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Comportamento

Uma foto de 14 anos atrás diz muito sobre aprender com quem é diferente

Aline Araújo | 06/04/2015 06:23
"Na hora ninguém percebeu, mas pra mim, a ideia era ver o mundo sob a minha ótica, sabe?!" (Foto: Arquivo Pessoal)
"Na hora ninguém percebeu, mas pra mim, a ideia era ver o mundo sob a minha ótica, sabe?!" (Foto: Arquivo Pessoal)

A foto é uma brincadeira, dessas feitas entre amigos. No caso, foi registrada em um churrasco no final do ano de 2001. Nela, os amigos do jornalista Pedro de Moraes Martinez, de 27 anos , que é cadeirante desde os 5, ajoelham sobre o sapato e ficam da mesma altura dele. Nada muito elaborado, só o retrato da lembrança de um dia divertido em um momento de confraternização deles. Mas para Pedro, o gesto teve um significado especial.

“Os meus amigos tiveram a ideia de virarem 'anões' pra ficarem do mesmo tamanho que eu. Na hora ninguém percebeu, mas pra mim, a ideia era 'ver o mundo sob a minha ótica', sabe?! Como se eles quisessem passar por alguns segundos o que eu passo, para me entenderem ou me conhecerem melhor. Foi uma brincadeira meio filosófica, sem querer”, comenta Pedro, que ri ao lembrar do dia.

A amizade que dura mais de 15 anos começou com muita música. Os garotos estudavam com Lucas Moraes, irmão de Pedro, conhecido como KuKa, e tinham uma banda. Foi durante os ensaios que a turma se fortaleceu, a ponto de Pedro considera-los como a segunda família.

Pedro acabou ensinando aos amigos sem perceber. (Foto: reprodução Facebook)
Pedro acabou ensinando aos amigos sem perceber. (Foto: reprodução Facebook)

Na foto, da esquerda para a direita, está Kuka, que hoje mora em São Paulo. Ao lado, Gustavo, amigo que faleceu há seis anos, em um acidente na estrada. Depois, Rafael Medeiros, que hoje é dentista e tem dois filhos; Carlos Henrique Medeiros, Gerente Financeiro; e o músico Murillo Breem. A turma era muito maior, mas os meninos formavam as bandas Shadow Lord e o Jack Lanterna.

Em toda relação humana, a gente sempre aprende com as diferenças do outro, já que ninguém é igual, isso é natural, mas algumas diferenças são mais evidentes, como a deficiência física de Pedro, que tem uma distrofia rara, e por esse motivo, os movimentos do corpo são limitados.

O Lado B resolveu perguntar aos amigos que aparecem na foto, o que eles aprenderam com as limitações e também com as conquistas de Pedro, por conta da doença, durante os anos de amizade. São detalhes do dia a dia que ensinam, o jeito de encarar a vida que leva à reflexão, de que todo mundo tem algo para aprender ou ensinar.

“Eu aprendi não só com ele, mas com a família toda! Ele ia com a gente para tudo quanto era lugar e nós sempre tínhamos esse exemplo de amor fraterno do Lucas no cuidado com a as limitações físicas do Pedro. Porque a diferença acaba aí e a gente as vezes até esquecia da deficiência dele nas conversas. E é isso que a gente aprende”, conta Rafael. Ele lembra que, mesmo com a progressão da doença, Pedro nunca lamentou, não conseguir fazer algo e "sempre foi um exemplo para os amigos".

Carlos avalia que as dificuldades de acessibilidade de Pedro se tornaram também do grupo, mas isso nunca foi problema. Mas valia o esforço para locomoção dele. Qualquer lugar que a turma fosse, ficaria mais agradável com a presença do amigo. No começo era preciso pensar sobre a acessibilidade do local, com o passar dos anos isso foi se tornando algo automático.

“A gente sempre acaba preferindo os locais adaptados e acaba aprendendo com isso. No restante é normal, por querer que o nosso amigo esteja perto da gente isso não é trabalho. Fomos aprendendo com o tempo, ele entende o nosso lado e a gente o dele”, comenta. Com o passar dos anos, as atividades mudaram também, mas a amizade entre os rapazes só cresceu. Os três que moram em Campo Grande se encontram com frequência.

O aprendizado acaba sendo diário e sutil. Talvez Pedro não saiba o quanto ensina aos amigos, desde os sorrisos, até a importância de se lutar por acessibilidade e tantos outro direitos que por vezes ficam para escanteio.

Para os amigos, fica mais uma lição, de que a foto tirada há 14 anos foi bem mais que uma brincadeira. Serviu para reforçar o quanto o contato com as diferenças pode criar valores bacanas na vida da gente.

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