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Comportamento

Sobre uma separação, um reencontro e uma saudade desesperada

Andrea Brunetto | 10/08/2014 07:43
Sobre uma separação, um reencontro e uma saudade desesperada

Ela estava correndo, pensando nas três coisas que teria de fazer antes de voltar ao trabalho, girou a porta do banco rápido, para sair, encontrou-o inesperadamente, desprevenida como sempre soube que estaria no dia que o encontrasse pelas ruas, nos acasos da vida. A primeira coisa que pensou foi: logo hoje que estou de calça jeans desbotada, blusa bege e sem batom? Nem sabe como fez tão rapidamente um check up de sua própria aparência, naquela hora em que, desprevenida, todas as palavras sumiram.

Só conseguiu perguntar ‘como vai você?’. Ele respondeu ‘Graças a Deus, estou bem’, quando ela queria ter ouvido ‘ainda te amo’. Ele devolveu a pergunta e em vez dela responder ‘eu vivo saudade desesperadora’, contou a ele uma vitória profissional que tinha acabado de alcançar. Ele: que bom, isso é muito sucesso e felicidade para você. Essa cortesia distante, ainda que verdadeira, a pegou desprevenida. Não tinha o que dizer, ficou calada, quieta, sentindo o perfume dele, olhando para seu rosto, o furinho no queixo.

O mesmo perfume, o de sempre, que ele usava há décadas, Paco Rabanne, não essas novas fragrâncias, o antigo, o tradicional. Assim ele tinha descrito o perfume que usava, na primeira vez em que se beijaram, em que ela ficou inebriada pelo perfume tradicional, pelo homem tradicional.

Já tinha tido outros namorados antes, mas nenhum como ele. Quando chegou perto dela na primeira vez, sentiu o perfume, o olhar dele, os lábios marcantes, o jeito determinado – que depois se evaporou. Amou-o de imediato, desejou-o desprevenidamente.

Não importava a ela que ele escrevesse errado. Lembra-se disso somente porque ele perguntou se não a incomodava. Talvez o incomodasse, mas a ela não. Achava-o com tantas qualidades, um homem simples que não se escondia atrás dos objetos de consumo do mundo moderno, dos sucessos profissionais nesse mundo de altas eficiências e sentimentos deficientes. Aliás, ela agora é que falava de sucesso profissional para “puxar assunto”, a cobrir o turbilhão em que estava.

Não era um homem especialmente bonito, mas tinha autenticidade, certo senso de humor sério, que ele não sabia ser humor, e a fazia rir. Os dois juntos faziam uma energia boa. De todos os homens que conhecera antes, nenhum esteve sequer próximo de tudo o que ela viu nele. E isso sem falar do desejo ardente, da atração desmedida que, desprevenidamente, sentiu por ele. E que outrora acreditara recíproca.

Ano passado, quando viajou, sentiu o perfume tradicional dele chegar até seu nariz, em muitos homens dos quais passou perto, em aeroportos e cidades do mundo. Já fazia meses em que não se viam, e quando voltou, mandou um recado para ele pelo celular: adoro-te, te quero, não posso ficar tanto tempo sem você. Ele não respondeu nada, o que é já uma resposta. Mas só agora, desprevenidamente, ela entende isso. Entende que na primavera do ano passado, quando virou as costas para ela, já era o fim, já não a queria, já tinha feito sua escolha.

E ela ficou lá, sozinha, desprevenida.

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