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Comportamento

Alguém em Campo Grande ainda acha normal passar mão boba em mulher na balada?

Paula Maciulevicius | 08/08/2016 06:05
Lidiane, Luane e Karoene. Meninas que na balada, já perderam as contas de quantas vezes foram assediadas. (Foto: Marcos Ermínio).
Lidiane, Luane e Karoene. Meninas que na balada, já perderam as contas de quantas vezes foram assediadas. (Foto: Marcos Ermínio).

Na semana que passou, caso de assédio dentro de uma casa noturna em Campo Grande foi parar na delegacia. A mulher, que estava junto do namorado, teve os seios apalpados por um desconhecido quando saía do banheiro. Parece ridículo, mas o Lado B saiu na balada no fim de semana e descobriu que esse tipo de assédio é o que não falta. 

Na principal casa noturna sertaneja da cidade, não dá nem para contar a quantidade de “olhadas” grosseiras que eles dão rumo às mulheres que passam. As “secadas” são sempre em direção aos seios ou à bunda e chegam a constranger até quem só observa. Imagina então quem as recebe? E se ficasse só nas ‘olhadas’...

Tem homem tão cara de pau, que faz plantão na porta do banheiro. E a justificativa masculina chega a ser surreal. Muitos começam com um “Sou contra, mas...” e tem até quem argumente que se a mulher está na boate, está sujeita a qualquer coisa.

Na visão delas, apesar de frequente, as passadas de mão não tem nada de normal. Nem roupa curta, decote ou bebida justificam.

Para Karlla só uma coisa justifica a atitude dos homens: machismo. (Fotos: Marcos Ermínio).
Para Karlla só uma coisa justifica a atitude dos homens: machismo. (Fotos: Marcos Ermínio).
Lidiane já teve braço e cabelos puxados sem permitir nada disso. "É uma mulher, não um objeto", argumenta.
Lidiane já teve braço e cabelos puxados sem permitir nada disso. "É uma mulher, não um objeto", argumenta.

Lidiane, Luane e Karoene têm de 18 a 20 anos e já perderam as contas de quantas vezes foram assediadas. “A gente nem quer nada e eles já chegam pegando e não tem o que fazer, nos sentimos meio indefesas”, conta a estudante de Engenharia, Lidiane Costa, de 18 anos.

Com ela já puxaram braço, cabelo e pegaram na cintura, sem que ela permitisse nada disso. E um cara assim, na opinião dela, nunca teria chance. “É uma mulher, não um objeto que vai pegando. Eu não ficaria. É totalmente ridículo, machista”.

A amiga faz uma análise diferente. “É relativo, porque depende da mulher e de como ela se impõe, se ela dá abertura. Mas também tem a bebida e os homens acham que estão no direito de tudo. Tem uns abusados que chegam passando a mão, sem saber se você está aceitando o que ele está fazendo”, diz a estudante de Farmácia, Karoene Ferreira, de 20 anos.

E tem alguma coisa que justifique a atitude deles? “Eles acham que só porque está com roupa curta pode chegar passando a mão, que porque está vestida desse jeito é fácil. Geralmente os caras tão bêbados ou nem ligam para a nossa opinião”, completa a estudante de Direito, Luane Pallaoro, de 19 anos.

Às vezes nem estando acompanhada, mulher deixa de sofrer assédio. (Foto: Marcos Ermínio).
Às vezes nem estando acompanhada, mulher deixa de sofrer assédio. (Foto: Marcos Ermínio).

Antônio hoje tem 26 anos e tenta amenizar o problema atribuindo à “molecagem”. “É um abuso do cara, mas é pouca idade, aqui se você ver só tem gurizada nova”, afirma o autônomo Antônio Marcos Dutra.

As amigas Lídia França, de 23 anos e Patrícia Borges, de 25, tentam encontrar argumentos que “sustentem” o que eles tanto fazem na balada. Mas nada é maior que o machismo de pensar que por serem homens, têm direito ao corpo das mulheres. “Pode ter bebido demais, às vezes é sem vergonha mesmo, quer se aparecer para os amigos. Mas você não deu liberdade para a pessoa e nada justifica, é uma falta de respeito, atitude de quem não tem caráter”, descrevem.

Na balada, o casal de namorados Karlla e Matheus sabe muito bem o que é ter de enfrentar o assédio. A jovem de 19 anos relata que quase sempre os caras chegam tentando passar a mão ou falar algo que ela não precisa escutar.

“Eu acho que 2016 é pior que no passado, porque eles ainda acham que são muito mais superiores e só porque eles têm vontade, a gente tem que ceder. Isso é machismo, só isso que justifica”, opina a bancária Karlla Medina, de 19 anos. Por ter namorado, ela ainda vê um agravante: os homens até aumentam o assédio. “É uma coisa que incomoda bastante, quando a gente vai para a festa, meu namorado já fala: 'tenta não sair de perto, porque você sabe como é'. A gente sempre tem que estar com alguém para tentar evitar e nem sempre assim evita”, concluiu.

Se o assédio continua, é sinal de que tem mulher que gosta? “Eu acredito que sim”, responde.

Bruno, administrador, que confessa já ter assediado quando era mais novo e diz que maturidade ensinou a não fazer mais isso. (Foto: Marcos Ermínio).
Bruno, administrador, que confessa já ter assediado quando era mais novo e diz que maturidade ensinou a não fazer mais isso. (Foto: Marcos Ermínio).
Militante e feminista, Gabriele trocou baladas heteros pelas LGBT's para não ser encoxada. (Foto: Marcos Ermínio).
Militante e feminista, Gabriele trocou baladas heteros pelas LGBT's para não ser encoxada. (Foto: Marcos Ermínio).

O namorado conta que apesar de ser tranquilo, enxerga isso como algo “complicado” na balada. E o que justifica a ação masculina é, na opinião dele, o desejo. “Todo homem tem desejo, eu não discordo do que eles fazem, estão procurando mulheres”, diz o estudante de Administração, Matheus de Oliveira Zen, de 20 anos.

O rapaz ainda afirma que vê muito homem fazendo isso e que ele mesmo já fez, só deixou de fazer, porque namora. “Meus amigos fazem, vejo outros também, eles tentam e às vezes conseguem. Se incomoda as mulheres? Acho que talvez seja um pouco desconfortável”, revela.

Administrador, Bruno Bezerra, de 25 anos, precisou pensar na família para evitar tais assédios. Na balada, o rapaz comenta que já presenciou puxão de braço e de cabelo. “Acho machista, não é assim que se aborda mulher. É conversando e não puxando. Não sei porque eles continuam. Quando eu era mais novo fazia sim, mas tem umas coisas que você vê e aprende com os erros”, afirma.

No caso dele, o aprendizado veio com a maturidade. “Porque não é assim que você trata sua irmã, sua mãe. Você aprende que tem que ter respeito com todo mundo”.

Na casa noturna, o Lado B descobriu entre as mulheres que o assédio é tão normal e que existem até estratégias para praticá-los dentro da casa. “Geralmente eles ficam na porta do banheiro, ali perto, que é a hora que a mulher está sozinha”, revelam as amigas Aline Pedrosa, de 21 anos e Aline Mayara, de 24.

 Maycon defende que balada é "promíscua" e que mulher que vai, estar sujeita a isso e sabe. (Foto: Marcos Ermínio).
Maycon defende que balada é "promíscua" e que mulher que vai, estar sujeita a isso e sabe. (Foto: Marcos Ermínio).

Mas o surreal mesmo está por vir. Há quem culpe, pode ser até inconscientemente, que o local em que a mulher está é um “sim” para o homem fazer o que quiser. “Não concordo, acho que tem que conhecer primeiramente e ter uma atitude que não seja tão agressiva. Mas as pessoas estão num ambiente promíscuo, porque a balada é um ambiente promíscuo. Se a mulher vem até aqui, não é certo o homem fazer isso, mas ela está disposta a receber esse tipo de tratamento”, avalia o analista de sistemas, Maycon Ricardo, de 24 anos.

No lado oposto da cidade, a balada alternativa revela outro viés da situação. De quem se envergonha pelos homens e da menina que preferiu ir para a noite LGBT para se sentir mais segura. “Eu acho que neste século que estamos vivendo, é um retrocesso muito grande o homem não respeitar a mulher na condição feminina. Se ela quiser, ela vai atrás, ela dá abertura. Mas a gente percebe que isso não acontece, que ela nem sempre tem a liberdade de dizer não. É como se estivesse ali dizendo sim sempre e isso é uma situação vergonhosa, machista, para o cenário masculino”, fala o professor universitário, Fábio dos Santos de 33 anos.

E o que falta então para mudar? “Falta os homens perceberem que a era das pedras já passou e que ele não é mais o centro da relação”, pontua.

Estudante de Jornalismo, militante e feminista, Gabriele Bitencourt, de 18 anos, trocou de balada para não ter de sofrer com os assédios masculinos, mas ainda acredita na revolução. Na visão da jovem, os homens, no geral, já saem de casa com a intenção de ficar com alguém e para isso, passam por cima das vontades das minas.

“Optei pelos rolês LGBT, onde eu posso curtir e dançar sem ter um cara hetero me encoxando. Eu tento evitar, porque é complicado”, conta. Se eles continuam com essa prática, não é sinal de que mulher gosta. Aliás, Gabriele defende a liberdade até neste ponto. “Se ela quer ficar com o cara, ela vai ficar, mas porque ela quis e a mulher tem o direito de ficar com quem quiser”.

Para os amigos homens, ela tenta a educação. “Quando um amigo está agindo como um babaca, eu falo: isso não está certo e eles repassam para outros amigos. Eu acredito na revolução e acredito que ela vai mudar essa questão”.

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Para Fábio, é uma vergonha que em 2016 o homem ainda se sinta tão superior a ponto de desrespeitar as mulheres. (Foto: Marcos Ermínio).
Para Fábio, é uma vergonha que em 2016 o homem ainda se sinta tão superior a ponto de desrespeitar as mulheres. (Foto: Marcos Ermínio).
Na balada, os homens têm até estratégia para apalpar mulheres: esperar na porta do banheiro. (Foto: Marcos Ermínio).
Na balada, os homens têm até estratégia para apalpar mulheres: esperar na porta do banheiro. (Foto: Marcos Ermínio).
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