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Arquitetura

Pioneira em bairro nobre, casa de vó com porteira é sítio de mineiros na cidade

Paula Maciulevicius | 05/06/2014 07:18
Última casa da rua mais parece sítio de vó. Ao bater, quem atende a porteira é a mineira Lourdes. (Fotos: Cleber Gellio)
Última casa da rua mais parece sítio de vó. Ao bater, quem atende a porteira é a mineira Lourdes. (Fotos: Cleber Gellio)

Casa de vó, sítio em plena cidade tem porteira em vez de portão, poodle como cão feroz e um cheiro de comida que só pode vir das panelas de quem veio lá das Minas Gerais. No bairro Carandá Bosque, em Campo Grande, uma das primeiras casas da rua Mendel fica lá no final da via, onde a Capital vai ficando para trás no caminho até a porteira.

Ao tocar a campainha, os olhos correm diante de dois avisos. De que na casa se vende artesanato – pano de prato e bijuterias - e para ter cuidado com o cão feroz. O tal animal que vem nos receber nem latir, late. “Lady” é uma poodle, que de brava não tem nada do que a placa adverte.

A casa mais parece um sítio, não só pelo pé de goiaba e de romã que dá às boas vindas para quem passa pela rua, mas principalmente pela distância entre casa e portão. Até que chegue à corrente da porteira, dona Lourdes caminha por todo um varandão. Tamanho que a gente só entende o porquê depois da foto de todos os netos na parede.

Costume da roça, sino que chamava criados é enfeite na casa de Lourdes.
Costume da roça, sino que chamava criados é enfeite na casa de Lourdes.

Sorridente, uma senhora de cabelos grisalhos e óculos atende ao chamado e nem se retrai diante da proposta de uma reportagem. “Todo mundo que passa aqui gosta, mas essa casa não tem nada demais”, comenta. Modéstia à parte dona Maria de Lourdes Cardoso Lopes, a casa da senhora tem tudo de bom.

Aos 76 anos, ela já avisa que tem panela no fogo. Como se o cheiro lá de fora não tivesse alertado. O riso, a hospitalidade e os passos já não tão rápidos dão à ela o título de vó logo de cara. A gente nem precisa perguntar o número de netos. Dona Lourdes parece ter saído das cenas de filmes, de novelas ou das páginas de um livro. Não só ela. A casa também.

“Aqui era tudo terreno vago, a gente mudou para aqui quando abriu o terreno todo. Há quanto tempo estamos aqui? Agora você me pegou, desde 1991. Tinham poucas casas, era de um dono de fazenda. Tinha horta, muita fruta muito pé de manga”, descreve à volta ao passado que ela mesmo faz.

Mineira já sem sotaque – uai sô – dona Lourdes explica que a família deixou as Minas Gerais para trazer os filhos ao trabalho. “Era muito filho. Nove. Seis homens e três mulheres”. A casa da porteira foi o terceiro e definitivo lar dos mineiros.

O portão de madeira seguido da corrente, similar à uma porteira foi mandado fazer. Não veio de nenhuma fazenda, embora a dona seja da roça. “Isso é meu marido que gosta, ele gosta muito de arte. A garagem também era porteira, mas daí estragou e teve que botar portão de correr”, conta.

Recém colhidas no jardim, flores em vaso enfeitam a sala e a vida da senhorinha.
Recém colhidas no jardim, flores em vaso enfeitam a sala e a vida da senhorinha.

Da varanda, elas nos convida a entrar casa adentro. A área tem mesa, cadeiras e para uma foto de família, só faltam mesmo os descendentes. “Meus netos vêm todo domingo para cá. Ao todo somos 32 pessoas. Quando chega todo mundo cabe, viu? A gente vai se acomodando. Só de neto eu tenho 18”. Até que o número é baixo levando em conta a quantidade de filhos.

Próximo da mesa que serve a família toda aos finais de semana, um sino relembra o modo caipira de chamar para o almoço. “Isso é mania de gente de roça. É só para fazer hora mesmo, como se fosse chamar os criados, mas ninguém usa”.

A casa ocupa um terreno e a garagem com quintal, plantas e árvores, outro. Mas um dia, tudo foi uma casa só. “Na realidade na garagem que era a minha casa. Era de madeira, mas o cupim comeu e precisou construir de alvenaria. Aproveitou só a cozinha”, narra. De tábua então, aí sim que a gente teria a impressão de que deixou a cidade pelo mato, o bairro pela roça e os carros pelos cavalos.

Venezianas de madeira deixam também sair a luz de dentro.
Venezianas de madeira deixam também sair a luz de dentro.
Varanda cheia de mesas e cadeiras para dar lugar aos 32 membros, ao todo, da família Lopes.
Varanda cheia de mesas e cadeiras para dar lugar aos 32 membros, ao todo, da família Lopes.

“Sabe que achavam que a gente era caseiro do terreno aqui? É que era tudo aberto. Criavam vaca por aqui. Sempre foi assim”. À medida em que ela vai falando, a equipe segue até chegar na sala. O mimo de casa de vó está ali, entre as fotos dos netos, um vasinho de água com flores dentro, recém colhidas do quintal.

“Eu tinha vontade até de fazer uma floricultura por aqui. A gente planta, tem pé de acerola, pitanga, laranja, poncã, jabuticaba, muda de hortênsia. Vou fazendo e vou deixando e eu costuro também”, conta.

Das venezianas de madeira, as janelas se abrem para a luz de uma casa onde os moradores são iluminados. Da série “Minha casa, minha cara”, está para nascer casa de vó como a de dona Lourdes.

“Eu gosto demais daqui. Vem família e enche de carro. Os vizinhos antes achavam que eu fazia festa. Mas é uma. Não deixa de ser, não é?”

Casa mais parece sítio que recepciona os visitantes com flores, frutas, árvores e plantas.
Casa mais parece sítio que recepciona os visitantes com flores, frutas, árvores e plantas.
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