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Treminhões, buracos e riscos: perigo e paciência marcam a BR-262

A presença maciça dos caminhões se soma aos perigos de uma via praticamente sem acostamento e com turbulência garantida pelos buracos

Aline dos Santos, enviada especial a Três Lagoas | 22/08/2015 11:47
Rodovia é dominada por treminhões, que têm até 30 metros de extensão. (Foto: Vanessa Tamires)
Rodovia é dominada por treminhões, que têm até 30 metros de extensão. (Foto: Vanessa Tamires)

Os 338 quilômetros da BR-262 entre Campo Grande e Três Lagoas podem ser definidos em uma palavra: treminhão. Por trás dessas nove letras está um veículo articulado, com quase 30 metros de extensão e 44 toneladas. A presença maciça dos caminhões se soma aos perigos de uma via praticamente sem acostamento e com turbulência garantida pelos buracos.

Enquanto os “brutos” tomam a estrada, levando a matéria-prima que alimenta um dos mais rentáveis setor econômico de Mato Grosso do Sul, resta aos demais condutores muita paciência. A celulose é o segundo produto mais exportado do Estado e nos primeiros setes meses do ano movimentou US$ 583,7 milhões, que representa 20% do total vendido ao exterior por MS.

Numa manhã de quinta-feira, dia 20, a reportagem se deparou com 106 caminhões destinados ao transporte de eucaliptos. Mas há quem já teve viagem mais morosa. O empresário Valmir Guarinão contou exatos 170 treminhões em 300 km entre Três Lagoas e a Capital.

“As autoridades têm de nos proteger, corremos riscos absurdos de segurança...Já que foi investido bilhões, concedidos incentivos de outros bilhões, porque não previram a construção de uma estrada melhor e adequada?”, questiona Valmir em postagem no Facebook.

"Como o carro é bem mais pequeno tem que ter paciência e esperar", diz Silvana sobre treminhões.  (Foto: Vanessa Tamires)
"Como o carro é bem mais pequeno tem que ter paciência e esperar", diz Silvana sobre treminhões. (Foto: Vanessa Tamires)
Marco reclama que rodovia esburacada prolonga viagem. (Foto: Vanessa Tamires)
Marco reclama que rodovia esburacada prolonga viagem. (Foto: Vanessa Tamires)
“Na verdade, são os caminhões que movimentam a cidade”, afirma Marciléia sobre a economia de Rio Pardo. (Foto: Vanessa Tamires)
“Na verdade, são os caminhões que movimentam a cidade”, afirma Marciléia sobre a economia de Rio Pardo. (Foto: Vanessa Tamires)

Os veículos seguem carregados em direção a Três Lagoas, a Capital da Celulose, e voltam vazios no caminho oposto. Em geral, as manhãs são marcadas por mais treminhões sem carga, à tarde, aumenta o número de veículos carregados. No trecho entre Água Clara e Três Lagoas, os treminhões têm direito a circular dia e noite pela BR-262.

“É difícil, atrapalha o trânsito. Tem muito caminhão. Tinha que duplicar. As vezes junta mais de meia dúzia”, conta o professor Roberto Luiz Silva, 54 anos, que seguia de Campo Grande a Três Lagoas. Vindo de Dracena, no interior de São Paulo, a produtora Silvana Bazo, 51 anos, já é mais habituada aos grandes veículos, muito utilizado no Estado vizinho para transporte de cana, mas se espanta com a quantidade de buracos. “Têm pedaços de asfalto bem ruim. Como o carro é bem mais pequeno tem que ter paciência e esperar”, afirma, sobre compartilhar a pista com veículos longos.

Estreando no transporte do eucalipto, mas com experiência em dirigir treminhão para o transporte de cana no interior paulista, o caminhoneiro Marcos Veiga, 37 anos, diz que a estratégia para reduzir a tensão com o motorista de carro pequeno é sinalizar quando a ultrapassagem é segura. Segundo ele, a pista defeituosa faz com que a velocidade seja reduzida de 80km/h para 65 km/h, o que torna a viagem mais demorada.

O frentista Thiago Evangelista da Silva, 19 anos, conta que todo o dia pega a rodovia até Ribas do Rio Pardo e reclama. É mais perigoso por causa dos caminhões. Além do tráfego muito intenso. Às veze cai eucalipto na BR”, afirma.

Em Ribas do Rio Pardo, a 103 km da Capital e primeira cidade para quem segue no sentido a Três Lagoas, os treminhões estão por todos os lados no perímetro urbano às margens da rodovia. O cenário é representativo da força econômica do eucalipto na região, que se expande na vegetação que era Cerrado.

“Na verdade, são os caminhões que movimentam a cidade”, afirma a universitária Marciléia Garcia, 31 anos. O município terá uma indústria e a vinda de empresas do setor, além de plantação de eucalipto, torna a escultura de boi na entrada da cidade obsoleta. “Veio muita gente de fora, muita gente do Nordeste”, conta.

Os veículos também atravessam, junto com a rodovia, áreas urbanas de Água Clara e Três Lagoas. De acordo com a prefeita de Três Lagoas, Márcia Moura (PMDB), os treminhões não entram nas ruas da cidade.

“É BR e não legislamos por ali. Não vou utilizar ali porque o governo federal está deixando de me mandar verba, embora seja segurança. Mas ainda vou colocar mais dinheiro para o governo federal? O que eu faço, coloco no estadual então, que tem sido muto mais parceiro do que o governo federal. Mas isso não deixa de fazer com o que eu vá atrás”, explica a prefeita sobre a decisão de não utilizar valor mitigatório, repassado pelas empresas para redução de impactos, para o trecho da rodovia que corta a cidade.

Segundo ela, a PRF (Polícia Rodoviária Federal) quer repassar o trecho para o município. “A PRF está doida para me passar esse pedaço aqui. Estamos em contato, mas eu sou parceira e acho que temos que sentar e ponderar as situações”, salienta.

Carros dividem espaço com treminhão. (Foto: Vanessa Tamires)
Carros dividem espaço com treminhão. (Foto: Vanessa Tamires)
Placa alerta para perigo na BR-262. (Foto: Vanessa Tamires)
Placa alerta para perigo na BR-262. (Foto: Vanessa Tamires)
Treminhão circula em rodovia sem proteção traseira. (Foto: Vanessa Tamires)
Treminhão circula em rodovia sem proteção traseira. (Foto: Vanessa Tamires)
Supervisor do Dnit em Três Lagoas explica regras para circulação de treminhões. (Foto: Vanessa Tamires)
Supervisor do Dnit em Três Lagoas explica regras para circulação de treminhões. (Foto: Vanessa Tamires)

Riscos, buracos e defeitos - A reportagem viu um caminhão com eucalipto sem a proteção traseira, ou seja, preso somente por corrente. Ainda no trajeto, havia um treminhão tombado a 70 quilômetros de Três Lagoas.

O acidente foi na madrugada do dia 20 de agosto e não houve ferido. A carga se espalhou e no meio da manhã a PRF (Polícia Rodoviária Federal) aguardava que a Eldorado Celulose enviasse máquina para recolher as toras. Atualmente, a Eldorado que vai aumentar a produção, possui 172 caminhões para o transporte de madeira e celulose.

Com mais da metade da rodovia interditada, o policial Edvaldo Santos alerta que os condutores evitem viagem às noite devido ao fluxo intenso e manutenção precária.

O pior trecho em termos de trafegabilidade é entre Água Clara e Três Lagoas. Placas sucessivas ora informam acostamento com defeito em 123 km ou informam, por exemplo, 41 km se acostamento. Outros avisos é de pista com defeito e orientação para que não se exceda 60 km. A via tem desgastes e buracos.

Quando existe, o acostamento também apresenta péssimas condições. O espaço ao lado da pista de rolamento foi planejado para uso, basicamente, em três situações: desviar de risco iminente de acidente, pane ou ocupante do veículo passando mal.

Terra com lei – Apesar das reclamações dos motoristas, o supervisor da unidade do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte) de Três Lagoas, Milton Rocha Marinho, afirma que há um termo de acordo com a Fibria e Eldorado.

“Eles são autorizados especialmente, que são as chamadas AETs, as Autorizações Especiais de Trânsito. Essas AETs são expedidas conforme você tem a via, a classe da rodovia. No caso de Três Lagoas, até porque as duas fábricas são daqui, de algum lugar tem que vir a madeira. O que nós fizemos, regulamentamos junto as empresas um termos com quantidade de veículos por horário”, diz Marinho.

De acordo com ele, são permitidos nove veículos por hora e os treminhões não podem formar comboio. O cálculo dos nove considera que seria um veículo a cada 15 quilômetros, lembrando que o trecho tem 140 km. “Temos que fazer um controle, dentro do meu cálculo, no segmento de 140 km que eles fazem, para manter a distância de um veículo para outro. Não sacrificando o meu usuário. Se bem que não vai ocorrer esses 15 quilômetros religiosamente”, admite.

Em caso do descumprimento das regras, os treminhões perdem a AET. Desta forma, as empresas têm que desviar os veículos para outras rodovias como a MS-112, que já absorve parte do excedente, e interior de São Paulo. O Dnit liberou o tráfego dos treminhões dia e noite. A AET é paga anualmente por veículo. De acordo com o site do Dnit, a AET custa R$ 14,04.

Na viagem, em apenas uma ocasião havia treminhões “colados”. Mas, bastam um treminhão, um caminhão bitrem e um caminhão-baú, por exemplo, para represar uma fila de carros. Denúncias podem ser feitas por meio do aplicativo Dnit Móvel.

Quanto à BR-262, a previsão é de que em outubro comece os reparos por meio de um edital que será lançado. A rodovia também pode ser incluído no programa de concessões, que poderá repassar à iniciativa privada o trecho entre Campo Grande e Três Lagoas.

Treminhão tombou de madrugada a caminho de Três Lagoas. (Foto: Vanessa Tamires)
Treminhão tombou de madrugada a caminho de Três Lagoas. (Foto: Vanessa Tamires)
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