ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
ABRIL, QUINTA  18    CAMPO GRANDE 27º

Comportamento

Entre Bete e guavira, Almiro ficou com a fruta e fez da opção tempero e música

Paula Maciulevicius | 01/12/2016 06:05
Pesquisador, seu Almiro é um homem apaixonado por Bete e pela especiaria de guavira que ele mesmo criou. (Foto: Marcos Ermínio)
Pesquisador, seu Almiro é um homem apaixonado por Bete e pela especiaria de guavira que ele mesmo criou. (Foto: Marcos Ermínio)

"Adeus Bete, eu vou partir
Catar guavira para a vida melhorar
Com o dinheiro desta venda
Vou comprar uma fazenda que tem muitos guavirais"

A música conta a história de seu Almiro Kelm, que aos 70 anos, resolveu escrever sobre a escolha que lhe foi imposta: eu ou a guavira. A opção foi a fruta, mas no coração do produtor, cabem as duas e através da guavira, é que Almiro quer dar uma vida melhor para Bete. Pelo menos é o que a rima apresenta. 

Natural de Santo Ângelo, por mais que tenham-se passado quatro décadas em solo sul-mato-grossense, Almiro não perde o sotaque. Junto dos pais e dos irmãos, ele aterrizou primeiro em Porto Murtinho, para cultivar café quando o grão estava no auge. Logo as safras de 74 e 78 foram todas perdidas e a família migrou para a soja, sendo um dos primeiros produtores da região de Bonito

"Mas já rodei tanto: Itaporã, Bela Vista, Guia Lopes, Jardim... Hoje, me considero jardinense de coração", declara sobre a terra de residência. Figura ilustre no Cata Guavira, evento de gastronomia que reuniu chefs em torno da fruta no final de semana, foi em Bonito que seu Almiro contou e cantou sua história ao Lado B

Fruta foi sonho por duas vezes do senhorzinho, até virar feliz realidade. (Foto: Marcos Ermínio)
Fruta foi sonho por duas vezes do senhorzinho, até virar feliz realidade. (Foto: Marcos Ermínio)

Depois da separação da esposa - que ainda não era Bete - seu Almiro ficou com a fama de pamonheiro. A mulher que o ensinou a fazer pamonha e ele tomou por profissão. E é assim que é conhecido na cidade de Jardim. A guavira mesmo só vai aparecer nos anos 2000, depois de uma sequência de sonhos.

"A primeira vez que chupei guavira, naquele tempo chupava, hoje não chupo mais, eu tinha 27 anos. Não sabia das propriedades da casca", conta. A data ficou gravada, porque segundo seu Almiro, foi algo que veio para ficar em sua vida. 

Em 1998, um sonho à época de acampamento sem-terra, lhe mostrava um rapaz, de camisa xadrez, chapéu, calça preta e botina furada, que dizia ao sonhador que guavira daria o ano inteiro. "Oito meses depois, encontrei o rapaz em cima da ponte. Era igualzinho o sonho, do jeito que eu tinha sonhado, ele veio ao meu encontro e comecei a observar as guaviras no campo", lembra. 

Para onde os olhos corriam, encontravam guavira. No sonho, a informação era de que Almiro encontraria a fruta também fora da época de colheita - novembro e dezembro. E dito e feito. "Vi e comi guavira dia 20 setembro, em novembro, dezembro e janeiro e no mês de junho. Foi uma sequência", explica o que parece ter sentido somente a ele.

Quatro anos depois, outro sonho invade a mente de Almiro. Dessa vez, a vontade dele era de ir embora para Belém do Pará, até ser interrompido por um jardim florido, cheio de guaviras. "Uns meses depois, fui assistir a um programa de TV, Frutos do Cerrado e tudo o que passou na televisão, eu já tinha visto", descreve. A semelhança desperta emoções que brotam no rosto. Seu Almiro não se aguenta e chora.

Música é para dançar num xote, juntinho. (Foto: Marcos Ermínio)
Música é para dançar num xote, juntinho. (Foto: Marcos Ermínio)

Dali em diante, a curiosidade em torno da guavira só foi crescendo. "Ela é mil e uma utilidades", defende o senhorzinho. 

Em 2007, ao saber que um rapaz de Bonito estava a produzir a polpa da guavira, ele foi até lá ver com os próprios olhos. "O Delei que fazia isso, tirava a polpa e a casca estava seca. Percebi que aquilo era um produto diferente e em casa, fiz o primeiro processo: seca a casca e a semente e tritura. Então aquilo vira tempero", narra.

Por anos, seu Almiro diz que mostrou para professores e quem mais encontrou diante dele. O amargor ainda era muito característico. Foi então que em 2014, trouxe a "especiaria" ao Festival de Guavira e o apresentou à chef Letícia Krause, a criadora do Cata Guavira. "Quando ela ficou sabendo, apaixonada que é por guavira, ligou para mim e queria que eu a ensinasse", conta Almiro. 

Letícia quem viu as propriedades que a especiaria tinha, como substituição à noz moscada, uso no molho branco, frango e por aí vai. Seu Almiro defende o tempero até na pipoca e nas carnes. "Tem um ano e cinco meses mais ou menos que temos a especiaria e condimento de guavira", apresenta todo orgulhoso.

"Se sou apaixonado? Sou pesquisador de guavira, criador da especiaria e compositor da música", completa. Ao lado do amigo Valdelírio Galvão, "Catando guavira" foi feita depois que Bete pôs fim à relação, no ano passado. 

"Nós terminamos e isso aqui foi a primeira coisa que escrevi para ela. É letra do meu amigo. Um sonho, que virou especiaria e música, porque a minha namorada me abandonou. A Bete, de Mundo Novo", resume. 

A história foi a seguinte: Bete, segundo Almiro, não gostou de Bonito. Os dois se conheceram no festival da terceira idade, em Bonito. "Eu fui lá, ela veio aqui e nós íamos fazer essa especiaria na fazenda da Letícia, em Aquidauana. Ela ficou toda empolgada de ir pra lá, só que deu muita pouca guavira e nós íamos fazer aqui", narra.

Bete não gostou da água de Bonito, foi a justificativa para o término. "Vim aqui começo de novembro, a gente trocava mensagem todo dia, daí uma semana antes do Festival da Guavira, ela disse: pode ficar com as suas guaviras, que eu não gosto da água daí e terminei com você".

E se história de amor e música não convencerem, as propriedades da guavira servem de argumento. (Foto: Marcos Ermínio)
E se história de amor e música não convencerem, as propriedades da guavira servem de argumento. (Foto: Marcos Ermínio)

A música foi feita e apresentada para amigos, que disseram ao seu Almiro que faltava início, meio e fim. "Aí quando a Letícia fez o frango com especiaria de guavira, juntei: "a especiaria de guavira para preparar essa delícia", continua a rima.

E é cantarolando que ele mostra o condimento, com o marketing na ponta da língua. Se o produto não convence pela história de amor que não teve final feliz, vai pelas propriedades da guavira. "Isso você pode usar como chá. É uma colherzinha para uma xícara de café e adoça com açúcar mascavo, porque outro não casa bem", ressalta. 

E os benefícios? Xii... Se depender da lista de seu Almiro, ele vai falar até amanhã. "Vou resumir: elimina gordura e é bom para diabetes". O gosto apimentado que o tempero tem vem do processo: casca e semente de guavira hidratada moída na mão e pronto. 

Bete ainda não voltou para Almiro. Nem com a música dizendo que a fazenda é para os dois juntos morarem. A letra é num ritmo de chamamé, para dançar em baile de guavira. 

"Adeus Bete, eu vou partir
Catar guavira para a vida melhorar
Com o dinheiro desta venda vou comprar
uma fazenda que tem muitos guavirais

Vou construir no meio do guaviral
um lindo rancho para nós juntos morar
e no dia do casamento
Vai ter frango caipira preparado por Letícia
com condimento e especiaria de guavira
que é especial para preparar essa delícia

Vai ter festa a noite inteira
os convidados vão degustar
Bebida de guavira bem gelada
Dançar o xote até o dia clarear"

Curta o Lado B no Facebook.

"Adeus Bete, eu vou partir... Catar guavira para a vida melhorar..." Letra da música "Catando guavira". (Foto: Marcos Ermínio)
"Adeus Bete, eu vou partir... Catar guavira para a vida melhorar..." Letra da música "Catando guavira". (Foto: Marcos Ermínio)
Nos siga no Google Notícias