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Artes

Com 60 anos de carreira, Beth e Betinha não têm show, mas nem pensam em desistir

Naiane Mesquita | 09/07/2016 07:05
Beth e Betinha tem 60 anos de carreira e muito desejo de continuar (Foto: Alcides Neto)
Beth e Betinha tem 60 anos de carreira e muito desejo de continuar (Foto: Alcides Neto)

Betinha me esperava no portão com o celular em mãos, me ligava com o desejo de apressar a entrevista. O neto tinha um compromisso e não poderia esperar por muito tempo. Ela fazia questão de nos apresentar pessoalmente para falar de um show que ele realizaria no final de semana. Assim como quase toda a família, Davyd tem no sangue o amor pela música.

Nos anos 50, as duas rodaram o País como as princesinhas da fronteira
Nos anos 50, as duas rodaram o País como as princesinhas da fronteira

Brincalhona e enérgica, ela não se intimida em pedir por ele na reportagem e é dessa forma que fica ainda mais fácil compreender como duas meninas, na época com 12 e 18 anos, formaram a dupla Beth e Betinha, uma das mais importantes da história da música de Mato Grosso do Sul, em uma década que as mulheres não tinham voz.

A carreira que beira os 60 anos de história não tem mais a mesma força de antes. Sem shows há muito tempo, elas preferem tocar em festas familiares a receberem cachês que não custeiam nem a banda que as acompanha. “Nossa carreira está péssima. Não tem nada. Estamos sem show. Beth e Betinha trabalharam pelo Estado durante 40 anos, mas nos aposentamos por causa do Lula. Se não fosse isso estaríamos jogadas as traças. Shows não tem aparecido e quando aparece é mixuruca, não dá para pagar nem o artista que faz freelancer para nós. Fica um ou dois freelancer sem ser pago e nós duas também. Isso para nós não é negócio”, dispara Betinha.

Beth é mais calada, mas igualmente bem-humorada. Com 80 anos de idade, ela complementa tudo que a irmã fala e relembra com carinho da época em que elas eram jovens. “Sempre fomos companheiras. As vezes brigávamos, mas depois passava. Hoje em dia não.. não brigamos mais”, esclarece.

Realmente é difícil não acreditar que Beth e Betinha eram unidas em tudo. De 11 irmãos, sete mulheres e quatro homens, foram elas que decidiram seguir os passos do pai, um maestro uruguaio que as incentivou a continuar no ramo artístico. Naturais de Rio Brilhante, as princesinhas da fronteira começaram a cantar em uma rádio do Paraguai e só depois ganharam o País de origem.

As duas afirmam que sobem nem que seja de bengala no palco (Foto: Alcides Neto)
As duas afirmam que sobem nem que seja de bengala no palco (Foto: Alcides Neto)

“Mulher artista era igualzinho mulher de zona na boca do povo antigamente. Hoje em dia não. Na época, nossa irmã mais velha acompanhava. Ela viajava junto com a gente. Cantamos em circo, cinema, salão paroquial, fizemos excursão. A primeira excursão durou sete anos, só voltamos para casa no Natal ou Ano Novo, não lembro direito”, conta Betinha.

Segundo ela, aos 17 anos, a plateia nem as ouvia direito, só diziam “que mulheres lindas”. Aos 30, eles já ouviam a música, “como cantam bem”. Hoje, sobram elogios fofos. “Que gracinha. Não é gostoso. Não é a recompensa da gente?”, questiona.

Outro causo que ela conta com orgulho é sobre o reconhecimento dos fãs depois de tantos anos. “As vezes a gente está na rua e um rapaz novo olha e diz. Não é Beth e Betinha? Meu avô gostava delas, minha bisavó, sei la das quantas porque eu nem quero ouvir. Ainda estou novinha. Não tem esse negócio não”, ri.

Para elas, não tem essa de deixar os palcos. Talvez, no máximo, abandonar o salto alto. “Nós nunca vamos nos desligar, vamos morrer com a música e vamos subir no palco nem que seja de bengala, mas vamos, se Deus quiser”, promete.

Betinha diz que apesar de ter recebido muito apoio de órgãos públicos no passado, hoje há poucos projetos que resgatam grandes nomes. “Não temos mais apoio. Não tem iniciativa privada”, diz.

Se antigamente era melhor ser artista, ela duvida em alguns pontos. “Hoje em dia está melhor até para gravar, para fazer show. Antigamente o artista para cantar tinha que ser artista mesmo. Tinha que saber afinar um violão, tinha que ter a voz, tocar acompanhando enquanto gravava. Hoje não precisa, o gravador faz tudo. Você coloca um computador ali, uma pessoa que fuma, que a voz está lá em baixo, ele tenta, não deu, corta e vamos continuar. Ai emenda e fica aquela “a” comprido. Mas é o computador que faz”, explica.

Aos 74 anos de idade, Beth não dispensa novos projetos para as irmãs. “Mas teria que ser algo do governo ou município, porque não temos como”, acredita.

O show do neto de Betinha, Davyd e Ewerton será no domingo, na Chácara do Silvinho, no bairro Santa Emília. "Ele sempre me acompanhou nos shows, tem 19 anos de estrada", diz, orgulhosa.

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