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Cidades

Com 19 mil atendimentos/mês, Defensoria reclama de defasagem e estrutura em MS

Fabiano Arruda | 09/08/2011 18:16

Órgão atende mais de 114 mil pessoas no semestre e se queixa da falta de defensores e de estrutura mínima de trabalho

Defensor Público-Geral do Estado diz que repasse do duodécimo permite ao órgão apenas sobreviver e trava crescimento. (Foto: João Garrigó)
Defensor Público-Geral do Estado diz que repasse do duodécimo permite ao órgão apenas sobreviver e trava crescimento. (Foto: João Garrigó)

Defasagem de 91 defensores em atividade, pelo menos 150 servidores administrativos, equipamentos de informática desatualizados, falta de estrutura nos prédios. São algumas das deficiências apontadas pela Defensoria Pública Estadual.

O órgão, responsável por fazer a defesa da população que tem média de até três salários mínimos, garante que as falhas afetam diretamente na eficiência do trabalho desempenhado em Mato Grosso do Sul.

Só de janeiro a junho deste ano, a Defensoria atendeu 114 mil pessoas, o que representa média de 19 mil por mês. Do total são 77.713 casos na área cível, que corresponde a mais de 68% dos casos, e 36.302 na criminal (31,8%).

No ano passado todo, foram 229.455 pessoas atendidas e, deste número, 142.043 corresponderam à área cível e 69.205 na área criminal.

Da maioria esmagadora dos atendimentos, os casos da família dominam. O Campo Grande News permaneceu por 20 minutos no núcleo da defensoria localizado na Rua Barão do Rio Branco em Campo Grande e entrevistou cinco pessoas. Todas estavam ali para resolver conflitos familiares. Três delas buscavam o divórcio.

Weliton William Assis, de 28 anos, no entanto, recorreu ao órgão para conseguir leite para os seus trigêmeos. O produto custa em torno de R$ 40, cada lata, e ele diz que precisa de cinco por mês, no entanto, afirma não ter condição de comprar com o salário mínimo que recebe pelo trabalho como porteiro.

O caso de Weliton pode ser visto como um dos sinais da falta de estrutura da Defensoria Pública. Ele conta que está há um mês tentando conseguir auxílio para adquirir o mantimento, contudo, critica a burocracia.

“As pessoas que nos atendem muitas vezes são má educadas. Por ser um órgão público, tinham que ser mais ágeis”, comenta.

Já Alcenira de Souza, 62 anos, tenta conseguir a guarda do neto, que tem quatro. É a primeira vez que ela recorre ao órgão para pedir ajuda. Conta que, depois que seu filho e a nora se separaram, a mãe da criança não teria condições mais de criá-lo.

“Depois que a mãe do meu neto passou a morar sozinha, descobri que parte da família dela tinha problemas com a Justiça, inclusive, o companheiro dela, por exemplo, foi preso. Não creio que este seja um ambiente para meu neto crescer”, relata.

Deficiência - São 253 cargos de defensor público estaduais, entretanto, 162 estão em atividade. Segundo o defensor Público-Geral do Estado, Paulo André Defante, a situação mais crítica ocorre no interior do Estado.

Conforme o órgão, as comarcas nos municípios de Eldorado, Itaquiraí, Pedro Gomes, Anastácio, Anaurilândia, Sete Quedas e Nioaque simplesmente não possuem defensores. Outras treze comarcas têm a figura do defensor se dividindo em duas cidades.

Órgão afirma precisar de novas instalações em Campo Grande. (Foto: Arquivo)
Órgão afirma precisar de novas instalações em Campo Grande. (Foto: Arquivo)

Defante afirma que os 1,5% da receita corrente líquida repassado pelo Governo do Estado por meio do duodécimo permite apenas que órgão se mantenha, em condições inadequadas, e não há como projetar melhora no atendimento.

“O defensor atua em alguns municípios sem qualquer secretária ou estagiário. Ele atende telefone, tira xerox, coisas que parecem sem importância, mas fazem toda a diferença no trabalho. Estamos falando de estrutura mínima que faz toda a diferença”, explica, narrando que, quando assumiu o cargo, em junho deste ano, encontrou defensores trabalhando no corredor na sede administrativa, localizada no Parque dos Poderes.

Até a situação dos computadores da Defensoria é motivo de reclamação. Conforme Delfante, o órgão não acompanhou o avanço tecnológico das varas virtuais, processo implementado pelo TJ/MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul).

“Nossa internet é inadequada para acessar processos digitais que têm até 500 páginas. É outro problema básico que faz toda a diferença”, argumenta.

O defensor Público-Geral do Estado diz também que, dentro dos próximos três anos, o órgão terá a aposentadoria de pelo menos 25 defensores.

Como saída, aponta que a Defensoria promoverá concurso ainda neste semestre em “caráter de urgência” para defensores. Para ele, o ideal é que o órgão atuasse com 220 defensores, uma para cada comarca, para atender de forma mínima a demanda, isso sem conta com a defasagem de pelo menos 150 servidores administrativos.

Além disso, Delfante afirma ser necessária outra sede para comportar os servidores. E os prédios utilizados atualmente ainda precisam de reformas, como rampas para acessibilidade e salas com isolamento acústico. Tudo isso só é possível com aumento do repasse do duodécimo. Na opinião do defensor, trata-se de uma questão política.

“Cada governo atua com suas prioridades. O investimento que temos viabiliza nossa sobrevivência, não o crescimento. Temos dialogado (com o governo) porque é o caminho”, pontua.

“Queremos convencer o governo pelo trabalho da defensoria, que dá cidadania e produtividade aos assistidos, que deixam de serem problemas criminais”, complementa Delfante, apontando, como projetos do órgão, atuar in loco em assentamentos e pequenos municípios do interior. “Para garantir que nosso assistido tenha direito à cidadania”, encerra.

Aposentado recorre à Defensoria para conseguir medicamento caro; casos cíveis correspondem a 68% da demanda do órgão.
Aposentado recorre à Defensoria para conseguir medicamento caro; casos cíveis correspondem a 68% da demanda do órgão.

Saúde - Outra demanda absorvida pela Defensoria Pública Estadual está relacionada à área de saúde, em que, somente em Campo Grande, cerca de 300 pessoas em média recorrem todos os meses à instituição.

As ações judiciais tentam, em sua maioria, garantir remédios de alto custo, essenciais para a vida de pacientes, além de cirurgias, em especial as ortopédicas.

“Preciso usar todos os dias o remédio, se não uso tenho dores, sangramentos e até hemorragias”, relata José Gouveia Laranja, de 65 anos. O aposentado necessita tomar seis comprimidos do medicamento Pentasa Mesalazine 500mg por dia. O custo total do tratamento chega a R$ 600 por mês, o que representa 30% da renda familiar do paciente.

O problema não é um caso isolado. Por dia, ao menos dez pessoas em Campo Grande procuram a Defensoria Pública tentando ajuizar ações contra o Estado para garantir tratamentos de saúde. Como a defensoria só atende pessoas carentes, este número pode ser ainda maior.

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