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Retrospectiva 2015

Conflito, morte de indígena e CPIs rivais marcaram disputa por terra

Caroline Maldonado | 28/12/2015 08:08
Índios acamparam em fazendas de Antônio João, em agosto (Foto: Marcos Ermínio)
Índios acamparam em fazendas de Antônio João, em agosto (Foto: Marcos Ermínio)
Força Nacional e exército estiveram em Ñanderu Marangatu após assassinato de indígena (Foto: Marcos Ermínio)
Força Nacional e exército estiveram em Ñanderu Marangatu após assassinato de indígena (Foto: Marcos Ermínio)

O ano de 2015 não foi muito diferente para comunidades indígenas de Mato Grosso do Sul, quando se fala em disputa de terra. Sem respota do Governo Federal, eles ocuparam fazendas, vieram novas liminares para despejo, tiroteios, Exército, Força Nacional e mais uma morte, a do Kaiowá Semeão Fernandes Vilhalva, 24 anos, baleado em agosto. O ano teve ainda os “tradicionais” comentários preconceituosos no Facebook e a resposta de jovens indígenas, que estão nas universidades pela realização pessoal e para ajudar suas comunidades. 2015 termina com proposta do governador Reinaldo Azambuja (PSDB) para solucionar o conflito e promessas da presidente Dilma Rousseff (PT). 

Cansadas de esperar pela demarcação, famílias Guarani Kaiowá ocuparam seis fazendas no dia 22 de agosto e foram expulsas de duas delas pelos fazendeiros sete dias depois, em confronto que gerou a morte do jovem. Em um dos episódios do conflito territorial, o deputado federal Luiz Henrique Mandetta (DEM), foi até a Fazenda Piquiri, vizinha a que foi cenário do assassinato de Semeão, na área que os Guarani Kaiowá chamam de Ñanderu Marangatu.

Ele deu entrevista ao Campo Grande News, falando que se sentiu ameaçado por arcos e flechas. Movimentos sociais, por sua vez, notificaram o Congresso Nacional, questionando a ida de parlamentares às fazendas como forma de intimidar os índios. A reportagem esteve no local durante três dias e mostrou como as famílias se organizaram para se manifestar evitando destruir o patrimônio dos fazendeiros. Um móvel com pratos decorativos e uma cristaleira no primeiro cômodo da entrada da casa cheia de xícaras e utensílios de porcelana intactos chamou a atenção dos repórteres.

O Kaiowá Semeão Fernandes Vilhalva, 24 anos, foi assassinado durante confronto com fazendeiros (Foto: Marcos Ermínio)
O Kaiowá Semeão Fernandes Vilhalva, 24 anos, foi assassinado durante confronto com fazendeiros (Foto: Marcos Ermínio)
Em setembro, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, bateu boca com uma produtora rural durante encontro na Governadoria (Foto: Marcos Ermínio)
Em setembro, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, bateu boca com uma produtora rural durante encontro na Governadoria (Foto: Marcos Ermínio)

Em seguida, os deputados estaduais criaram duas CPIs (Comissão Parlamentar de Inquérito). A CPI do CIMI (Conselho Indigenista Missionário) e a CPI do Genocídio ampliaram o debate, mas também não apontam solução para o conflito. Os trabalhos tiveram um fato inédito: antropólogo depondo contra índio. Os trabalhos foram marcados por brigas e até um indigenista que reclamou de agressão por parte de segurança da Casa, além de manifestações dos próprios índios.

A comissão que investiga o Cimi (Conselho Indigenista Missionário) completou 100 dias e irá pedir prorrogação de mais 60, após retorno em fevereiro de 2016. O gasto mensal para os trabalhos é de R$ 25 mil. Enquanto isso, a CPI do Genocídio requisitou uma série de documentos de entidades. O presidente da comissão, deputado João Grandão (PT), disse que ainda não houve contratações externas e não revelou os gastos com os trabalhos.

Governador fez reuniões com lideranças e pediu a presidente Dilma para usar montante de dívida com União para comprar terras (Foto: Gerson Walber)
Governador fez reuniões com lideranças e pediu a presidente Dilma para usar montante de dívida com União para comprar terras (Foto: Gerson Walber)

Em setembro, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, bateu boca com uma produtora rural durante encontro na Governadoria, em Campo Grande. Ele mostrou firmeza ao retrucar a ruralista, mas desapontou quem achava que teria alguma solução para o clima de tensão entre índios e fazendeiros. O comentário geral foi de que o ministro só deixou promessas para os índios.

A demarcação é de responsabilidade do Governo Federal. No entanto, o governador do Estado, Reinaldo Azambuja (PSDB), que é fazendeiro, resolveu se envolver. Após assumir a administração, ele criou a Subsecretaria de Políticas Públicas para População Indígena, com isso fortaleceu laços com lideranças e sugeriu à presidente Dilma Rousseff (PT) usar parte dos recursos destinados ao pagamento da dívida com a União para a aquisição de terras indígenas. A atitute gera esperança para alguns, mas é vista com desconfiança por outros.

Dilma esteve na abertura dos Jogos Mundiais dos Povos Indígenas, em outubro, em Palmas (TO), mas, apesar dos protestos, não tocou no assunto da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 215, que transfere do Governo para o Congresso Nacional o poder sobre a demarcação de terras indígenas.

No dia 15 de dezembro, a presidente mudou de estratégia e foi enfática ao se posicionar contra a PEC durante a 1ª Conferência Nacional de Política Indigenista, em Brasília. Além disso, fez uma série de promessas, como a criação do Conselho Nacional de Política Indigenista, homologação de novas áreas e efetiva posse aos índios, além da criação da Rede Brasileira de Educação Superior Intercultural Indígena.

Repercussão - Nas reportagens e nos comentários do Facebook, surgiram mensagens de apoio aos índios e ruralistas, mas os que mais chamaram atenção foram a da postagem do galã Cauã Reymond, que esteve na aldeia Pirakua, em Bela Vista, para gravar o filme “A Curva do Rio Sujo”, em junho. Teve gente que protestou o fato de a índia fotografada pelo ator usar aparelho nos dentes e claro teve gente que achou os comentários absurdos e retrucou.

Uma fã se atrapalhou ao entrar na conversa e entrou para o “grupo dos ignorantes”. “Nossa qual a diferença de uma índia para um branco ou negro de aparelho? Eu heim, que mundinho vocês vivem pessoas? Parece até que são vocês que vivem em aldeias”, comentou a seguidora.

Universitários indígenas buscam curso superior para ajudar comunidades (Foto: Alcides Neto)
Universitários indígenas buscam curso superior para ajudar comunidades (Foto: Alcides Neto)
Foto de índia Kaiowá, publicada por Cauã Reymond, levantou comentários (Foto: Reprodução/Facebook)
Foto de índia Kaiowá, publicada por Cauã Reymond, levantou comentários (Foto: Reprodução/Facebook)

No dia 19 de abril, o Campo Grande News publicou matéria sobre a presença indígena nas universidades de MS e entrou no assunto da relação entre o que é tradicional e o que é moderno na vida dos índios sul-mato-grossenses das etnias Terena, Guarani-Ñandeva, Guarani Kaiowá, Kadiwéu, Kinikinau, Guató e Ofaié.

A reportagem mostrou o cotidiano de alguns dos mais de 800 índios que fazem cursos superiores no Estado, como enfrentam as dificuldades comum a todos e os olhares desconfiados de quem acha que índio não quer estudar e nem "evoluir" e quando entra na faculdade vai deixar de ser indígena e assimilar-se, como se a cultura fosse uma bagagem que pode ser deixada em um canto a qualquer momento.

Neste mês, um indígena da aldeia Jaguapiru chamou a atenção do Lado B e a matéria entrou para o grupo das que ajudam a população não-indígena a entender que índio é gente, que naturalmente importa tecnologias de outros povos, assim como o “branco”, que dorme na rede e come mandioca.

Mister Indígena 2014 e medalha de prata nos Jogos Mundiais Indígenas 2015, filho de pai terena e mãe Guarani Kaiowá, Rocleiton Ribeiro Flores, 21 anos, impressionou pelo condicionamento físico, ornado com as pinturas tradicionais. O estudante de enfermagem contou que se orgulha de ter motivado adolescentes a se pintarem como expressão da cultura, na aldeia que tem índios Guarani e Terena, em Dourados.

Rocleiton foi flagrado pela reportagem durante o 1° Festival da Cultura Guaicuru-Ejiwajegi Kadiwéu, aldeia Alves Barros, em Bodoquena. Em dezembro, o evento selou a paz ao reunir diversas famílias e etnias em uma comunidade, que havia começado o ano em luto pela morte de dois moradores por briga política.

Competição de montaria durante 1° Festival da Cultura Guaicuru-Ejiwajegi Kadiwéu, aldeia Alves Barros, em Bodoquena (Foto: Sidney Albuquerque)
Competição de montaria durante 1° Festival da Cultura Guaicuru-Ejiwajegi Kadiwéu, aldeia Alves Barros, em Bodoquena (Foto: Sidney Albuquerque)

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  • Foto: Marcos Ermínio
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