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Comportamento

Ditadura fez Campo Grande ter medo de beber água, mas criou gente de coragem

Elverson Cardozo | 31/03/2014 11:50
Acervo sobre a história do Navio Fantasma, em Corumbá
Acervo sobre a história do Navio Fantasma, em Corumbá

A história da Ditadura Militar no Brasil teve capítulos violentos, mas também curiosos há 50 anos neste lado do País. No dia de lembrar do golpe de 64, tudo volta à tona. Além das recordações sobre tempos que ainda hoje causam polêmica, a data vale para lembrar que, um dia, as pessoas souberam usar o poder da mobilização popular a favor da democracia por aqui.

O militante do PCB (Partido Comunista Brasileiro) no Estado e presidente do Sindicato dos Trabalhadores e do Mobiliário na Capital, Ezequiel Ferreira Lima é uma dessas pessoas que deveriam inspirar Mato Grosso do Sul.

Ele fazia parte de um grupo formado por sindicalistas, intelectuais, empresários e profissionais liberais que, embora pequeno, tinha influência, possuíam um jornal que denunciava os desmandos dos militares, abria para opinião da sociedade civil e, por isso, era perseguido.

A coragem e consciência política para enfrentar um dos momentos mais tensos da história brasileira incomodavam, tanto é que Ezequiel, foi preso em 2 de abril de 1964, junto com outros líderes, nas dependências do sindicato que comandava.

A entidade foi ocupada pelo Ministério do Trabalho, que decretou intervenção. As reuniões, por outro lado, passaram a ser monitoradas por militares do exército. Os que foram presos, mas conseguiram provar que “não agiam contra a pátria”, foram libertados, mas eram obrigados a comparecer em reuniões para assistir palestras sobre "sindicalismo democrático”.

O relato acima é do historiador Eronildo Barbosa da Silva, responsável por um estudo sobre o golpe de 1964 no Sul de Mato Grosso.

“Ezequiel ficou, inicialmente, três meses presos em Campo Grande. Sua filha, Evanize Lima, conta que esse período foi muito difícil para sua família. Seu pai, mesmo quando livre, tinha dificuldade para arranjar trabalho, pois, naquela época, era muito forte a propaganda contra os comunistas. Todo mundo tinha medo de oferecer trabalho a alguém carimbado como comunista”, escreveu.

Corumbá também teve gente de honra. A história começa a resgatar o caso de um grupo de 40 militantes, políticos e religiosos. acusados de subversão, que acabaram presos e torturados em um navio da Marinha. Chegaram à Comissão Nacional da Verdade, criada para investigar a fundo o que ocorreu após o golpe, relatos de parentes de quem foi vítima do “navio fantasma” e de Waldemar Dias de Rosas, hoje com 80 anos, uma das vítimas do regime e, inclusive,. dono de um acervo fotográfico da época.

Nos arquivos dos "fichados", está o ex-governador Wilson Martins, o irmão Plínio, Armando Pereira Falcão, Harrison Figueiredo e tantos outros nomes, como o advogado Nelson Trad, um dos primeiros a ser preso, que teve de suportar um mês incomunicável porque era apontado como comunista. Mesmo assim, ele continuou como advogado dos presos políticos, apesar de não poder comparecer a muitas das audiências porque foi para a prisão por mais 5 vezes.

Na memória ficam também João Jovelino, Epaminondas Lemos, Arcelino Granja, Lafayete Câmara, Durvalino Barros, Aureo Medeiros, Rádio Maia...O médico Alberto Neder, por exemplo, foi preso como um nome perigoso, com direito a desfile pela Afonso Pena, algemado, dentro de um jipe do Exército.

Boatos – Como se não bastasse a prisões, em Campo Grande surgiam boatos que aumentavam a tensão. Eronildo relata que, em abril de 1964, por exemplo, começou a “fofoca” de que a água que abastecia a cidade estava envenenada e que os responsáveis pelo “ato terrorista” seriam os comunistas.

“Isso foi suficiente para quem uma parte da população iniciasse uma peregrinação rumo aos córregos e outros reservatórios para buscar água. Ninguém queria consumir a água fornecida pela prefeitura”. O comandante do exército teve ir à imprensa para desmentir o boato.

O professor também afirma que, na época, os militares achavam que os comunistas tinham depósitos de armas na Campo Grande e que compravam os materiais no Paraguai.

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