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Artes

Divas da música erudita se desdobram para levar drama e riso aos palcos em MS

Elverson Cardozo | 23/04/2012 14:48
Angélica Jado durante apresentação da Ópera "O Empresário". (Foto: Elverson Cardozo)
Angélica Jado durante apresentação da Ópera "O Empresário". (Foto: Elverson Cardozo)

Em um único ato elas vão do drama ao riso. Roubam a cena de maneira imprevisível e, por alguns minutos ou horas, fazem com que o público se transporte para um mundo surreal. São as divas campo-grandenses da música lírica que, para manter a paixão no Estado conhecido por ícones do sertanejo, levam uma vida dupla, boa parte do tempo longe do glamour dos palcos e fora de toda atmosfera de grandes centros.

Alcenir Luz é luz. Poesia pura. Emoção a maior parte do tempo. Já trabalhou com pintura, artesanato e terapias alternativas. Foi dançarina do grupo Ginga e deixou de ser boleira recentemente.

É mãe, esposa, mulher. Alcenir também já foi Barbarina, filha de um jardineiro na ópera-cômica “As Bodas de Fígaro”, de Mozart. A soprano, que nasceu em Cassilândia, só despertou para música aos 30 anos.

A paixão veio antes, aos 5, ouvindo música sertaneja cantada pelos pais, que já tentaram virar cantores. “Meu pai sempre cantava Índia, de Roberto Carlos. Eu ficava encantada, embasbacada”, descreve.

"Sou extremamente emoção", diz Alcenir. (Foto: Minamar Júnior)
"Sou extremamente emoção", diz Alcenir. (Foto: Minamar Júnior)
A cantora em "Uma noite com Mozart". (Foto: Arquivo Pessoal)
A cantora em "Uma noite com Mozart". (Foto: Arquivo Pessoal)

A primeira experiência na música erudita foi no coral da Fundac (Fundação Municipal de Cultura). “Eu percebi que eu tinha um pouco mais de facilidade que as outras pessoas. Minha voz sobressaia”, conta.

Hoje, aos 48 anos, Alcenir Luz já participou de diversos coros, recitais, apresentações solos e coleciona algumas óperas. Atualmente participa de um coro lírico e integra um grupo de cerimonial para festas e eventos corporativos.

Falta de incentivo - Viver da música é um sonho apenas. A realidade e a falta de incentivo por parte do poder público, por exemplo, é um dos fatores que desanima a cantora. “Eu já voltei de ópera de bicicleta”, revela, se referindo ao falso glamour dos palcos.

A soprano Viviane Priccela compartilha da mesma opinião e critica a falta de incentivo. “Na Europa, músico tem status de médico”, comenta. “Eu penso e confirmo: Tem que ter mais investimento”, completa.

Nascida em Campo Grande, a cantora morou 10 anos em Florianópolis. Na Capital de Santa Catarina participou de diversos espetáculos. Não voltou a Mato Grosso do Sul por vontade.

Foi por um problema de saúde que, inclusive, a prejudicou na carreira. Uma lesão no nervo trigêmeo, em decorrência de uma cirurgia mal sucedida do siso. “Voltei por causa do clima”, conta.

Na Capital desde 2008, Viviane já participou da montagem de óperas, recitais e outras apresentações. Diz que a cidade tem um “público cativo”, mas afirma que as autoridades “não olham a música erudita com a devida destreza”.

Do pop ao canto lírico - Para quem era fã de carteirinha de Michel Jackson, reproduzia coreografias de sucesso e colecionava pôsters do rei do pop, a idéia de algum dia se tornar cantora lírica soava quase como uma afronta.

Hoje, até a gargalhada de Viviane é musical. De um musical dramático. Daqueles que encantam e deixa a gente vidrado até o final do espetáculo.

A descoberta do talento musical viria a ser por acaso.

"Eu era fã de Michael Jackson", diz Viviane. (Foto: Minamar Júnior)
"Eu era fã de Michael Jackson", diz Viviane. (Foto: Minamar Júnior)
A artista em apresentação no Glauce Rocha, durante a semana da voz. (Foto: Elverson Cardozo)
A artista em apresentação no Glauce Rocha, durante a semana da voz. (Foto: Elverson Cardozo)

Foi contando as cadeiras do teatro Glauce Rocha e atrapalhando o ensaio do coro em que o pai participava que aos 13 anos a menina – apaixonada pelo astro norte-americano - começou a cantar.

“Naquele dia faltaram todas as sopranos e o maestro interrompeu o ensaio para corrigir o coro e meu ouviu cantando. Ele perguntou se eu queria participar eu disse que não porque era música de velho”, relembra sorrindo.

Apesar da contrariedade que fez os coralistas sorrirem, Vítor Marques Diniz, o maestro que regia o coro, não precisou insistir muito. O teste foi ali mesmo, na hora. Nasce então a soprano que, anos depois, viria a encantar platéias.

Formada em canto lírico pelo Conservatório Brasileiro de Música do Rio de Janeiro, Viviane Priccela começou a estudar flauta doce aos 5 anos. Na época, já cantava no coral infantil da Igreja Presbiteriana.

Estreou o primeiro concerto em 1987, na cidade de Glória de Dourados, cerca de três semanas após ter aceito o convite para integrar o coro do qual a mãe e o pai já faziam parte. Em três meses já estava fazendo solos.

“Eu simplesmente não queria saber de mais nada. Só música erudita”, conta.

Depois de 18 anos, hoje, aos 40 anos, Viviane Priccela também coleciona uma boa quantidade de participações em óperas. Se especializou em produções da Broadway.

Complementa a renda com a música, mas não vive dela. Sobre o trabalho que desenvolve, resume: “Eu me vejo como um mordomo a serviço de Deus”, diz Viviane, acrescentando que é uma cantora “às avessas”. Não conseguiria viver, por exemplo, sob os deslumbres da fama.

Vida dupla - Angélica Jado consegue viver sobre os deslumbres da fama. Só no palco. Na vida real é mais rígida; “mais contida”, mas vive intensamente como as personagens que interpreta.

Enfermeira e musicista, Angélica Jado conta que mantém uma "vida dupla". (Foto: Minamar Júnior)
Enfermeira e musicista, Angélica Jado conta que mantém uma "vida dupla". (Foto: Minamar Júnior)
Angélica durante apresentação da ópera "O empresário". (Foto: Elverson Cardozo)
Angélica durante apresentação da ópera "O empresário". (Foto: Elverson Cardozo)

Enfermeira formada pela UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) e, atualmente, supervisora de enfermagem da Sesau (Secretaria Municipal de Saúde), a paixão de Angélica sempre foi música.

Conta que escolheu o curso na área de saúde por falta de opção e, também, por estabilidade financeira, mas diz que procura se empenhar na profissão de forma brilhante.

A dedicação à música, explica, acontece depois das 17h e aos finais de semana. “É uma vida dupla”, resume.

Depois de concluir o curso de enfermagem, a soprano, que nasceu em Paranaíba e começou a cantar ainda criança, resolveu cursar música pela mesma universidade em 2006.

Foi na pele de uma velha senhora, encrenqueira e solteirona, que Angélica Jado estreou a primeira ópera, em 2003, na montagem de “As Bodas Fígaro”, uma obra de Mozart.

De lá para cá, várias apresentações em recitais, concertos e óperas. A cantora gosta de provocar riso, mas revela que prefere o drama.

“A gente experimenta e sente emoções que na vida real não consegue”, diz, acrescentando que a emoção de cantar para 2 pessoas ou 2 mil é a mesma coisa.

Prefere teatro pela possibilidade de ser “outra”, por meio das personagens. Sobre o trabalho que desenvolve, diz que o foco é a educação musical e a possibilidade, recompensadora, de levar o público a “outro mundo”.

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