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Comportamento

Por amor, Armando leva café na cama de Iza todo dia desde que casou, há 54 anos

Um amor que te leve café todas as manhãs: Seu Armando faz isso para dona Luiza desde 1962.

Paula Maciulevicius | 26/05/2017 06:05
"Por que eu faço? Porque a dona Iza merece", diz marido apaixonado. (Foto: Marina Pacheco)
"Por que eu faço? Porque a dona Iza merece", diz marido apaixonado. (Foto: Marina Pacheco)

De calça social, camisa e sapato, todo engomadinho, antes do relógio marcar 6h, seu Armando já está pronto para a mesma tarefa que realiza todas as manhãs desde que se casou com Luiza, 54 anos atrás. Não tem dia que ele não faça o café e leve até a cama para a "pitchutchuca".

"Por que eu faço? Porque a dona Iza merece", diz todo orgulhoso. Armando Araújo tem 82 anos, já anda a passos mais lentos, no entanto, não permite que ninguém leve o café por ele. "Eu sempre acordei primeiro, é costume, desde a fazenda", explica.

Ele e Luiza se conheceram na década de 60, em Barretos, no Estado de São Paulo. "Como eu conheci a dona Luiza?" repete a pergunta em voz alta como quem tenta puxar da memória aqueles passeios que fazia pela praça.

Os olhinhos brilham transcendendo o amor que Armando carrega no peito. (Foto: Marina Pacheco)
Os olhinhos brilham transcendendo o amor que Armando carrega no peito. (Foto: Marina Pacheco)

"A gente no interior fazia o footing: homens ficavam aqui e as mulheres andando para lá e para cá. Eram sempre quatro ou cinco amigas e a gente ficava mexendo com as meninas", descreve Armando.

Aquele Armando da juventude simpatizava era com a amiga de Luiza. "Um belo dia, no baile, eu tirei Luiza para dançar e perguntei: 'aquela sua colega, como ela se chama?' Ela me perguntou por que eu queria saber... Eu falei 'é bonitinha'. Ela concordou comigo e eu respondi: 'mas não é tão bonitinha quanto você não'. Daí começou...", narra.

Dos encontros ingênuos na praça da cidade ou na pista dos bailes, Armando diz que teve a certeza de que "era Luiza" quando a viu brava pela primeira vez. "Nós estávamos no Jockey Club e ela me chamou para ir à casa dela conhecer a mãe. Falei que não ia não e ela mostrou quem era a mãe. Olhei e tinha uma velhinha cochilando. Perguntei: 'é aquela ali que está dormindo?' Ela ficou brava comigo porque eu ri da mãe dela dormir no baile", recorda.

Os olhinhos brilham transcendendo o amor que Armando carrega no peito. A expressão até muda e um sorriso ilumina o rosto do senhorzinho ao lembrar de quando encontrou o amor e Luiza.

Foram dois anos de namoro até que no dia 8 de dezembro de 1962 eles se casaram. "Logo que nos casamos eu arrendava uma chácara e todo dia ia tirar leite. Aí já coava o café para mim e aproveitava e levava para ela. Aí ficou... Ela se acostumou e eu também", conta.

Armando e Luiza, casal que teve a sorte de encontrar amor um no outro 54 anos atrás e até hoje. (Foto: Marina Pacheco)
Armando e Luiza, casal que teve a sorte de encontrar amor um no outro 54 anos atrás e até hoje. (Foto: Marina Pacheco)

Seu Armando pergunta se vamos acompanhar o café chegar até a cama e, todo cuidadoso, pede para que a gente não tire fotos de Luiza ao acordar. "Porque ela é vaidosa, vai estar de pijama e sem maquiagem", justifica.

Com carinho, cada fruta é colocada num pratinho. Na outra mão, vai um sanduíche de queijo e presunto. "Eu sempre fiz desde que casei. Quando vieram os filhos? Aí que eu fiz mais mesmo, porque ela tinha as crianças para zelar. Eu era bom em trocar fraldas, viu?", brinca.

Seu Armando e dona Luiza têm um casal de filhos e cinco netos. "E cada rapagão bonito... Meu DNA não é mole não", anuncia. Sobre só começar o dia depois de fazer o café de Luiza, seu Armando não vê o hábito com os mesmos olhos de quem está fora do enredo e simplifica o gesto assim como o amor deve ser. "Nós sempre tivemos uma vida normal e respeitando um ao outro. Só sou carinhoso com ela, disso, não tenha a menor dúvida", diz.

O café da manhã já não é surpresa, mas, a cada viagem de Luiza, a recepção na volta é feita com orquídeas. "Uma vez eu até exagerei e enchi o jardim dela. O que eu sei que a faz feliz? Agradá-la", explica.

Uma das fotos da casa é a do dia 8 de dezembro de 1962, a data que marcou o início de todos os cafés da manhã ao longo destes 54 anos. (Foto: Marina Pacheco)
Uma das fotos da casa é a do dia 8 de dezembro de 1962, a data que marcou o início de todos os cafés da manhã ao longo destes 54 anos. (Foto: Marina Pacheco)

O casal mora em Mato Grosso do Sul desde o final dos anos 80 e ocupa um apartamento na Avenida Afonso Pena. Desde a porta de entrada, já há flores e plantas que mostram o cuidado que Luiza tem com a casa.

A gente acompanha as batidinhas na porta e o assovio. É assim que ele a acorda todas as manhãs. "Eu costumo falar que ela é a minha "pitchutchuca". O que ela é para mim? Tudo. A gente vive tão bem que só falta adivinhar o que ela quer", sente.

O apelido não tem muito tempo não. Veio de uma novela que o casal assistia na fazenda. "O velhinho chamava a velhinha de "pitchutchuca", aí ficou assim. Se me perguntar que novela é essa eu não sei, mas que era uma gracinha, era".

Luiza aguarda o cafezinho deitada. "Ela é boa de dormir", entrega o marido. Junto com o café, Armando dá a notícia: 'você tem visitas...' E diz que na sala jornalistas a esperam. A reação dos dois é ouvida do quarto. Luiza dá uma risada gostosa acompanhada da gargalhada de Armando. Cumplicidade até no riso.

"E o que traz vocês aqui?" pergunta a doce Luiza. Ao saber que era para confirmar algumas das coisas que o marido já havia narrado, ela abre um sorriso de novo. "Sim, sim, o Armando sempre foi muito gentil comigo. Eu tive sorte de encontrá-lo". "Não, na verdade eu que a encontrei", corrige seu Armando.

De fato, Luiza ficou brava naquele dia do baile, lá em 1960. "É que o baile era afastado da cidade e a minha mãe não deixava a gente ir sozinha com os amigos. Então ela ia junto", completa sobre a soneca da mãe.

Se existe um segredo para um amor de 54 anos? A resposta dela é a mesma que a dele anteriormente: respeito.

Pela casa, ao lado dos retratos da família, ficam quadros pintados por Luiza. "Ela era uma grande pintora", elogia Armando. Depois da enfisema pulmonar, os médicos suspenderam o contato dela com as tintas.

"E sabe que tem um nu artístico que ela fez? Este é um fato interessante. Um amigo meu se apaixonou pelo quadro e comprou. Um belo dia, depois de muitos anos, ela me perguntou onde estava o quadro, porque queria vê-lo. Eu fui atrás. 'Miguel, você ainda tem aquele quadro? Tem? Então você vai ter que me vender e eu comprei o quadro de volta", relata.

Uma das fotos da casa é a do dia 8 de dezembro de 1962, a data que marcou o início de todos os cafés da manhã ao longo destes 54 anos.

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