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Em Pauta

80% dos usuários de crack trabalham e têm família

Mário Sérgio Lorenzetto | 19/08/2017 08:30
80% dos usuários de crack trabalham e têm família

Era 1973. Um professor da Universidade de Delaware (EUA), de nome James Inciardi, escreveu: "Hoje deparei com algo novo. Na Avenida Tigertale, em Miami, há uma garagem onde os sujeitos estão experimentando um tipo diferente de "viagem". Estão fumando cocaína (até essa época, cocaína só era inalada). Chamam essa versão de "base". Tenho determinar ao traficante o que é isso". Estava dado o alarme para uma das mais prejudiciais e eficazes drogas inventada pelo humano. Ele mencionava um dos produtos feito do extrato da planta coca (Erythroxylon coca), que logo depois seria batizado por usuários de "crack". O nome da droga é uma referência aos locais onde era comercializada e fumada: as "crack houses" (casas abandonadas) de bairros pobres de Miami, Los Angeles e N.York. Os usuários se reuniam em grupos para fumar a droga, vendida na forma de pedras, em cachimbos improvisados como materiais como latas e copos plásticos. O fogo fazia os cristais da pedra estalar, produzindo um som descrito como "cracking". Era uma droga vendida por traficantes pobres para usuários pobres. Estava sendo construindo o mito da vagabundagem do usuário de crack. E é uma droga com efeitos muito mais devastadores que a tradicional inalada de cocaína. O crack provoca a liberação de grandes quantidades de dopamina no cérebro, o que causa efeitos 10 vezes mais intensos que a cocaína.

Ao contrário do que se acredita, cerca de oito em cada dez usuários de crack são pessoas com família, trabalham, são produtivas e fazem uso recreativo da droga, o que, obviamente, não significa que o risco da dependência, do vício, seja baixo.

Mas ela é uma "pedra da exclusão". E não é apenas por motivação social como alguns querem fazer crer. O fato é que o uso contínuo do crack leva à diminuição progressiva da dopamina no nosso corpo, o que causa ansiedade, irritabilidade e depressão após um brevíssimo período de euforia. O usuário se auto-marginaliza quando não é marginalizado antes, por ser dificílimo com ele conviver.

Esqueçam dessa xaropagem ideológica das Cracolândias que pululam pelo Brasil. O usuário de crack só tem dois caminhos: tratamento ou cemitério. A verdadeira questão é a inexistência de centros de tratamento - para ricos e pobres.

80% dos usuários de crack trabalham e têm família

Como tratar um usuário de crack?

Antes de tudo, o paciente (aquele que, por um milagre, esteja sendo tratado) deve receber medicamentos para tratar problemas como pneumonia, doenças sexualmente transmissíveis e moléstias da pele. Além disso, um dos mais perversos efeitos do crack é a perda da sensação de fome e de sono.

As ações no tratamento, pelo elevadíssimo grau de dependência, costumam ser coercitivas. Daí a condição ideal do paciente ter ido ao um imaginário centro de tratamento por livre e espontânea vontade. Por serem coercitivas, as ações costumam levar o tratamento ao fracasso. Só são indicadas internações forçação quando já há degradação do estado mental do usuário. Tal como no casos de dependência de cocaína, o usuário de crack costuma reagir bem quando está sendo tratado. Todavia, quando retorna ao convívio social não, suporta apressado da necessidade da droga. A prescrição são as abordagens médicas e psicossociais, com participação da família, e de grupos de apoio, além de uso de medicamentos. Ainda que ninguém deseje esclarecer, um dos "medicamentos" utilizados são doses mínimas de maconha, para surpresa de muita gente. Um pequeno é controverso estudo com apenas 50 usuários de crack, conduzido pela Faculdade Medica Weill Cornell, de N. York, apontou que 68% dos usuários de crack conseguiram resistir melhor à abstinência com o uso limitado de maconha.

80% dos usuários de crack trabalham e têm família

Aqueles que escutam vozes.

Virginia Woolf ouvia pássaros cantando em grego. Na cabeça do compositor Robert Schumann uma nota começou a repetir de forma ininterrupta. Logo foi ganhando terreno até que deu lugar a uma composição musical "tão gloriosa e interpretada com instrumentos tão maravilhosos, como ninguém jamais havia ouvido". Para quem não teve esse tipo de experiência, soa a chinês - ou a grego -, mas é possível que, uma vez superado o estranhamento inicial, não sejam tão inacreditáveis.

Nos últimos anos, as pessoas que escutam vozes estão se fazendo ouvir. Desde que surgiu no final dos anos 1980, na Holanda, o "Movimento Escutadores de Vozes" vem ganhando força. Agora estas pessoas, que não necessariamente tem um diagnóstico psiquiátrico, se reúnem em cafés de diferentes capitais do mundo para compartilhar suas experiências e tratar de pautas que os preocupam: o uso de tarja preta, o estigma de loucos, o significado das vozes... a iniciativa é interessante já que os ajuda a compreender e a compartilhar suas experiências que eram vividas na solidão.

Acreditam que o fenômeno das vozes seja algo relativamente recente. Antes, algumas pessoas viam imagens. Joana Darc via o arcanjo Gabriel é Santa Catarina. Schumann via anjos, que posteriormente, se transformaram em demônios que lhe diziam que era um pecador e iria para o inferno. Mas a palavra foi ganhando em complexidade e independência da imagem. Heiddegger era um escutador de vozes. Escritores como Joyce observaram que as vozes se deleitavam com seus jogos de palavras.

Por outro lado, também mudou o diálogo que mantemos conosco. Entre os humanos e os deuses havia intermediários, chamem anjos ou demônios. Estes entes, que mediavam entre o humano é o divino, serviam de orientação ou guia e ajudavam a lidar com o desconhecido. Agora estamos sós, raros pensam ouvir anjos ou demônios. Passamos a debater conosco, sozinhos (em muitas ocasiões somos nossos piores inimigos). Mas a existência dos Escutadores de vozes sempre foi - e continua sendo - algo muito marginal. Iniciativas como o Movimento Escutadores de Vozes não buscam outra coisa que derrubar muralhas. E ao contrário dos Trump, o mundo atual pertence a quem as derrubam.

As parcas notícias indicam que Collor ouve vozes. Mas não tem um movimento que o socialize. Há indicações que Lula ouve vozes, talvez tenha se convencido que ele é a "Voz". Temer não deve ouvir voz alguma, nem interna e menos ainda as do povo. Dilma, certamente, ouvia muitas vozes, todas ao mesmo tempo, em uma imensa algaravia. Bolsonaro, tudo indica, não ouve vozes; escuta somente o estalido de tiros. Marina só ouve os sons, incompreensíveis, da floresta.

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