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Comportamento

Depois que Airo se foi, mãe vive distância maior que do Brasil a Argentina

Paula Maciulevicius | 23/05/2016 06:20
Ao centro, dona Maria com o filho Airo e o marido Nairo. Da foto, ficam as saudades. (Foto: Arquivo Pessoal)
Ao centro, dona Maria com o filho Airo e o marido Nairo. Da foto, ficam as saudades. (Foto: Arquivo Pessoal)

A distância do Brasil a Argentina é quase nada perto da saudade de dona Maria do filho que se foi. O passaporte dos sonhos para reencontrá-lo são os palcos, onde ela sobe sem titubear. Aos 57 anos, depois de enterrar o filho, o compositor Airo, e o marido Nairo, num intervalo de 19 dias, Maria Garcia Barcelos sabe o caminho para não deixar a tristeza se achegar: cantar. 

Ela sempre gostou de soltar a voz, o fazia por brincadeira, não por hobby e principalmente ao lado do filho Airo. "Cantei já também com a Patrícia e Adriana, mas só uma participação, por eu ser mãe dele. Gravaram e para mim, foi muito orgulho", conta dona Maria.

Por telefone, ela conta um pouco da vida e até cantarola. Nascida em Paranaíba, há duas décadas mora em Alcinópolis, onde trabalha como auxiliar de serviço agropecuário no Iagro.

Em casa, todo mundo cantava. Airo, dono do hit "Do Brasil a Argentina" e compositor de grandes canções do sertanejo, era o mais velho, seguido das irmãs Maíse e Vanessa.

Maria, ainda menina, aprendeu um pouquinho de violão, dos 13 para 14 anos, mas nunca se dedicou à música além da diversão. "Só por brincadeirinha mesmo e sempre sertanejo: Délio e Delinha", exemplifica. Aos 17 anos, se casou com Nairo, pai do trio e foi em casa, entre a família, que ela foi se abrindo cada vez mais para a cantoria. Nos churrasquinhos, era dona Maria a maior incentivadora do filho.

"Eu que mostrei as primeiras notinhas musicais para ele, aos 8 anos, comprei aquele método infantil de música. No final, ele já estava era ensinando", brinca. Quando cresceu, o menino pedia a companhia dela. "Mãe, tem que cantar comigo'. Direto era eu e ele. Participamos de festivais pequenininhos, em Figueirão, Costa Rica, a gente conquistava primeiro, segundo, terceiro lugar..." lembra.

A partir do momento em que Airo ganhou o mundo da música sertaneja, as viagens vieram de "brinde" e dona Maria ficou sozinha, cantava nos festivais e nas lanchonetes da cidade de Alcinópolis. O talento para compor, Airo não puxou da mãe. Nasceu com ele e as irmãs. A última música de Airo ficou para a irmã caçula, Vanessa, terminar.

Em 2010, Airo passou o último aniversário, dia 21 de dezembro em Campo Grande e completou 37 anos. Com um histórico de internações, ele deu entrada no Hospital Regional no dia 24 e às vésperas do Natal, morreu de falência múltipla de órgãos.

Airo e Ruan fizeram muito sucesso, ele compôs um dos maiores hits sertanejos: Do Brasil a Argentina.
Airo e Ruan fizeram muito sucesso, ele compôs um dos maiores hits sertanejos: Do Brasil a Argentina.

"Eu sempre tive aqueles cuidados de mãe. Mas não consegui não. Foram uns 10 anos tentando trabalhar a cabeça dele, para ver se ele dava uma mudada", recorda a mãe. "A última vez que vimos, ele estava sedado, entubado e nem viu nós mais... Estava já na UTI, não deu tempo de falar nada", completa. E 19 dias depois, voltando de Campo Grande para Alcinópolis, um acidente na BR-060, em Camapuã, matou Nairo, o marido de Maria, na hora.

No carro estava o casal, o advogado deles que tratava do inventário de Aiero e a sogra de Maria. "A gente estava a 60 por hora segundo a perícia. O carro bateu e jogos nós para fora da estrada. Ficamos tudo preso nas ferragens. O Nairo não viu, estava dormindo. Eu vi tudo, fui a que menos machuquei, mas vi tudo..."

A última vez que Maria cantou com o filho foi em setembro de 2010, no aniversário dela. "Cantamos juntos aqui numa festinha boa, com família e amigos. Ele estava meio fraco, mas cantou bem comido. Foi uma alegria danada", recorda. 

A música preferida dos dois era "Brigas". "Mas ele gostava que eu cantasse O Sol e a Lua, de Delio e Delinha. Mas a que mais me emociona e eu nem aprendi a letra toda, foi a última que ele fez, parece que sabia que ia embora..."

A mãe não termina a frase. Respira fundo como quem segura as lágrimas e volta à história que a letra passa: "falava assim, vou te esperar no céu, aqui na terra fiz meu papel... Era uma música muito pesada para mim cantar...", desabafa.

Das lembranças, ficaram os dois violões dele em casa, dois filhos que moram em Bataguassu, a preferência por almôndegas de almoço e a melancia, que sempre aberta faz a memória voltar ao filho. 

"E a música. Eu ouço Brasil e Argentina todos os dias. Não tem como eu esquecer".

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