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Comportamento

Alegria para empresária veio no sucesso de Maria, a funcionária com deficiência

Paula Maciulevicius | 16/02/2016 06:34
Maria no último sábado recolhendo os pratos e atendendo clientes. (Foto: Recanto das Ervas)
Maria no último sábado recolhendo os pratos e atendendo clientes. (Foto: Recanto das Ervas)

"Uma das felicidades de uma semana tumultuada de trabalho e cheia de obstáculos pela frente foi ver o crescimento profissional dessa garota que trabalha comigo há quase um ano". Seria a postagem de qualquer empresário como elogio ao funcionário do mês. Márcia Chiad, dona do restaurante Recanto das Ervas, resolveu expressar publicamente a admiração que tem por Maria, deficiente intelectual que bateu à porta dela depois de um convênio firmado com a Pestalozzi. Foram meses de adaptação, até ver Maria deslanchar e um sorriso de felicidade na face das duas.

Experiência com deficientes, Márcia já tinha. O melhor funcionário dela não ouve, mas entende como ninguém, há sete anos, como fazer a manutenção das hortas do Recanto. Um ano atrás, a Pestalozzi a procurou, oferecendo uma funcionária, era Maria, hoje com 19 anos e muitas limitações deixadas para trás.

"Ela morria de medo de gente, saía correndo e eu falava: não vai dar certo", recorda Márcia. Durante a adaptação, a psicóloga que acompanha Maria na Pestolozzi orientou para que ela então ficasse em uma posição que não tivesse tanto acesso ao público.

Na cozinha, o ofício de Maria é lavar a louça, tarefa que ela diz gostar e que desenvolve com primor. Segundo a chefe, capricho, zelo e organização, a funcionária tem de sobra. "É impressionante a evolução dela, o que me dá prazer é isso", conta Márcia.

Márcia contando que de início achou que não daria certo a experiência. (Foto: Fernando Antunes)
Márcia contando que de início achou que não daria certo a experiência. (Foto: Fernando Antunes)
Maria lava louças, junta pratos e ainda joga basquete, futebol e faz corrida. (Foto: Fernando Antunes)
Maria lava louças, junta pratos e ainda joga basquete, futebol e faz corrida. (Foto: Fernando Antunes)

A deficiência intelectual pode ter várias causas, algumas são problemas na hora do parto, outras podem vir de ordem secundária, influenciada pelo meio onde se vive e cresce. Este tipo de deficiência afeta habilidades básicas como auto-cuidado, autonomia, trabalho, comunicação e inteligência. No conjunto delas, Maria saiu prejudicada na fala e tem dificuldades de discernimento, leva tudo ao pé da letra, sempre.

As brincadeiras foram um cuidado que Márcia teve de tomar. De orientar aos demais colaboradores que evitassem de brincar com Maria, porque a jovem entende tudo no sentido literal. As primeiras dificuldades também incluíam o ritmo da nova funcionária, que era bem lento.

Por ser autêntica, como a chefe a define, Maria por vezes dizia na lata que não queria trabalhar no dia seguinte, por preguiça. E chegava a ligar dizendo que não iria, porque estava chovendo. Do outro lado, ouvia de Márcia que ela não era de açúcar e que poderia andar mesmo na chuva. Uma não desistiu da outra.

"E hoje ela vem com o maior prazer... Ela é tratada igual aos outros, não tem regalias", conta Márcia. São quatro horas diárias de segunda a sexta, intercaladas com os períodos em que ela tem aula na Pestalozzi ou passa pelos serviços de saúde. Aos sábados, como o Recanto também abre, a funcionária recebe hora extra.

No ofício que mais gosta: de lavar a louça. (Foto: Fernando Antunes)
No ofício que mais gosta: de lavar a louça. (Foto: Fernando Antunes)
O sorriso das duas é nítido de que experiência deu certo. (Foto: Fernando Antunes)
O sorriso das duas é nítido de que experiência deu certo. (Foto: Fernando Antunes)

Neste que passou, Maria foi uma mão na roda e a prova de que é capaz sim de atender ao público. "Fiquei sem dois funcionários aqui na frente, fui lá, chamei ela para me ajudar. Eu disse que ajudaria ela. Em segundos ela trocou o sapatinho de usar na cozinha pelo tênis e veio", descreve a dona.

Maria pedia licença aos clientes e recolhia as louças. Apenas na hora da fala que o entendimento ainda fica comprometido. "Mas foi um show de atendimento, ela até ganhou gorjeta e veio me perguntar se ela podia ficar com o dinheiro, porque não era o trabalho dela. Ela saiu tão feliz e eu vi que ela pode", resume Márcia.

A funcionária vem do bairro Paulo Coelho Machado todos os dias e chega depois de pegar dois ônibus. Tem irmãos e uma mãe que também é deficiente. Mora numa casa humilde, simples e um brinco no quesito limpeza e organização. "Eles têm certas limitações pela deficiência, mas são incapazes de mentir, de esconder alguma coisa", narra Márcia. Um copo quebrado, por exemplo, era motivo de choro para Maria no início.

"Eu ensino uma vez e ela pega de imediato. Mas se ela aprende que esse vaso é aqui, é aqui que ele precisa estar sempre", exemplifica Márcia.

"Eu lavo louça e tiro prato", conta sobre a rotina, a funcionária Maria Aparecida Vaz. Quando o Lado B chegou ao restaurante, encontrou a jovem cortando capim para o suco, uma de suas tantas habilidades. "Ela também joga, isso eu só descobri depois que postei a foto e foram falando", diz Márcia e Maria completa: jogo basquete, futebol e faço corrida.

Márcia avalia que não foi fácil e preciso muita paciência, mas vê-la evoluir dessa forma, não tem preço. "Ela não vai sair daqui", brinca. E o que dar uma oportunidade à deficiência ensinou para a empresária? Ver a felicidade.

"Eu vi a felicidade dela, mesmo na humildade, nas dificuldades, ela consegue se superar e enfrentar todas as barreiras. Maria me ensinou a ver que precisa de muito pouco para a gente ser feliz", resume. E por ter de transpor as limitações, Maria acaba dando uma dedicação extra, sempre.

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