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Em Pauta

A única coisa que não pode se comprar é a vida

Mário Sérgio Lorenzetto | 07/01/2016 10:22
A única coisa que não pode se comprar é a vida

Nós inventamos uma montanha, de consumo supérfluo.
Você tem que viver comprando e jogando coisas fora.
E o que estamos gastando é tempo de vida.
Porque quando eu compro algo,
ou quando você compra algo,
não compramos com dinheiro.
Compramos com o tempo de nossa vida,
que gastamos para conquistar esse dinheiro.
Mas com esta diferença,
a única coisa que não se pode comprar é a vida.
A vida se gasta.
E é miserável gastar a vida, para perder a liberdade.


Pepe Mujica, o ex-presidente uruguaio, autor desse libelo contra o consumismo, é um senhor de 80 anos de idade que inspira, principalmente, os mais jovens. Dos escombros da esquerda da América Latina, surge a sabedoria, talvez de um simples trabalhador rural, mas acima de tudo, da obviedade que deveria estar presente nas ações de seus "companheiros": é preciso decência na política. É preciso estar conectado com a juventude do século XXI. É preciso agir em acordo com seu discurso. Mujica leva aos estádios, teatros e acessos na internet milhões de pessoas. Um pop star inspirador. O único líder que restou de uma geração malsinada.

A única coisa que não pode se comprar é a vida
A única coisa que não pode se comprar é a vida

A simplicidade de Mujica fascina, sua sabedoria assombra.

José "Pepe" Mujica anda encurvado. Dirige um fusca. Veste um terno meio surrado. Tem uma barriga imensa. O tom de sua voz é doce...manso. Nele, nada agride. Diz coisas óbvias, sensatas. "Os políticos devem aprender a viver como a maioria do país, não como a minoria". Sua conduta pessoal condiz com o que prega. Normal e humano. Alcançou a presidência do Uruguai em 2009 e, após o mandato, tornou-se o guru, o filósofo de toda uma geração de jovens. Sua simplicidade fascina, sua sabedoria assombra. Especialmente para uma juventude com novos valores, menos materiais, e que exige mudanças.

"Um presidente não deve viver como um monarca", dizia Mujica. E dava o exemplo. Quando presidente continuava a viver em sua chácara, na periferia de Montevidéu. Ia de fusca para o trabalho. Não usava gravata. Abria as portas do palácio presidencial, no inverno, para os moradores de rua. Após o mandato continua com exatamente o mesmo padrão de vida.

Mujica se identifica como um socialista, mas suas palavras e ações são carregadas de uma sensatez que nada tem a ver com uma ideologia partidária. Sua ideologia só pode ser caracterizada como a da sensatez e decência. Em tempos de importação de treinadores e jogadores de futebol estrangeiros, talvez alguém tenha a ideia de importar o Mujica, para "treinar" os políticos brasileiros. De todos os espectros partidários. Os nossos "pobres" políticos que ganham mais de R$100 mil por mês. Que pagam R$324 mil para se hospedar em apartamentos de um hotel de luxo e 17 carros para uma comitiva que foi a Roma assistir à missa inaugural do Papa Francisco. Mujica e Francisco, um uruguaio e um argentino, a mesma pregação, as mesmas ideias, o mesmo exemplo de vida sóbria. Para os brasileiros cresce a insatisfação, vivemos em um estágio que só pode ser definido por uma frase: "estamos de saco cheio". A esperança ainda existe.

A única coisa que não pode se comprar é a vida
A única coisa que não pode se comprar é a vida

Saúde e morte na pré-história.

Quais lições nos oferecem o passado para melhorar a saúde? Aproximadamente durante 95% do tempo que os seres humanos existem, viviam da caça e da coleta. Na atualidade, quando só restam uns poucos grupos de caçadores-coletores no mundo, poderia parecer estranho que a vida dessas pessoas tivesse alguma relevância para a nossa saúde. Mas tem, e muita relevância. Foi nossa existência como caçadores-coletores a que nos formou. Em outras palavras, nós evoluímos para ser caçadores-coletores, e nossos corpos e mentes se adaptaram para o êxito nesse tipo de existência. Os seres humanos vivem como fazendeiros ou habitantes das cidades, por só uns quantos mil anos, e é de utilidade, para entender nossa saúde do presente, conhecer algo sobre as condições para as quais nossos corpos foram desenhados durante 95% do tempo que estamos no planeta.

A única coisa que não pode se comprar é a vida
A única coisa que não pode se comprar é a vida

A dieta do humano pré-histórico.

Os caçadores-coletores realizavam muitas caminhadas a um passo um pouco veloz, perseguindo a sua presa. Caminhavam algo como 20 a 25 quilômetros por dia. Sua dieta continha principalmente frutas e verduras, que normalmente eram mais fáceis de se obter que os animais. As plantas silvestres - diferentes das plantas que são suas descendentes, as cultivadas - são fibrosas, de modo que os caçadores-coletores comiam grandes quantidades do alimento que favorece o processo intestinal. A carne era altamente apreciada, mas com frequência era escassa, mesmo para os grupos mais afortunados que viviam em lugares onde os grandes animais selvagens eram mais abundantes. A carne dos animais selvagens contém muito menos gordura que a dos animais domesticados que comemos hoje em dia. As pessoas comiam uma ampla variedade de plantas e de carnes, muito mais vasta que a consumida ainda em muitas comunidades agrícolas de nossos dias. Assim, as deficiências de micronutrientes eram raras. Um humano pré-histórico não tinha anemia, por exemplo, uma doença comum do mundo contemporâneo, muitas vezes ocasionada pelas famosas dietas de médicos e artistas inescrupulosos. O trabalho era uma atividade cooperativa, realizado com a família e amigos, e as pessoas dependiam dos demais para a obtenção dos alimentos. Tudo isso soa com o que dizem os bons médicos: façam mais exercícios, comam menos gordura animal, mais frutas, verduras e alimentos naturais, assim como as fibras. Um humano pré-histórico nos recomendaria: passem menos tempo na frente dos computadores e mais tempo divertindo-se com os amigos.

A única coisa que não pode se comprar é a vida
A única coisa que não pode se comprar é a vida

A divisão igualitária dos alimentos na pré-história.

A maneira exata na qual se organizavam os caçadores-coletores dependia de onde viviam e do ambiente local. Mas pode-se afirmar que viviam em bandos de 30 a 50 indivíduos, muitos deles parentes, e que o bando era suficientemente pequeno para que todos se conhecessem bem. O bando poderia estar relacionado com outros bandos do mesmo tipo dentro de uma rede mais ampla de centenas ou milhares de indivíduos. Dentro de um bando os recursos alimentares eram compartilhados de um modo extraordinariamente equitativo. Não existiam líderes, reis, chefes nem sacerdotes que recebessem mais que sua justa participação ou que ordenassem a outras pessoas o que tinham que fazer. Pelo contrário; quem desejava impor-se aos demais era motivo de risos e, se persistissem em sua conduta, assassinados. Uma das mais importantes razões da vontade de repartir tudo era que a quase totalidade dos bandos não podiam armazenar os alimentos. Assim, se um caçador e seus companheiros matassem um mamute ou um lagarto comiam até não poder mais. Todavia não tinham como conservar o resto do mamute para os dias em que não conseguiam caçar nem mesmo um pequeno pássaro. Uma boa forma de resolver era compartilhar o mamute com todo mundo, de maneira que quando outros caçavam um mamute em outro dia, os primeiros caçadores recebiam uma parte da carne do animal. Durante centenas de milhares de anos os indivíduos e grupos que conseguiam melhor compartilhar os alimentos viviam melhor que os indivíduos e grupos que não compartilhavam alimentos. Desse modo fomos forjados a evolução nos formou para constituirmos uma espécie com a firme crença na cooperação. É bem possível que, na atualidade, nossa profunda preocupação pela justiça, assim como a afronta de que somos vítimas quando se violam as normas de justiça, estejam enraizadas na ausência de opções para armazenar o resultado da caça dos nossos ancestrais pré-históricos. Existem evidências de que nos lugares onde era possível armazenar, de maneira muito limitada, principalmente nas regiões nórdicas, as sociedades tendiam a ser mais desiguais.

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