quando o individuo é privado de algum serviço por conta de sua cor, raça, religião ou etnia.

“Seria o caso de uma pessoa que é impedida de entrar em um clube porque é de determinada religião ou cor, por exemplo. É quando a pessoa é segregada da comunidade”, explica.

Nos siga no Google Notícias