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Comportamento

O mundo é pequeno para quem se dispõe a sair um pouco de si mesmo

Andrea Brunetto | 08/06/2014 07:56
Todos os países ao alcance e com possibilidades de bons encontros.
Todos os países ao alcance e com possibilidades de bons encontros.

Conto para vocês três coincidências, casualidades da vida, que me permitiram encontrar em outros cantos do mundo, pessoas que estavam próximas ou que me contaram sobre próximos. O que me prova que o mundo é pequeno e que as coincidências nos acompanham sempre.

O primeiro acaso aconteceu onze anos atrás; estava do outro lado do mundo, em uma terra permeada pelo Pacífico e comecei, no elevador, uma conversa com uma mulher porque ela tinha uma camiseta com o símbolo da campanha do câncer de mama. Brasileira? E com ela tive notícias de uma pessoa que eu não via há dez anos, pois tinha se mudado de Campo Grande. Precisei ir a outro lado do mundo para saber sobre alguém que durante um tempo foi o meu mundo, sobre o que ele fez de sua vida depois que não mais compartilhávamos a mesma cidade, os mesmos sonhos.

A segunda coincidência aconteceu no início do ano de 2010, na primeira hora do ano novo, de madrugada, congelando de frio, com amigas. Sem condições de voltar para o bairro onde estávamos hospedadas, a não ser caminhando, pois todo o sistema de transporte da cidade pifou; aproximou-se um casal em função do idioma. Conversamos. Ele disse que eram de Naviraí, ia explicar onde fica a cidade, mas interrompi: não precisa, sou de Campo Grande. E conversando um pouco mais, fico sabendo que um deles tinha pensado em me ligar um tempo antes, pois tinha sido indicado para fazer análise comigo. Na noite gelada de Paris, conheço os naviraienses que não conheci aqui.

E a terceira coincidência aconteceu dois anos atrás. Conversava com uma senhora sentada ao meu lado no avião, eu chegara de Ushuaia para pegar esse voo em que estava, em Rio Grande, e ir a Buenos Aires, porque a companhia aérea fez overbooking e colocou-me para ir com um ônibus caindo aos pedaços por cento e cinquenta quilômetros da Cordilheira dos Andes.

Não sei se foi por isso, ou pela conversa sobre literatura que tivemos – não lembro qual livro estava lendo – fiquei emocionada; embargou a voz. Ela terminou de ler seu livro, era um romance que se passava na Patagônia e me deu de presente. Despedimo-nos na chegada. Adeus, adeus, tudo de bom. E no dia seguinte pela manhã, andando pelo hotel em que estou hospedada, a encontro na recepção. É proprietária do hotel. Coincidência.

Todos esses exemplos são para mostrar que o mundo é muito pequeno, que não sabemos quem encontraremos amanhã, quem conheceremos amanhã. Se uma pessoa desse canto do mundo, do outro. E o mundo digital está aí para aproximar ou distanciar mais ainda as pessoas. Pode acontecer uma ou outra coisa.

A língua é uma barreira para nos aproximarmos? Pode ser uma grande dificuldade, então não nos custa aprender um pouco a língua do outro, a língua do país para onde vamos viajar. Ser for mais fácil, pelo menos o inglês, que permite a comunicação. Mas a verdadeira comunicação é querer conversar com o próximo, o vizinho. O que está no elevador, na rua, ao lado da poltrona do avião.

Tive a ideia para escrever, sobre esse tema, pois hoje pela manhã fui tomar café da manhã com meus amigos Eliane e Philip. Eles se conheceram alguns anos atrás por um site. Ela em Campo Grande, ele no Colorado, nos Estados Unidos. Meses depois ele veio, ela foi. E entre muitas viagens depois, um ano depois, casaram-se. Eliane já falava inglês, ele aprende português agora. Um site aproximou duas pessoas, dois lugares do mundo tão distantes. E agora eles vivem a vida em comum, aqui, duas quadras da minha casa, minha velha amiga e seu marido americano, também vivendo na vizinhança da Lagoa do Itatiaia.

O mundo é muito pequeno. Mas só o é para aquele que se dispor a sair de sua casa, de sua língua – e ser um tanto plurilinguístico – de seu território, de suas convicções, de sua cultura, para conviver com o outro, o estrangeiro, o distante, o diferente de si mesmo. E aprender com ele. Como diz o escritor William Blake: o ato mais sublime é colocar o outro diante de si.

Também escrevo este texto à proximidade da Copa do Mundo, em que o mundo pode ficar menor ainda, em que todos os países podem caber em um só, aqui, no Brasil.

*Andrea Brunetto é psicanalista, escritora e colaboradora querida do Lado B

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