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Comportamento

O que explicar ao padre sobre a placa: "Eu dou o que ela quer, mas não é mole"

Lenilde Ramos | 30/11/2014 07:34
O que explicar ao padre sobre a placa:  "Eu dou o que ela quer, mas não é mole"

Nessa longa estrada da vida aprendi um tanto com personagens maravilhosos. Um deles foi um alemão que queria ser padre quando estourou a Segunda Guerra mundial. Teve que virar soldado e lutar na Rússia. Foi punk, mas saiu vivo com o pescoço furado de bala. Ordenou-se franciscano e veio parar em Campo Grande como missionário, mais precisamente na Paróquia de São Francisco.

Foi ouvindo histórias na região do "Vai ou Racha" que Frei Hermann soube que havia um leprosário nos arredores da cidade. Trabalhou sozinho entre os hansenianos até a chegada de Ir. Silvia Vecellio e seus bravos voluntários e continuou com eles. Conheci Frei Hermann em 1969: magro, veste marrom, cordão na cintura e sandálias, igual a uma pintura de Giotto. Enfrentou de moto o areão e os buracos da saída de Cuiabá até conseguir um carro, muitos anos depois.

Toquei nas missas dele, no São Julião, por 25 anos seguidos, todo domingo de manhã. Ele ficava intrigado porque eu nunca me confessava e, ao perguntar sobre minha formação religiosa, quase desmaiou ao saber que eu havia estudado em colégio católico, frequentado terreiros de umbanda com meu pai, templos evangélicos com minha mãe e agora andava com o povo que queria ver disco voador. Ele ia celebrar meu casamento e me intimou para uma confissão.

Só que começou perguntando: "A senhorra está em estado de grrraça?" Claro que eu sentia que estava e respondi com a maior sinceridade. Ele repetiu a pergunta e eu confirmei: "Sim, estou em estado de graça". Se tivesse perguntado "quais são os seus pecados?" eu teria desfiado a lista, se ele ficasse vivo até o final, mas diante da minha resposta, pensou um pouco e me despachou, sem dar penitência. Tudo bem.

Casei, continuamos amigos e continuei a pegar carona com ele no estradão da saída de Cuiabá, para as missas de domingo. Um belo dia, ao ver um caminhão à nossa frente ele me pergunta: "A senhorra poderria me explicarr o que querr dizerr essa placa?". Olhei a traseira do caminhão e li: "Eu dou o que ela quer mas não é mole". Ai Jisuis... dei uma engasgada e os seminaristas no banco de trás ensaiaram uma risadinha marota, tipo: "sai dessa..".

Apelei pro meu jogo de cintura e disse: "Frei Hermann, isso demonstra o quanto o homem se sacrifica pela mulher, fazendo o possível para ser um bom companheiro. Mas não é mole..." Frei Hermann deu-se por satisfeito, calei a boca dos seminaristas espertinhos e fomos felizes para mais uma missa dominical. Saudades do Frei Hermann! 

*Lenilde Ramos é sanfoneira, jornalista e conta suas histórias aqui no Lado B

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