ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
MARÇO, QUINTA  28    CAMPO GRANDE 27º

Artes

No ônibus, espetáculo conta pela dança as histórias de quem usa coletivo

Paula Maciulevicius | 15/03/2015 07:58
No espetáculo, eles retratam com a fala e o corpo o que já aconteceu a eles ou a qualquer um que suba neste ponto. (Foto: Isabela Ferreira/Contém Comunicação)
No espetáculo, eles retratam com a fala e o corpo o que já aconteceu a eles ou a qualquer um que suba neste ponto. (Foto: Isabela Ferreira/Contém Comunicação)

"Aquele dia o ônibus estava cheio, não tinha nenhum espaço, quando um homem que parecia um Papai Noel me falou para ficar na frente dele. Eu tinha só 12 anos". "Subi no ônibus saindo da faculdade, no Morenão, torcendo para ter lugar". "Naquele dia eu voltava do ensaio, subi no 85". "Quando eu era criança, sempre passeava com a minha avó de ônibus". "Entrei chorando, tinha muito lugar vago, sentei lá no fundo, abaixei a cabeça e comecei a chorar". "Parei do lado de uma louquinha e ela começou a gritar 'biscate, ô biscate'". 

Com lanternas nas mãos, os bailarinos em cena contam cada um sua história das idas e vindas de andar de ônibus por Campo Grande. O espetáculo "De Passagem", da companhia Dançurbana, começa a apresentação só depois que o público se torna passageiro. Com o bilhete em mãos, o coletivo para em frente ao Teatro Aracy Balabanian e a ordem para que os espectadores possam subir vem do grito "tá cheio".

Desde gentilezas e não tão gentilezas assim são revividas. (Foto: Isabela Ferreira/Contém Comunicação)
Desde gentilezas e não tão gentilezas assim são revividas. (Foto: Isabela Ferreira/Contém Comunicação)

As histórias que abrem a apresentação são repetidas enquanto eles trocam, se movem e dançam pelo corredor do coletivo. Em 1h20 de espetáculo, eles retratam com a fala e o corpo o que já aconteceu a eles ou a qualquer um que suba neste ponto. Desde gentilezas e não tão gentilezas assim, abusos que todo mundo vê, mas ninguém faz nada, cochiladas quando o sono pesa, até amor e o próprio tesão que pode aflorar de um canto a outro da cidade.

Cantorias, barulhos repetitivos, a correria para ocupar o assento vago, as curvas, a direção do motorista, o barulho do botão apertado ou da cordinha puxada. Movimentos e sons que representam a rotina de passageiros todos os dias. A dança de rua foi levada para dentro do ônibus, mas também sai dele. Em todas as paradas, quase 10, os bailarinos descem e fazem da calçada, o palco, ora com projeção no muro, ora com lambe-lambe, ao som de Chá Noise.

A ideia do espetáculo começou a ser pensada em 2010. Amigos há mais de 10 anos, Paula Bueno, responsável pela concepção e criação e Marcos Mattos, que assina a direção artística e geral, contam que sempre tiveram vontade de criar algo juntos. "A Paulinha veio com a ideia de criar um instabilidade, algo que fugisse do tradicional, que era o palco italiano e começamos a pensar em tentar levar a dança de rua para a rua, mas de outro jeito", descreve Marcos.

Levantando questões sobre o que poderiam e como poderiam abordar, os dois perguntaram o que as pessoas do Dançurbana tinham em comum além da dança? A resposta foi o transporte coletivo. O ônibus então foi a escolha do palco ambulante como ferramente para a construção do trabalho.

A montagem do roteiro veio dos próprios bailarinos que assumem a posição de intérpretes criadores.(Foto: Isabela Ferreira/Contém Comunicação)
A montagem do roteiro veio dos próprios bailarinos que assumem a posição de intérpretes criadores.(Foto: Isabela Ferreira/Contém Comunicação)

"Vamos tirar o "chão" deles, eles não vão ter aquela certeza absoluta que é a dança de rua", observa Marcos.

A montagem do roteiro veio dos próprios bailarinos que assumem a posição de intérpretes criadores. "A cada semana dávamos tarefas para eles: essa semana queremos histórias. Passamos muitas segundas-feiras andando de ônibus juntos", explica Paula. De passagem pelo coletivo, eles precisavam perceber o corpo movimento dentro do ônibus, o peso, como as pessoas são, como estão e ir também percebendo os espaço. Depois, todas as experiências foram juntadas para compor a apresentação.

"Partiu delas as histórias, eles que viveram, se não são eles, são de pessoas muito próximas", destaca Marcos. No total, foram oito meses de montagem e preparo, primeiro em solo, depois no coletivo e por fim com ele andando. Que é o que a gente vê em cena.

A escolha das músicas de Chá Noise para o espetáculo veio, segundo os criadores, por serem canções genuínas. "Tem a ver com tudo isso que a gente está fazendo, a estrutura da música, a abordagem que além de ser urbana, é uma abordagem política que eles fazem, tem tudo a ver com essa pegada social que a gente acredita que está fazendo", compara o diretor.

O nome "De Passagem", veio da própria pluralidade que a expressão sugere. Dar passagem, de passagem, dê a passagem... "Essa ideia do ônibus, de um lugar onde as pessoas estão passando, de circular pela cidade, a gente queria um nome que tivesse a ver com isso e que também vem a calhar com movimento político, da passagem para o que a gente quer fazer, para o artista, que a arte é necessária", finaliza Marcos.

O espetáculo é apresentado às sextas, sábados e domingos de março: dias 15, 20, 21, 22, 27, 28 e 29. São duas sessões por dia: às 19h e 21 horas. A saída e chegada do ônibus acontecem em frente ao Teatro Aracy Balabanian (localizado na rua 26 de agosto, 453, centro). As apresentações são gratuitas, mas é preciso reservar a vaga pelo e-mail: contato.aradocultural@gmail.com, enviando nome completo, número do telefone e, dia e horário da sessão que deseja assistir. Cada sessão tem capacidade para receber 25 passageiros e um cadeirante. 

Nos siga no Google Notícias