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Comportamento

Cabelo tem de sobra no apoio contra câncer, mas falta dinheiro para fazer peruca

Paula Maciulevicius | 10/07/2014 06:44
Cabelo natural trouxe o sorriso que a assistente social tanto precisava nessa hora de luta. (Foto: Marcos Ermínio)
Cabelo natural trouxe o sorriso que a assistente social tanto precisava nessa hora de luta. (Foto: Marcos Ermínio)

Há dois meses, se olhar no espelho ganhou outro reflexo. Os olhos encontram a imagem de uma mulher com cabelos castanhos, cortados um pouco acima do ombro. Uma figura mais disposta a enfrentar a bateria de mais quatro meses de quimioterapia que lhe aguardam.

Aos 56 anos, a assistente social prefere não se identificar. Não pelo câncer, mas por questões familiares. Em maio, depois do diagnóstico dos médicos, de uma célula anormal na região cervical, ela viu o cabelo começar a cair assim que o calendário correu duas semanas a contar da primeira aplicação de quimioterapia.

“Um dia, deitada na minha cama, eu pedi que Deus falasse comigo. Vai cair meu cabelo? Eu não tinha certeza se ia e se fosse, eu orei pedindo que eu fosse preparada emocionalmente para não ser surpreendida”, conta.

A resposta veio em forma de imagem. A assistente viu diante de si um rosto com um cabelo curto e uma franjinha. Foi o que a avisou de que desta consequência ela não sairia impune.

Por  uma boa causa, quem corta e doa cabelo dá às mulheres a chance de fazer as pazes com espelho. (Fotos: Marcelo Calazans)
Por uma boa causa, quem corta e doa cabelo dá às mulheres a chance de fazer as pazes com espelho. (Fotos: Marcelo Calazans)

Até então, a paciente não sabia da possibilidade de conseguir uma peruca via Rede Feminina de Combate ao Câncer. “Minha irmã mais velha que me contou, fui atrás e me emprestaram, realmente, era igualzinha a que eu vi”, relaciona. A primeira foi usada por pouco tempo, era de cabelo sintético.

“Quando eu arrumei a de cabelo natural, ficou perfeita. Ninguém nem percebe, é bem da cor do cabelo que eu tinha”.

O tratamento contra o câncer não está explícito na testa dos pacientes, mas é denunciado, ainda que contra a vontade deles, pelas falhas no cabelo. Aí, não tem mais o que fazer a não ser cortar. “Olhei no espelho e cortei na altura da nuca o que sobrou. Eu mesma, com uma tesoura. O resto caiu sozinho”, descreve. O apego era tão grande as madeixas reais que ela guardou numa sacola.

Mas a lembrança hoje deu lugar à novidade. “Eu me senti outra pessoa. Acabou a tristeza, deu vontade de sair. O que eu diria hoje à essas pessoas que doam é que elas não têm a menor noção do bem que estão fazendo. Aquilo vai levantar o astral, como se ela, ou a gente, não fosse sentir mais essa fase difícil. É uma demonstração de amor sem medidas”.

Sem medidas e de pouca altura, Pietra de Mesquita Rapetti tem 7 anos e um coração gigante para ajudar. Há três semanas, depois de ver pela televisão os sorrisos que os cabelos cortados proporcionam aos pacientes em tratamento, ela resolveu abrir mão da cabeleira.

“Ela viu e ficou com isso na cabeça. Vou cortar e vou doar. Era para baixo da cintura”, descreve a mãe, Alessandra de Mesquita, de 34 anos. Até então, o xodó da menina era o comprimento das mechas. “De começo eu não acreditei, ela não gostava de cabelo curto, mas foi levando para frente a ideia”, completa.

Sem medidas e de pouca altura, Pietra, de 7 anos, cortou cabelo para fazer as pessoas felizes.
Sem medidas e de pouca altura, Pietra, de 7 anos, cortou cabelo para fazer as pessoas felizes.

A criança conta que as saudades que sente é de fazer trança no cabelo, mas nada que se compare ao que agora ela pensa. “Por que eu resolvi doar? Porque eu gosto de fazer criança feliz”, responde. No salão de beleza, Pietra chegou a recusar a oferta de vender. “Não, eu queria dar para o Hospital do Câncer”, explica.

Dito e feito. A doação chegou à Rede Feminina de Combate ao Câncer ainda na primeira quinzena de junho. As doações têm sido frequentes e são muito bem-vindas, no entanto, é preciso ir além do corte. Cada peruca custa em média R$ 450, verba que a organização não tem como custear.

A última remessa de cabelos pesou 3 quilos e foram transformadas em 30 perucas pelo cabeleireiro Pedro Filartiga. O dinheiro veio de um chá de joias realizado entre amigas, afirmou a presidente da Rede, Cleuza Vasconcellos.

“Temos um monte guardados, chega direto do Rio de Janeiro, de Dourados, de Sidrolândia, o Estado inteiro manda para nós”, conta.

Na Rede, que funciona numa sala dentro do Hospital do Câncer, as mechas são guardadas amarradas como um rabo em uma xuxinha, enroladas em saco plástico com todo cuidado para não deixar embaraçar.

“As pessoas podem ajudar, é só trazer o dinheiro aqui na Rede, falar o objetivo que a gente faz o recibo e quando tiver o dinheiro total, destina para a peruca”, explica Cleuza.

Das 30 perucas, quatro já estão em uso e provocando sorrisos em pacientes. Para retirar na Rede é preciso que as mulheres estejam em tratamento pelo SUS e sejam encaminhadas pelo hospital. Também é necessário um cadastro de documentos pessoais e comprovante de residência e depois do uso, fazer a devolução do cabelo para servir à outras mulheres.

A Rede de Combate ao Câncer funciona no próprio hospital, na rua Cândido Mariano, esquina com a Ernesto Geisel. O telefone de contato é o 3324-7676.

Cabelo precisa ser amarrado em rabo e separado
Cabelo precisa ser amarrado em rabo e separado
E para não embaraçar, embrulhado em sacola plástica.
E para não embaraçar, embrulhado em sacola plástica.
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