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Capital

Do Detran para a rua: diferença que rouba vidas e cria risco sobre 2 rodas

Aline dos Santos | 13/01/2014 09:08
Por semana, Detran recebe 300 candidatos a condutor de moto. (Foto: Marcos Ermínio)
Por semana, Detran recebe 300 candidatos a condutor de moto. (Foto: Marcos Ermínio)

Motociclista com capacete fechado, viseira abaixada, sem zigue-zague, trafegando no centro da via e sem excesso de velocidade. Não, você não está sonhando. Você está no pátio de aulas e exame do Detran (Departamento Estadual de Trânsito) de Campo Grande.

As imagens que em muito diferem das vistas nas ruas da cidade, onde 55% dos mortos em acidentes estavam em motos, demonstram que uma perigosa margem de aceitação de risco faz com que o modo correto de conduzir a motocicleta não passe do portão. Nas ruas, vale a briga de espaço por cada centímetro da via. A realidade rouba vidas, superlota hospitais e tira o sono das autoridades de trânsito.

Instrutor de CFC (Centro de Formação de Condutores) há cinco anos, Márcio de Freitas, conta que duas características do candidato a uma carteira de habilitação A chamam atenção. Logo de cara, avisam que sabem pilotar e saem em alta velocidade. “Chega com muitos vícios, achando que sabe tudo”, relata.

No entanto, saem sem regular os espelhos ou prender o capacete, situações que eliminariam o candidato de forma imediata na prova para obtenção da CNH (Carteira Nacional de Habilitação). Nas aulas, um dos pontos mais reforçados é não fazer ultrapassagem pela direita, prática irregular e motivadora de acidentes.

Ao contrário de quem faz aulas em carros, a prova prática não é na rua, mas em um espaço que reproduz rampas, semáforos, avenidas e cruzamentos. Por semana, com exames realizados às quartas e sextas-feiras, são 300 alunos em busca da carteira A.

De acordo com a supervisora da banca examinadora do Detran, Mércia Miranda Melo, entre setembro e dezembro, a demanda cresce e o número de vagas aumenta para 250 a cada dia de prova.

Segundo Mércia, no fim de ano, número de vagas para exames aumenta para 250 por dia. (Foto: Marcos Ermínio).
Segundo Mércia, no fim de ano, número de vagas para exames aumenta para 250 por dia. (Foto: Marcos Ermínio).

“São duas fases. A primeira, verifica o equilíbrio. Na segunda, é feito o percurso”, explica a supervisora. Na prova, são cobrados vários procedimentos: capacete na cabeça e preso, ajuste dos retrovisores e farol da motocicleta ligado. Se sair sem cumprir uma das exigências, a eliminação é imediata. A locomoção correta na via ainda exige distância de seguimento e veta o corredor.

Vale a pena – Assessor de psicologia de trânsito do Detran, Renan da Cunha Soares Júnior avalia que a providencial amnésia sobre as regras de circulação no trânsito leva em consideração a aceitação do risco. “Acham que se colocar em risco, como zigue-zague e excesso de velocidade, vai compensar. Precisa de uma mudança de valores. O trânsito é coletivo. Ele não se coloca em risco sozinho”, avalia.

Para o psicólogo, entra em cena a maior dificuldade, ter noção que o trânsito é de todos. “O que é público, não é de ninguém. Cada um olha só o seu lado. Se você perguntar para o motociclista sobre os outros participantes do trânsito, ele vai dizer que o problema é o motorista de carro, o pedestre, o motorista de ônibus”.

Com dados que mostram a combinação de excesso de velocidade, consumo de álcool e motocicleta na liderança de acidentes, os motociclistas são o centro das preocupações dos órgãos de trânsito. “As estatísticas são gritantes”, salienta Renan da Cunha. Sem exemplos no Brasil, Campo Grande vai ter que descobrir um caminho próprio na luta para reverter o quadro.

Mais do mesmo - Nas primeiras horas de 2014, uma cena comum e dolorosa, que marcou o último ano no trânsito em Campo Grande, se repete: um jovem motociclista morreu em acidente. Em 2013, segundo o levantamento do site Estrela do Asfalto, das 106 pessoas que perderam a vida no trânsito da Capital, 58 estavam em motos.

Recém-chegado ao comando da Agetran (Agência Municipal de Transporte e Trânsito), o engenheiro civil Jean Saliba diz  buscar uma saída. “Não podemos ficar parados frente essas estatísticas”, afirma. Ele vai solicitar estudo de especialistas na tentativa de reduzir o número de acidentes envolvendo motocicletas. Na Capital, da frota de 472.922 veículos, 23% são motos: 109.122.

“Não podemos ficar parados frente essas estatísticas”, diz diretor da Agetran. (Foto: Marcos Ermínio)
“Não podemos ficar parados frente essas estatísticas”, diz diretor da Agetran. (Foto: Marcos Ermínio)

No hospital, na sala de cirurgia – Após visitar o Pronto-Socorro da Santa Casa de Campo Grande, a promotora Filomena Fluminhan fez apelo aos motociclistas. “Eram cinco macas, os cinco motociclistas”, relata. A fila de espera para cirurgia ortopédica que em média era de 10 pacientes, já chegou a 39 nos últimos meses.

Para a promotora, é preciso um esforço da sociedade e órgãos de trânsito. A primeira para evitar conduta que coloque as pessoas em risco. O segundo deve atuar na retirara do trânsito de condutores inabilitados ou alcoolizados.

O MPE vai solicitar à Agetran e Sejusp (Secretaria de Justiça e Segurança Pública) medidas de fiscalização mais eficazes. Aos condutores, principalmente, aos motociclistas, a promotora apela ao bom-senso. “Para não ser um a mais nessa fila de ortopedia da Santa Casa”, afirma.

Em Campo Grande, frota de motos é de 109.122. (Foto: Marcos Ermínio)
Em Campo Grande, frota de motos é de 109.122. (Foto: Marcos Ermínio)
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