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Arquitetura

No Itanhangá, oficina é a parte preferida da casa onde até bacia vira luminária

Paula Maciulevicius | 22/04/2015 06:12
A oficina é que dá as boas-vindas a quem chega, logo na entrada de casa. (Foto: Marcelo Calazans)
A oficina é que dá as boas-vindas a quem chega, logo na entrada de casa. (Foto: Marcelo Calazans)

Os 380m² da casa até ficam escondidos atrás de tantas antiguidades de um valor que não tem preço. Há 15 anos, o auditor de contas Reinaldo Guimarães de Campos, de 59 anos, escolheu o bairro Itanhangá para ser sede das suas quinquilharias. Ali ergueu a casa, onde o quintal faz fundos com a Praça Itanhangá, mas o apego não está no charme do verde das plantas ou da piscina, e sim, na oficina que dá as boas-vindas a quem chega.

Filho de Dourados, fica claro do teto ao chão que seu Reinaldo é um apaixonado por velharias. Ele diz assim mesmo, "coisa velha", "quinquilharia", não é o termo que vai determinar o carinho que ele tem para com a sua história. Na construção, levou em conta a opinião do arquiteto. "Ele disse 'você pode construir em qualquer lugar de Campo Grande com o mesmo preço, mas no Itanhangá, vai valorizar'. E aqui é o melhor lugar da cidade, você está no Centro e não tem nem movimento", constata diariamente Reinaldo, a verdade dita anos atrás.

A frente da casa é a oficina. É por ela que se passa para chegar à porta da sala ou também seguir pelo corredor até os fundos. O espaço foi planejado desde a planta para receber todas as ideias de consertos e reformas que Reinaldo tinha na cabeça na época e teria nas décadas futuras. "A gente fez um pedido para caber 10 carros na garagem, porque a gente gosta de carro velho e vai juntando o dos filhos, da mulher", conta Reinaldo.

Apaixonado por quinquilharias, Reinaldo tem devoção ao passado e à sua casa. (Foto: Marcelo Calazans)
Apaixonado por quinquilharias, Reinaldo tem devoção ao passado e à sua casa. (Foto: Marcelo Calazans)

Hoje são oito veículos. As antiguidades ficam por conta do Fusca do ano de 69 e do Jeep CJ5, de 64, último fabricado nos Estados Unidos e exportado para cá. Era nele que Reinaldo mexia, de portão aberto, quando a gente passou pela frente da casa. "Eu gosto é de fazer, eu acho fantástico o fazer das coisas", explica.

Reinaldo não tem cerimônia. A casa já está aberta, a vida dele, também. "Não é só trocar o óleo, é tirar, assim...". O auditor tenta descrever a mim que nada entendo nem de carro novo, quanto mais de antiguidade. Mas me encanto pela devoção dele ao passado.

"Na verdade, acho que tudo que é antigo, a humanidade quer vender. A gente não pode perder as nossas referências. Eu sou um apaixonado pela história do meu Estado", descreve.

Desde que a oficina começou, logo na cara da casa, é ela o cartão de visitas da família de Reinaldo. No teto, de um lado estão bicicletas da década de 70, do outro uma canoa que desce ao chão com ajuda de um guincho instalado ali, na oficina. Acima da prateleira, tambores de combustíveis que a história conta terem sido usados na 2ª Guerra.

Entre tantas coisas, a maior delas está no cantinho da parede: as ferramentas de quando o pai de Reinaldo era menino. "E a aroeira do fundo era o batedor de roupa da minha mãe. Ali tem enxó, enxada, desempenadeira, raspador de couro, ferradura, bico de arado... Eu, se não fosse auditor, seria carpinteiro. Gostaria muito era de ter feito design de interior de veículos. Mas o curso não tem aqui no país", emenda.

Entre as antiguidades estão o Jeep de 64 (Foto: Marcelo Calazans)
Entre as antiguidades estão o Jeep de 64 (Foto: Marcelo Calazans)
e o Fusca do ano 69. Ao fundo, a porta de entrada da casa. (Foto: Marcelo Calazans)
e o Fusca do ano 69. Ao fundo, a porta de entrada da casa. (Foto: Marcelo Calazans)
Apego maior está ali: nas ferramentas de quando o pai de Reinaldo era menino. (Foto: Marcelo Calazans)
Apego maior está ali: nas ferramentas de quando o pai de Reinaldo era menino. (Foto: Marcelo Calazans)

Formado em Direito, Administração, Design de Interiores e com três pós-graduações na bagagem, é no hobby de conviver com o que foi descartado que ele se realiza. "Eu recondiciono, reformo. Minhas horas vagas são aqui", relata. A casa toda é uma brincadeira do passado. Não só de um, como de vários. Do desconhecido que lhe deu um piano "Boisselot" que seria jogado fora, aos objetos de família que foram herdados.

"Isso, você não herda". A afirmação não está relacionada ao que hoje decora a casa, mas sim ao gosto pelo que é histórico. Ao entrar na residência, Reinaldo apresenta a sala de visita "apertada", o jardim de inverno, a escada que dá acesso aos três quartos, mas de forma aleatória, sem grandes detalhes, apenas como quem numera cada ambiente. O apego vai ficando por conta da mesa japonesa, na qual cada cadeira ganhou uma mão de tinta colorida, na janela que com um vidro virou armário para eternizar os brinquedos dos filhos.

Até corredor é tomado pelo passado. (Foto: Marcelo Calazans)
Até corredor é tomado pelo passado. (Foto: Marcelo Calazans)
Janela virou armário para eternizar brinquedos dos filhos quando crianças. (Foto: Marcelo Calazans)
Janela virou armário para eternizar brinquedos dos filhos quando crianças. (Foto: Marcelo Calazans)
Luminária é feita de bacia e suporte, prato de sobremesa. (Foto: Marcelo Calazans)
Luminária é feita de bacia e suporte, prato de sobremesa. (Foto: Marcelo Calazans)
Nos fundos, tem churrasqueira, tachos de cobre e janela com coleção de estribos. (Foto: Marcelo Calazans)
Nos fundos, tem churrasqueira, tachos de cobre e janela com coleção de estribos. (Foto: Marcelo Calazans)
Na sala de jantar, as cadeiras da mesa japonesa ganharam uma mão de tinta. (Foto: Marcelo Calazans)
Na sala de jantar, as cadeiras da mesa japonesa ganharam uma mão de tinta. (Foto: Marcelo Calazans)

A luminária de fora foi feita de bacia e prato de sobremesa como suporte. A balança do aparador era do bolicho do pai de Reinaldo, já os tachos de cobre da parede foram sendo juntados de parentes. A janela comprada num leilão da Noroeste deu lugar à coleção de estribos. No meio da narração corrida de Reinaldo, ele se vira e encara meus olhos que não sabem para onde olhar. "É muita coisa, não é?" E como.

Quando questionado se a casa do Itanhangá onde se entra pela oficina é a cara de seu dono, ele ri. "Eu acho. Por que? É meio bagunçada, mas assim, é como a vida da gente. Nunca está pronta".

Tendo compreensão que a paixão não foi herdada, ele também sabe que a mesma devoção não é compartilhada pelos seus filhos. "Se eles vão dar continuidade? Eu acho que não, faz parte de mim. Só sei que quando eu for, vai ser tudo jogado fora".

Os fundos tem churrasqueira, mas é através da portátil que os churrascos acontecem na oficina. "É lá que a gente passa a maior parte do tempo mesmo", se justifica. E sabe por que? Porque para Reinaldo existe uma regra essencial. "A primeira coisa que você tem que ser é feliz. Tem que ser feliz todo dia, você não sabe até quando vai viver?"

Fundo da casa é este. (Foto: Marcelo Calazans)
Fundo da casa é este. (Foto: Marcelo Calazans)
Mas é na oficina da frente que dono é feliz. (Foto: Marcelo Calazans)
Mas é na oficina da frente que dono é feliz. (Foto: Marcelo Calazans)

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