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Cidades

OAB compara situação de presídios de MS a "senzalas na era digital"

Francisco Júnior | 29/08/2014 13:30
Reunião do conselho da OAB em que relatório foi apresentado. (Foto: Marcos Ermínio)
Reunião do conselho da OAB em que relatório foi apresentado. (Foto: Marcos Ermínio)

“Trata-se uma senzala na era digital”. Assim definiu a situação atual dos presídios de Mato Grosso do Sul o presidente da Comissão Provisória do Sistema Carcerário da OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil), Carlos Magno Couto. Na manhã de hoje (29), durante reunião do Conselho da OAB, o advogado apresentou um relatório sobre levantamento das condições de 12 presídios do Estado, além de dados do sistema carcerário.

Foram vistoriados o Estabelecimento Penal Jair Ferreira de Carvalho, Instituto Penal, Presídio de Trânsito, Estabelecimento Penal Feminino Irmã Irma Zorzi, Estabelecimento Penal Feminino de Regime Semiaberto, em Campo Grande; Penitenciária de Segurança Máxima de Três Lagoas; Estabelecimento Penal de Coxim; Estabelecimento Penal de Corumbá; Estabelecimento Penal de Dois Irmãos do Buriti; Penitenciária Harry Amorim Costa, de Dourados; Estabelecimento Penal Ricardo Brandão de Ponta Porã; e Penitenciária de Segurança Máxima de Naviraí.

Conforme o relatório, dados de janeiro deste ano apontam que a população carcerária de Mato Grosso do Sul é estimada em 12.431 presos, dentre os quais 11.264 são homens (90,61%) e 1.167 são mulheres (9,39%). O levantamento coloca o Estado como a terceiro em maior número de presos.

Um dos presídios visitados pela comissão. (Foto:Wandir Filiú)
Um dos presídios visitados pela comissão. (Foto:Wandir Filiú)

Enquanto a média nacional é de 250 detentos para 100 mil habitantes, em Mato Grosso do Sul a proporção é de 600 para cada 100 mil pessoas.

De acordo com as informações prestadas pela Agepen/MS (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário), o deficit de vagas nos presídios chega 6.531. Apenas não existe superlotação no regime aberto de Campo Grande, porém no regime fechado faltam 2.760 vagas e 280 vagas no semiaberto. No interior, o déficit é de 2.935 vagas do regime fechado e 235 vagas semiaberto e aberto juntos.

Conforme a Agepen, nos presídios femininos não há superlotação nos regimes semiaberto e aberto da Capital e do interior, mas no regime fechado há ausência de 135 vagas em Campo Grande e 186 nas demais cidades do Estado.

No total, o estado conta com com 25 unidades penais para o cumprimento de pena em regime fechado e 20 unidades penais, sendo 29 em Campo Grande e o restante localizado em outros 16 municípios.

Em relação aos homens, cumprem prisão em regime fechado 3.936 na Capital, e 5.172 no interior ; em regime semiaberto, 720 presos em Campo Grande e 755 presos no interior; no regime aberto, 297 presos na Capital e 384 presos no interior.

As mulheres estão divididas no regime fechado com 366 presas na Capital e 570 no interior; no regime semiaberto, 74 presas na capital e 95 no interior; e no regime aberto, 34 presas na capital e 28 presas
no interior. Do número total de presos, considerando homens e mulheres, 9.065 cumprem prisão definitiva (72,92%) e 3.366 prisão provisória (27,08%), presos que ainda não foram julgados, preservando o status de investigados ou acusados.

Entre os presos, 165 (1,31%) são indígenas, sendo que 62 cumprem prisão provisória e 103 prisão definitiva. Os presídios do Estado ainda comportam 204 presos estrangeiros (1,64%).

Ainda segundo o relatório, 41,92% do homens foram presos crimes previstos na Lei de Drogas, 24,66% por crimes crimes contra o patrimônio, 14,97% crimes contra as pessoas, 7,98% por crimes contra dignidade sexual e 10,47% por outro crimes que não foram especificados na pesquisa.

Já na população carcerária feminina a maioria, 79,45% cometeram crimes previstos na Lei de Drogas, 11,24% por crimes contra o patrimônio, 3,84% por crimes contra a pessoa, 3,52% por outros crimes e 1,95% por crimes contra dignidade sexual.

O relatório apontou que desde 2008 não são registradas rebeliões nos presídios do Estado. De 2009 a 2013 foram registradas 30 fugas, 49 mortes, 97 ocorrências de lesão corporal, e nove suicídios.

O levantamento traz também informações referentes ao servidores que trabalham no sistema penitenciário. O contingente é de 1.273 técnicos, número segundo a comissão, insuficiente para atender o número presos. O déficit de servidores é de 1.441 profissionais. Número considerado satisfatório de agentes seria de 2.714.

Comissão vistoriou 12 presídios dos Estado em sete meses. (Foto: :Wandir Filiú))
Comissão vistoriou 12 presídios dos Estado em sete meses. (Foto: :Wandir Filiú))

Fiscalização - A formação da comissão para a fiscalização dos presídios foi uma determinação da OAB Nacional, após as situações deflagradas nos presídios do Maranhão, em janeiro de 2014, onde só no ano anterior 60 detentos foram assassinados. Os trabalhos no Estado foram iniciados em janeiro deste ano e concluídos no mês de julho.

Conforme Couto, a comissão constatou superlotação na maioria dos presídios e desrespeitos as leis internacionais que tangem o sistema prisional. Segundo ele, a intenção era verificar in loco as condições em que os presos são submetidos. “ O que podemos ver é que as instalações não obedecem as normas da ONU [Organização das Nações Unidas] estabelecidas em 1955”, comentou.

O presidente da comissão informou que os trabalhos da OAB não serão limitados ao relatório, será montado um núcleo permanente de fiscalização e pesquisa do sistema carcerário estadual. “ A OAB cumpriu seu papel político-social de denunciar a sociedade essa situação. O relatório não traz soluções para o problema, mas garante a discussão para o assunto”, comentou.

No período em que vistoriou os presídios, o Couto disse que ficou chocado com uma cena encontrada no Estabelecimento Penal de Corumbá. “ Passamos em frente de uma cela de isolamento e pedimos para que ela fosse aberta. O preso que lá estava ao sair para fora não conseguia abrir os olhos por conta da claridade. Ele estava lá porque foi pego com um celular”, relatou o advogado condenando esse tipo de ação.

Couto criticou o fato do governo do Estado ter desistido de construir e ampliar presídios no Estado, já que segundo ele, verba para isso já havia sido liberadas desde 2011. Conforme consta no relatório, foram cancelados sete contratos, que representam o repasse total de R$ 15.200.411,33.

Presidente da comissão durante vistoria em presídio. Nas visitas, Couto conversou com detentos. (Foto: :Wandir Filiú))
Presidente da comissão durante vistoria em presídio. Nas visitas, Couto conversou com detentos. (Foto: :Wandir Filiú))

Agepen – O diretor-presidente da Agepen, coronel Deusdete Oliveira, também participou da reunião do Conselho. Ele enalteceu o trabalho desempenhado pela ordem dos advogados e apresentou investimentos do governo Estadual no sistema carcerário.

Deusdete apresentou ainda alguns dados complementares a pesquisa feita pela comissão. Segundo ele, um preso custo em média R$ 1,4 mil para o Estado, valor que sobe se considerado outros aspectos.

Conforme o coronel, no prazo de 18 meses serão entregues mais três presídios, que estão sendo construídos n complexo prisional da Gameleira. Serão mais 1606 novas vagas para homens e 407 para mulheres. Segundo ele, o custo das três obras chegam a R$ 52 milhões, sendo R$ 40 milhões de recursos federais e R$ 12 milhões de contrapartida do Estado.

Deusdete informou ainda que até dezembro deste ano serão ampliadas vagas nos presídios de Ponta Porã (194), Jardim (100), Rio Brilhante (100), Amambai (100), Corumbá (115) e em Dourados (450 no presidio semiaberto).

Com relação a desistência dos projetos para a construção de novos presídios citadas pelo presidente da Comissão, o chefe da Agepen explicou que o governo do Estado abriu mão dos recursos após uma mudança de uma resolução do CNPCP (Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciaria), que impôs ao Estado arcar com as modificações previstas no projeto das construção dos presídios. “ Como ocorreu essa mudança de resolução, o Estado teria que incluir inúmeras modificações no projeto, como sala de amamentação, barbearia, custos que não são cobertos pela Depen [Departamento Penitenciário Nacional]”, explicou.

Com relação a superlotação, Deusdete explicou que um dos maiores problemas é o fato do Estado custodiar presos que em tese são de responsabilidade Federal. “ Hoje nós temos nos presídios cerca de 5 mil detentos que não são nossas responsabilidade”, argumentou.

Segundo ele, hoje se o presídio de Dois Irmãos do Buriti, que era para abrigar presos federais, estivesse sendo usado corretamente, já atenuava a situação da superlotação. “ Nós ingressamos com ações para que essa situação seja resolvida”.

Deusdete destacou as ações desenvolvidas nos presídios com o objetivo de ressocializar o detendo. Segundo, ele no regime semiaberto e aberto 95% dos presos estão trabalhando e no fechado o índice é de 30%. “ Os presídios hoje são a menina dos olhos dos empresários, já que o custo de produção é baixíssimo”, comentou.

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