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Comportamento

Sonho de criança, ele saiu do Canadá e está perto de completar 2 anos de viagem

Elverson Cardozo | 25/06/2014 16:57
Filipe está realizando um sonho de infância, mas também quer mostrar que existem boas pessoas no mundo. (Foto: Elverson Cardozo)
Filipe está realizando um sonho de infância, mas também quer mostrar que existem boas pessoas no mundo. (Foto: Elverson Cardozo)

A viagem do jornalista paulistano Filipe Leite, de 27 anos, que ficou conhecido como o “Cavaleiro das Américas”, já dura quase dois anos. Em 2012, depois de concluir a graduação no Canadá, ele resolveu sair pelo mundo cavalgando. O destino? Interior de São Paulo. Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos.

O final da jornada está próximo. Felipe chegou em Campo Grande nesta quarta-feira (25), depois de passar por Miranda, Aquidauana e Corumbá. Só entrou em Mato Grosso do Sul, depois de uma quarentena na Bolívia. “Foi horrível. Só comi polo (frango). Aquela sopa que, conforme vai baixando a água, você começa a ver o pé do frango. Parece que eles tentam fazer uma comida ruim”, relata.

O período sacrificante no país vizinho foi necessário. Uma exigência do Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). “Para você entrar com animais no Brasil é bem complicado. Eles tiveram que se assegurar de que meus cavalos não estavam trazendo nenhum vírus. Fizeram exames de sangue, mandaram para Belém do Pará, São Paulo. Tive que esperar”.

Com tudo certo, o cowboy pôde, enfim, seguir viagem na companhia de Dude, Bruiser e French, cavalos que o acompanham desde o início. São mais de 14 mil quilômetros percorridos até agora. Até Barretos serão pelo menos 16 mil.

“Antes de eu sair os amigos me chamavam de louco, mas eu quero mostrar para os jovens que, se você tem um sonho, tem que correr atrás. Não somos robôs. Temos que parar com essa coisa de tudo certinho, de terminar colegial, ir para faculdade, arranjar um trabalho e ficar nele até morrer. Você tem que sonhar, viver, correr riscos”, ensina.

Cavaleiro das Américas na companhia de Dude, Bruiser e French. (Foto: Elverson Cardozo)
Cavaleiro das Américas na companhia de Dude, Bruiser e French. (Foto: Elverson Cardozo)

No caso do jornalista, a “loucura”, é um sonho de infância que ele sempre quis viver. “Quando eu era pequenininho meu pai me contava a história de um suíço que cavalgou de Buenos Aires até Nova Iorque, em 1925, com dois cavalos crioulos. O cara viajou por todas as américas e escreveu um livro relatando tudo o que viu. Não sei o porquê, mas essa história me impactou muito”, conta.

Impactou tanto que ele resolveu fazer a mesma coisa e, inclusive, registrar tudo. “Estou gravando um documentário e vou escrever um livro também”, diz. Do Canadá até Mato Grosso do Sul, o jornalista já passou por 9 países das três américas.

Histórias - A trajetória é cansativa, mas as experiências compensam. Alguns momentos estão guardados na memória, como o dia em que ele cruzou com um urso gigante. “Os cavalos ficaram nervosos. Tive que descer. Fiquei meia hora tremendo”.

No Colorado, um rapaz pediu ao cavaleiro que levasse as cinzas da irmã na viagem. “A Naomi. Levo comigo até hoje”, afirma. No Novo México, teve a benção de uma tribo indígena. “Me deram uma pluma para proteger os animais e rezaram por eles".

A travessia pelo maior deserto das américas, o chihuahua, também foi marcante. “Os cartéis do México passando todos armados. Uma loucura. A primeira parte a gente andou oito dias, no meio do nada, até chegar em uma cidade que se chama Camargo”. A recepção, com festa e tequila, surpreendeu.

Mas, em alguns casos, o medo bateu. “Na Guatemala, encontrei dois corpos. Um deles era de um cara que tinha roubado uma galinha e um galo. Mataram ele com sete tiros nas costas. Em Honduras, outro lugar que fiquei, vi um marido tentando matar a mulher. Foi a primeira vez que senti o poder de uma arma. A mulher gritava pela vida enquanto o marido atirada”.

Por outro lado, a viagem também provou que, por trás de uma figura amedrontadora, existe um ser humano. “No México eu fiquei na casa de um traficante. Eles me puseram para dentro do país. Jantei com a família dele e vi que são pessoas iguais a gente, mas não tiveram oportunidade. Não foram para escola porque não tinham dinheiro. Começaram levando cocaína para a montanha, de burro, cresceram e hoje são donos do monte”.

Mas não dá para ser inocente. “Sabia que teria de jogar com eles, porque eles controlam tudo lá, tanto é que se eles não gostarem da sua cara, te matam”, explica. Tirando os “perrengues”, Filipe afirma, com segurança, que nesses dois anos não tem muitas histórias negativas para contar.

Animais foram doados nos Estados Unidos. (Foto: Elverson Cardozo)
Animais foram doados nos Estados Unidos. (Foto: Elverson Cardozo)

“Conto muito com a solidariedade das pessoas. Eu, como jornalista, percebei, muito cedo, que a gente fala mais do lado negativo. Você assiste jornal e não quer sair de casa e eu queria mostrar o outro lado. Acho que 99% das pessoas são boas. Tô fazendo o documentário para mostrar que pelas américas tem gente muito boa”, resume.

Tão boa, prossegue, que acolhe, dá o que beber, comer e, no final, vira amigo. Filipe já dormiu em posto de gasolina, debaixo de ponte, em rancho, mas também já foi posto dentro de casa. Hoje, olhando para trás, a um passo de conquistar o objetivo, ele diz que repetiria tudo outra vez. Já pensou em desistir? “Nunca”, responde.

“Isso tudo é um sonho. Estou passando momentos muto difíceis, sofri muito, mas um aprendizado gigante. Quando você sofre, você realmente aprende quem você é, e o que é o mundo. São lições que você nunca esquece. Estou fazendo tipo um mestrado na humanidade e é lindo”.

Em Campo Grande, Filipe Leite deve ficar 5 ou seis dias. Depois, segue viagem para Barretos. A Associação “Os Independentes”, que promove a Festa do Peão, está preparando uma cerimônia especial para recebê-lo.

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