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Cidades

OAB-MS repudia decisão de juíza que 'criminaliza advocacia' em caso no MT

Juíza de Mato Grosso justificou pedido prisão de ex-presidente da OAB-MT argumentando que por ser advogado pode atrapalhar investigações

Richelieu de Carlo | 20/02/2017 09:29
Mansour Elias Karmouche, presidente OAB-MS. (Foto: Fernando Antunes/Arquivo)
Mansour Elias Karmouche, presidente OAB-MS. (Foto: Fernando Antunes/Arquivo)

A OAB-MS (Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Mato Grosso do Sul) assinou nota em que repudia ação de uma juíza do Estado de Mato Grosso que, ao decretar a prisão de um ex-presidente da OAB-MT, utilizou o fato de este ser advogado criminalista e poder se utilizar disso para atrapalhar investigações, como uma das justificativas para a detenção.

Segundo o presidente da OAB-MS, Mansour Elias Karmouche, a decisão da juíza da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, Selma Rosane Santos Arruda, é “inconcebível” e configura uma “criminalização da advocacia”.

“Ela utilizou vários argumentos com base no exercício da advocacia. Pelo ex-presidente da OAB de Mato Grosso ser advogado criminalista e, por isso, ter conhecimento de fatos e poder atrapalhar a instrução criminal. Isso é inconcebível”, diz Karmouche. “Ela trata a advocacia como crime. Isso não é argumento”.

A juíza Selma Rosane Arruda, da Vara de Combate ao Crime Organizado de Cuiabá, decretou a prisão do ex-presidente da OAB/MT e ex-secretário de Administração, Francisco Anis Faiad, em operação que investiga esquema de fraudes à licitação, desvio de dinheiro público e pagamento de propinas no Estado.

Faiad é acusado de envolvimento em fraudes à licitação, corrupção, peculato e organização criminosa. Na decisão em que decreta a prisão preventiva contra o ex-presidente da OAB-MT, Selma Rosane Arruda utiliza das prerrogativas da advocacia como argumentos para decretação de prisão preventiva.

“Especificamente no caso presente, poderá dificultar as investigações, utilizando-se de suas prerrogativas de advogado, inclusive para obter acesso em autos sigilosos, dados estes que um investigado qualquer jamais obteria”, argumentou a juíza ao decretar a prisão preventiva.

Para Mansour Elias Karmouche, essa é uma “interpretação equivocada” do exercício da profissão e teme que isso possa se tornar recorrente. “Nós não podemos deixar que a atividade do advogado seja tratada como crime. Esse argumento de ter acesso a documentos sigilosos e poder dificultar as investigações não pode ser usado”, finaliza.

VEJA NOTA NA ÍNTEGRA

Zelar pela Constituição Federal não é apenas tarefa, mas dever juramentado por todos aqueles que escolheram a defesa da Justiça como profissão.

Em seu artigo 133, a Carta Magna é taxativa ao assinalar que “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.

Esses limites servem a toda sociedade, inclusive àquela parte que exerce o papel de julgador, não podendo tratar o que nela está disposto como mero detalhe ou instrumento de espetáculo.

Assim, é motivo de veemente repúdio a decisão da juíza da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, Selma Rosane Santos Arruda, que utiliza das prerrogativas da advocacia – previstas em lei – como argumentos para decretação de prisão preventiva.

Ao decretar prisão preventiva sob o argumento de que “advogados criminalistas têm conhecimento de fatos que poderão ser manipulados para atrapalhar a instrução criminal”, a magistrada demonstra contrariedade à ordem jurídica sob a qual se ergueu a própria Constituição Federal.

A argumentação, inclusive, fere o princípio constitucional da presunção da inocência, a partir do momento que a livre dedução de que o acesso do profissional da advocacia poderá – até mesmo de maneira hipotética como se depreende do tempo verbal escolhido pela referida juíza – atrapalhar a instrução criminal.

A própria julgadora afasta, em seu argumento, que ocorra interferência à instrução criminal – isto sim motivo para decretação da prisão preventiva – no momento em que trata a situação como hipótese.

“Além disso, especificamente no caso presente, poderá dificultar as investigações, utilizando-se de suas prerrogativas de advogado, inclusive para obter acesso em autos sigilosos, dados estes que um investigado qualquer jamais obteria”, argumentou a juíza ao decretar a prisão preventiva.

Não obstante a falta de razoabilidade da fundamentação, não condizente com a postura de um julgador, é inadmissível que se confunda advogado e cliente. É preciso repelir essa agressão à advocacia sob pena de que o cidadão tenha seus direitos usurpados sempre que um julgador avaliar que o advogado ou advogada por ele constituído não é apto a ter acesso aos autos.

Calar ou ceifar a advocacia, ou até mesmo tentar intimidá-la em sua atuação profissional com ordens de prisão como estas remonta aos tempos ditatoriais de um passado que já teve a sua página virada no Brasil graças à atuação dos advogados e advogadas brasileiros.

A Ordem não compactua, nem nunca compactuará, com o uso da condição de advogado para fins estranhos ao efetivo exercício da defesa.

Para a Ordem importa sim a conduta do profissional da advocacia dentro dos limites da lei. Tanto que faz parte de sua estrutura um Tribunal de Ética e Disciplina para apurar e punir, quando for o caso, aquelas condutas que não condizem com o que foi estabelecido pelo legislador.

A mesma conduta, dentro dos limites legais, é esperada do julgador para a boa administração da Justiça ao seu jurisdicionado.

Atentar contra as prerrogativas profissionais da advocacia é atentar contra o direito do cidadão de se defender.

E é pela premissa assumida pela OAB ao longo de sua história, na defesa da sociedade e das garantias fundamentais, que não se furtará a adotar as medidas necessárias para assegurar o respeito à advocacia.

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