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Em Pauta

A legalização da maconha no Uruguai pode ser entendida como "realidade parcial"

Mário Sérgio Lorenzetto | 14/07/2015 08:00
A legalização da maconha no Uruguai pode ser entendida como "realidade parcial"

Enquanto o Uruguai esfria a liberação da maconha, o Chile permite a plantação e o uso pessoal.

A legalização da maconha no Uruguai pode ser entendida como uma "realidade parcial". Já se inscreveram 2.000 fazendeiros de maconha para o plantio e os clubes para maconheiros (clubes canábicos é o nome correto) estão em funcionamento. O problema está nas vendas em farmácias. Os proprietários de farmácias e drogarias estão em pé de guerra com a maconha. Argumentam que teriam problemas relativos à segurança de seus estabelecimentos. Os defensores do uso da maconha defendem que atualmente as farmácias vendem drogas muito mais potentes que a maconha e não traz consequências importantes relativas à segurança. A verdade é que o atual presidente da república uruguaia, médico especialista em câncer, é contra a liberação da maconha e vem postergando a liberação aprovada no ano passado. Aliás, Tabaré Vázquez implantou no Uruguai a mais severa lei contra o tabaco em seu primeiro mandato e diz que agora pretende lutar contra o uso do álcool. Mas é comum ver as pessoas transitarem com um cigarro de maconha nas ruas de Montevidéu, talvez até em maior quantidade que aqueles que fumam o tradicional tabaco.

Em Santiago do Chile a realidade não é diferente da encontrada em Montevidéu. As pessoas consomem maconha ao ar livre. Acaba de ser aprovada no Congresso a plantação de até 6 pés de maconha nas residências e o uso "recreativo". O projeto de lei chileno foi aprovado por 68 deputados e 39 o rejeitaram. Essa é aparentemente uma "liberação geral", diferente de todos os demais países onde já tenha ocorrido. Há dois argumentos centrais em favor da liberação da maconha: o primeiro é o reconhecimento da derrota das forças policiais que tentam coibir o plantio, venda e uso. O segundo argumento é o que mais seduz governantes do mundo todo - imposto. É possível obter enormes ganhos para os cofres públicos com a liberação da maconha. O Chile, aparentemente, está liberando o plantio e uso da maconha sem discutir impostos. É difícil acreditar.

A legalização da maconha no Uruguai pode ser entendida como "realidade parcial"
A legalização da maconha no Uruguai pode ser entendida como "realidade parcial"

Os linchamentos: a horrenda justiça popular.

Dois jovens tentam assaltar um bar em um bairro da periferia de São Luís (MA). Chegam 5 pessoas, outros 10 aparecem, em um piscar de olhos mais 80...uma multidão. Talvez 700 pessoas. Conseguem segurar um dos assaltantes. Colocam-no de joelhos. Alguém arruma uma corda. Amarravam o rapaz ajoelhado pelo pescoço e abdômen. Gritos. Impropérios. Mata! Mata! Grita a turba. Uma das pontas da corda é jogada em um poste. Enforcam o jovem. Os brasileiros lincham, em média, uma pessoa por dia - garante o estudioso do assunto José de Souza Martins.

Ele diz que as instituições não funcionam. Em seu livro "Linchamentos: a justiça popular no Brasil", afirma que a justiça é cara, complicada e lenta. "A instituição judiciária no Brasil sempre foi um luxo para quem pode pagar um advogado, para quem conhece as regras". E mais: "Temos duas sociedades: uma que segue as regras do estabelecido e outra que não as segue porque não concorda com elas".

Os enforcamentos eram sentenças comuns no Brasil até 1874. Era um espetáculo público. Também decapitavam e cortavam as mãos. As cabeças e mãos eram colocadas em uma caixa. Em seguida, eram salgadas. Levadas pelos famigerados "capitães do mato" a lugares remotos; era um verdadeiro funeral de horror. A estrutura escravocrata do brasileiro se perpetuou. O linchamento já não diz respeito à cor da pele. Lincham brancos, negros, homens e mulheres. Mas o ritual praticado no Brasil Colônia, um Brasil rural, veio para a periferia das cidades e se perpetuou. É um dos piores signos de nosso atraso. O brasileiro é um povo pacífico e ordeiro? Será?

A legalização da maconha no Uruguai pode ser entendida como "realidade parcial"
A legalização da maconha no Uruguai pode ser entendida como "realidade parcial"

A crise testará a capacidade de inovação do brasileiro.

Nossas escolas de negócios, de administração, ensinam o brasileiro a ser conservador, a olhar resultados de curto prazo. Com a inovação é o oposto; é preciso arriscar e planejar para o futuro. O problema é que a inovação é estratégia recente na macroeconomia brasileira e ainda precisa de esforço para se manter ativa. A busca da competitividade teve seu início somente em 1997 com a constituição do fundo setorial do petróleo (CT-Petro), e foi intensificada com a promulgação da Lei de Inovação, no fim de 2004. Ainda fazemos pouco. Em uma recente pesquisa promovida pela Strategy &, o comércio (83%) e a engenharia (78%) não se apresentam flexíveis às inovações. Propensas a inovar estão apenas a indústria farmacêutica, a de tecnologia da informação e a rede bancária. É muito pouco.

A legalização da maconha no Uruguai pode ser entendida como "realidade parcial"
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Campeões mundiais no número de presidiários e crescendo.

A situação das prisões na América Latina é deplorável. Há encarceramentos maciços em péssimas condições que só fazem aumentar o poder dos chefões das quadrilhas dentro e fora das prisões. Muitos jovens temem represálias quando são presos e passam a pertencer a essas organizações. É uma tarefa fácil para os chefões pois os autores de infrações menores esperam meses e até anos, antes de serem julgados. No conjunto da região, algo como 50% dos prisioneiros estavam em detenção provisória (na Bolívia esse número chega a 80%).

Na América Latina há 229 detentos para cada 100 mil habitantes, enquanto a média mundial é de 144 detentos. Nas últimas décadas, a taxa de encarceramento aumentou 120% pela intensificação da guerra às drogas. As prisões, todas sem exceção, se tornaram escolas do crime em vez de locais de reabilitação. A situação alarmante dos centros de detenção juvenil acarreta uma alta taxa de reincidência e esquecem que esses centros deveriam fornecer acesso à saúde (especialmente à recuperação do uso de crack), programas esportivos, formações técnicas e aprendizados profissionalizantes. No entanto, fornecem farto material educativo de como praticar mais crimes com menor risco de retornarem a essas senzalas.

A legalização da maconha no Uruguai pode ser entendida como "realidade parcial"
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A negligência e falta de eficiência no combate à criminalidade.

O crime, a corrupção e a impunidade formam um círculo vicioso. E as instituições encarregadas de manter a ordem perdem legitimidade popular (a exceção é a Polícia Federal). Há uma desfuncionalidade na gestão dos setores judiciário e policial. A polícia sofre para virar a página de um passado autocrático dominado por ditaduras. O resultado da transformação policial que nunca chega é que a violência política cedeu seu lugar para a violência criminal. É uma transição inacabada - os serviços de segurança que antes reprimiam o povo por motivos políticos agora pretendem assegurar a proteção da mesma população.

A falta de confiança nas polícias faz que poucas vítimas denunciem crimes e violências. Preferem a perda de um bem a se sentirem desprotegidas de uma possível vingança do malfeitor. E, quando o fazem, o processo não é levado adiante e não chega a nenhuma sentença (em prazos razoáveis só em caso de milagre). Os governos eternizam o privilégio à repressão com os fuzis e pistolas, em detrimento da prevenção e do uso de tecnologias modernas que podem propiciar a instalação de sistemas de inteligência. Há um eterno reformar das leis e normas penais. Há um eterno aumento da criminalidade. Reformar leis e normas constituem a prova contumaz da falta de eficiência. O raciocínio de que o bandido deixará de praticar o crime pelo aumento da punição vem se mostrando ineficaz ao longo dos anos...e os políticos não param de nos enganar. Há uma "economia da criminalidade" que jamais é discutida. Os delinquentes são racionais e calculam os benefícios de suas atividades criminais, contrabalançando com os riscos que elas implicam. A primeira pergunta que ele faz é se será detido. A resposta é: pouca chance (para um dos mais graves crimes que é o homicídio, apenas 8% dos assassinos vão para a cadeia). Em seguida, vem: se for detido, será punido? A resposta continua a mesma: pouca possibilidade. A última é o tempo de sentença (a que os políticos sempre aumentam para engambelar o povo): quanto tempo permanecerá preso? A resposta continua sendo similar: com o tanto de indultos e vantagens por estudo, bom comportamento e especialmente, por superlotação carcerária, em pouco tempo voltará às ruas, perpetuando a ineficiência.

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