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Comportamento

Promessa feita desde a 1ª carta, Leonildo e Cida não se separaram nem na morte

Paula Maciulevicius | 05/08/2016 06:27
"Nunca há de separar". Foi assim que Leonildo assinou todas as cartas e bilhetes trocados durate 56 anos.  (Foto: Alcides Neto)
"Nunca há de separar". Foi assim que Leonildo assinou todas as cartas e bilhetes trocados durate 56 anos. (Foto: Alcides Neto)

Desde a primeira carta, Leonildo prometeu à Cida que eles nunca haveriam de se separar. E foi o que se cumpriu. Os dois morreram com 4 horas de diferença. Ele primeiro, no carro, depois de um acidente. Ela chegou a ser socorrida, mas não resistiu e morreu na Santa Casa. O amor dos dois, que emociona à família Toneti, ficou registrado no que um escrevia ao outro.

Leonildo soube que Aparecida era a mulher de sua vida no primeiro instante em que a viu, em 1957, e fez a promessa eterna na primeira carta endereçada à ela, quando os dois completavam 15 dias de namoro: "Nunca há de separar". Foi assim que ele assinou todas as cartas e bilhetes trocados durate 56 anos. 

As lembranças estão reunidas na pasta da filha, professora Marli Toneti, hoje com 54 anos. Ela quem soube das cartas primeiro que os irmãos, duas décadas atrás, e se recorda como se fosse hoje da última vez em que ouviu os detalhes delas, vindo dos pais. 

"Uns dois meses antes deles falecerem, a gente estava sentado na sala e eu falei: 'Pai, nem acredita, esses dias eu vi umas cartas, mas o senhor era apaixonado!' E ele me respondeu: 'Mas também, foi lindo. Sua mãe estava andando com outras moças na praça, eu bati o olho e falei é essa caboclinha que vai ser a minha esposa'. E foi mesmo", recorda a filha.

Casamento dos dois foi em fevereiro de 1958. (Foto: Arquivo Pessoal)
Casamento dos dois foi em fevereiro de 1958. (Foto: Arquivo Pessoal)

Pioneiros, 17 de outubro de 1957.

Alô querida Aparecida Chaves,

Escrevo-lhe esta pequena cartinha explicando meu viver e procurando saber suas notícias... Viajo sábado e só volto na sexta... Já com 15 dias que estamos namorando, não troquei uma palavra de amor com você, mas mesmo assim, creio que você tem amor por mim. Sou franco e te digo a verdade: sou loucamente apaixonado por você e acredito que sem você, não sou ninguém. Apesar que ainda não sei se você tem amor em mim, mas eu faço tudo para você e só peço que você nunca pense em me deixar, porque dois corações que se amam de verdade, nunca podem separar. Vivo completamente desesperado por você e essa mágoa só poderá sair do meu peito o dia que você tiver compaixão por mim e me prender em seus braços... E aqui termina com muitas saudades de você, queira aceitar um forte abraço e um prolongado beijo do seu querido, que nunca há de separar.

Os dois moravam em Pioneiros, era assim que se chamava, antes de ser cidade, o município de Sud Mennucci, no interior de São Paulo. "E ele se apaixonou nela ali, na primeira vez que a viu. Como ele sempre viajava a negócios, passou uns dias e encontrou ela novamente, a pediu em namoro", explica a filha.

Leonildo tinha 21, Aparecida, 14. Ele esperou a namorada completar 16 para então se casarem e quando ela chegou aos 20 já tinha os quatro filhos nascidos. "Pelo que ele se apaixonou por ela? Ele falava que ela era a caboclinha mais linda que ele já tinha conhecido e o amor deles era muito lindo mesmo", comenta Marli.

Seu Leonildo foi pecuarista e veio ao Estado para administrar fazenda. A ideia era que depois de formar tudo, eles voltassem para São Paulo. A vida da família era de classe média alta e aqui perdeu tudo. Empréstimos, juros altos e mudanças de moeda fizeram os Toneti perderem as posses, mas nunca os sentimentos. "Pela minha mãe, que com joelho na fé, conseguimos superar tudo isso. Ela sempre falava que eles ainda iam ter o cantinho deles e tiveram", conta Marli. 

Falar do amor que sentia por Cida era motivo de orgulho a seu Leonildo. "Eu sempre fui apaixonado pela sua mãe. Ele tinha o prazer de dizer isso, que amava ela e a gente sentia", afirma a filha.

Dois anos antes do acidente que levou os dois, dona Aparecida ficou muito doente e os médicos foram claros em dizer que ela não sobreviveria. 

Filha Marli relê a primeira carta, de 17 de outubro de 1957.(Foto: Alcides Neto)
Filha Marli relê a primeira carta, de 17 de outubro de 1957.(Foto: Alcides Neto)

"Ele abraçou meu irmão caçula e disse: 'Eu não vou conseguir viver sem tua mãe. Ela não pode morrer'", recorda a professora. Um ano depois, foi a vez do seu Leonildo cair e ela falar a mesma coisa. O casal, carinhoso, nunca bateu nos filhos e também nunca dormiu brigado, ensinou o amor maior no dia a dia, nas pequenas coisas, na simplicidade de ser feliz. 

"Acho que ele nem deu tempo para a minha mãe pensar. Era um amor profundo a paixão que ele sentia por ela e ele dizia para todo mundo. Eu falo que são uma lição do amor para a gente", diz a filha.

No dia 4 de agosto do ano passado, o casal sofreu um acidente ao voltar de Campo Grande para o sítio que havia conquistado, em Dois Irmãos do Buriti. "A gente não tem muita noção como foi, eles saíram daqui 3 horas da tarde e a gente só ficou sabendo quando o amigo do meu irmão ligou dizendo do acidente e que a minha mãe estava vindo para Campo Grande", lembra Marli.

O acidente foi no Km 416 da BR-262, na região de Terenos, distante 25 quilômetros de Campo Grande. Seu Leonildo perdeu o controle do veículo depois de uma curva, caiu em uma ribanceira e chocou-se contra uma árvore. Ele se foi na hora, ela viu tudo consciente. 

"A gente acha que ele infartou. Minha mãe pedia, falava que queria ir embora com meu pai, que Deus viesse buscar ela. Ela tinha visto ele morto e morreu 4 horas depois. Acho que o único consolo para mim, meus irmãos, os netos e as noras é que foram os dois juntos. Eles não se separaram nem na hora da morte. Ele falava que não saberia como viver sem ela", conclui a filha. 

Seu Leonildo e dona Aparecida nos 40 anos de casados. (Foto: Arquivo Pessoal)
Seu Leonildo e dona Aparecida nos 40 anos de casados. (Foto: Arquivo Pessoal)
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